CONCEIÇÃO CRISTÓVÃO
Conceição Luis Cristóvão nasceu em Malanje aos 4 de Junho de 1962. Obras publicadas: "A voz dos passos silenciosos" (1990), "Amores elípticos" (1996), "Idade digital do verso" (2002) e "Pela porta da palavra" (2003).
Perigosas Núpcias
toma-se o gosto
às palavras
nas cordas, secas.
em forca.
pedras
sensualizam
na cópula:
terra
luz
simultânea
mente.
(ó bocas senis em madrugadas virgens!)
... que alegria
gradativa
mente
louca
... ao ver-te passar.
coisas deste além-erotismo
nos beijos
láminas de fogo.
(ó sémen estrito do inferno!)
Idade da Pedra
(há um discurso de facas nas fronteiras lívidas do rosto
a madrugada morre de leucemia, e ainda as florestas
não revelam as crateras abertas.
línguas de fogo economizam tristezas, deslizam águas
na luz da pedra.
óh!, vidas de pedra, náuseas de pedra, na dura frágil
idade da pedra.)
Ritos
a cobra
se
ao deslocar
se
deixa rasto.
a cabra cobra
se
no óbito
há choro de mutudi.
... rasgar a noite negra?
se
e só no pó
se lê:
— o riso da morte
é único.
e redondo.
como um ponto final.
Imagem Vadia
segue-se o percurso
sinusoidoce
dos braços dúcteis do jazz:
voz sólida mente suave.
marimba pão rosto
e o ritmo gritante
na garganta do vento:
pó voz uivo liso.
... mal vê o espelho
rasga pelo sexo
a dor me(re)cida
imagem vadia
Metalinguar a Palavra
poemas é amar o Homem. amar a palavra.
poemar é humanizar o verbo
naqueles dias compridos
em que se recolhem versos
um a um: frutos silvestres. maduros.
a cobrir a urgência da poesia.
poemar é amar poesia mar e ar.
processo caridoso de perfume tranquilo
a inundar testítulos de (pro)criação dúbia.
a metamorfose que ora registo
falta a voz mítica do oráculo
falta o rito da iniciação africana
muanda é, assim, o à vontade com que o poeta
desmistifica o rigor prepucial da gramática
e metalíngua o (des)encanto infinito da palavra.
Geografia Erótica
margens das veias. na geografia de tua pele
única. silenciam suaves curvas de teu corpo.
em sensuais transparências. ondas de volúpia
fogos líquidos deuses caos e luminosos silêncios
escoam na tessitura de opacas línguas. de fala
uma espécie de lúmen em memória à deia
milenar: do fogo da terra da água do ar... em fusão
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DIMENSÃO – REVISTA INTERNACIONAL DE POESIA. ANO XX – No. 30. Editor Bilharino. Capa; Visual de Gabrile -Alfo Bertozzi. Uberaba, Minas Gerais, Brasil: 2000. 200 p. No. 10 787 Uberaba, MG – Brasil. Capa: Visual de Gabriele-Aldo Bertozzi. Editor: Guido Bilharino 200 p. Ex. biblioteca de Antonio Miranda
FILOSOFIA HÚMIDA
I
Sofre o amoníaco no espírito. Lacrimante.
Da sombra molhada como recordação
a ontologia guarda.
Quando descansa a luz morre sob o olhar noctívago.
Nas flores já não há só perfume:
há o conhecimento. Que todos fingem ignorar.
Assim mesmo, ele sabe... e não diz.
II
Não olha. Olhar é perder a memória
(Ironicamente, ele já não a possui)
e não viver. Não olha mas vê:
da virtualidade ao sonho
a ponte é um ponto.,
O cágado segreda-lhe: —descobre do teu sol
a clareza interior. Necessária.
III
O ouvido dialoga silêncios. Todos. Aturdidos.
A luta do povo é digna.
Oh!, se for embora no fulgor da estrela
ou no caudal da lágrima. Única.
Oh!, se for embora, deixar-te-á seu inocente punhal.
Depois da morte. Tal e qual.
PERIGOSAS NÚPCIAS
... toma-se o gosto
às palavras
nas cordas secas.
Em forca.
Pedras sensualizam -na cópula—
( ó sémen estrito do inferno)
terra
luz
simultânea
mente.
Que alegria gradativa
mente
louca.
... ao ver-te passar.
Coisas deste além-erotismo
( ó bocas senis: madrugadas virgens )
nos beijos
lâminas de fogo.
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Página ampliada e republicada em abril de 2024
Página publicada em setembro de 2010
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