MARIO CESARINY DE VASCONCELOS
(1923-2006)
MÁRIO CESARINY DE VASCONCELOS nasceu no dia 9 de Agosto de 1923 em Lisboa. Freqüentou a Escola de Artes Decorativas António Arroio e estudou música com o compositor Fernando Lopes Graça.
Considerado o mais importante representante poeta português da escola Surrealista, encontra-se em 1947 com André Breton, fato determinante no desenvolvimento de seu trabalho literário. Ainda nesse ano participa, junto com Alexandre O'neill, Antônio Pedro etc., do Grupo Surrealista de Lisboa. Algum tempo depois, por não concordar com a linha ideológica do grupo, afasta-se de maneira polêmica e funda o "Grupo Surrealista Dissidente".
Principal representante do Surrealismo português, Mario Cesariny, no início de sua produção literária, mostra-se influenciado por Cesário Verde e pelo Futurismo de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa. Ao integrar-se ao Grupo Surrealista, muda o seu estilo, trazendo para sua obra o "absurdo", o "insólito" e o "o inverossímil".
Além de poeta, romancista, ensaísta e dramaturgo, também dedicou-se a às artes plásticas, sobretudo à pintura.
Obra poética mais importante: Corpo Visível - 1950; Discurso sobre a Reabilitação do Real Quotidiano - 1952; Louvor e Simplificação de Álvaro de Campos -1953; Manual de Prestidigitação -1956; Pena Capital -1957; Alguns Mitos Maiores e Alguns Mitos Menores Postos à Circulação pelo Autor -1958; Nobilíssima Visão -1959; Poesia -1961; Planisfério e Outros Poemas -1961; Um Auto para Jerusalém -1964; Titânia e A Cidade Queimada -1965; Burlescas, Teóricas e Sentimentais -1972; Primavera Autônoma das Estradas -1980; Titânia -1994. Fonte: www.mundocultural.com.br
Nació em Lisboa, el 9 de agosto de 1923. Es el poeta que abre la etapa del surrealismo português y está acreditado como uma de las figuras más importantes de la poesía contemporánea portuguesa. Es también pintor surrealista.
Poemas selecionados de la edición de la ANTOLOGIA LA ACTUAL POESIA PORTUGUESA, con traducciones de nuestro amigo XOSÉ LOIS GARCÍA, publicada originalmente en la revista HORA DE POESIA, n. 27/28, de 1983, de Barcelona, España. Ejemplar gentilmente donado por Aricy Curvello para la Biblioteca Nacional de Brasilia.
A FONTE
na mudes do pinhal
a fonte
sempre tem
um murmúrio casual
de vigiar quem passa
que vem
de ver o mar, tão servo
do sol, ave de fogo no horizonte
HISTÓRIA DE CÃO
eu tinha um velho tormento
eu tinha um sorriso triste
eu tinha um pressentimento
tu tinhas os olhos puros
os teus olhos rasos de água
como dois mundos futuros
entre parada e parada
havia um cão de permeio
no meio ficava a estrada
depois tudo se abarcou
fomos iguais um momento
esse momento parou
ainda existe a extensa praia
e a grande casa amarela
aonde a rua desmaia
então ainda a noite e o ar
da mesma maneira aquela
com que te viam passar
e os carreiros sem fundo
azul e branca janela
onde pusemos o mundo
o cão atesta esta história
sentado no meio da estrada
mas de nós não há memória
dos lados não ficou nada
VISUALIZAÇÕES
I
suave
a vela abre
e principia
o dia
ela
que pelo azul
que corta
considera e chama
outras velas irmãs para o claro rio
e enquanto
o cais
é um enorme navio
que se nega
e no entanto cumpre
a mais estranha viagem
ela
que parte
vira
para o que abandona
um olhar de brancura
que é toda a matemática
singela
da manhã que a inspira
RETRATO
geometria
rumo incerto
alegre e triste alegria
sempre mais perto
força fria
mãe do dia
regaço puro e coberto
dom breve
silhueta esguia
catapulta no deserto
A CRIANÇA
Objecto que se usava para provocar solidão.
Os últimos a conhecerem o seu emprego fo-
ram os druidas, que lhe chamavam “o prego
da melancolia” e o cravavam na testa das
mulheres para que fossem puras e isentas
de precipitação.
Há fósseis que permitem localizar o apare-
cimento deste utensílio durante todo o segundo
glaciar.
CESARINY, Mário. Uma grande razão: os poemas maiores. Lisboa: Assirio & Alvim, 2007. 160 p. capa dura. ISBN 978-972-37-1183-7 Desenho da capa: Retrato de Cesariny por José Escada, óleo s/tela. Inclui os textos “O Espelho Vazio” de José Manuel dos Santos e “A Maravilha do Acaso”, de Maria Bochichio. Uma seleção de poemas do mestre do surrealismo português, edição de qualidade. Col. A.M.
passagem a limpo
Vai morto. Não sonha.
Não grita. Não soa.
Saiu-lhe a peçonha
pelo buraco da proa
O navio morto
que sobe a corrente
de que velho porto
era o adolescente?
Cingiam-lhe a boca
água e nevoeiro?
Tinha muita, pouca
falta de dinheiro?
Bom barco, subido
aos da mor igualha,
tens o ombro ferido
até à fornalha
E puxado a cabos
— este rei de oceanos!
por ginasticados
loiros namorados
a diesel e canos
Foi-lhe a estrela má.
— E se recomeça?
— Vamos daqui já
enterrá-lo depressa.
CESARINI, Mário. Poemas de Mário Cesarini escolhidos e ditos por Mário Cesarini. Lisboa: Assirio & Alvim, 2007. 77 p. 14,5x21 cm. capa dura. ISBN 978-972-37-11223-0 Capa: pintura de Mário Cesarini. Col. A.M.
mágica
É uma estrada no céu silenciosa
um anão sem ninguém que o suspeite
é um braço pregado a uma rosa
um mamilo escorrendo leite
São edénicos anjos expulsos
sonhando quietude e distância
são homens marcados nos pulsos
é uma secreta elegância
São velhos demónios ociosos
fitando o céu bailando ao vento
são gritos rápidos, nervosos
que^destroem todo o pensamento
É o frio deserto marinho
operando na escuridão
é o corpo que geme sozinho
é a veia que é coração
São aranhas jovens, pernaltas
arrastando embrulhos para o mar
são altas colunas tão altas
que o chão ameaça estalar
São espadas voantes são vielas
passeios de todos e nenhuns
são grandes rectas paralelas
são grandes silêncios comuns
É uma edição reduzida
das aras da história sagrada
é a técnica mais proibida
da mágica mais procurada
É uma estrada no céu silenciosa
por um domingo extenso e plácido
é um anoitecer cor-de-rosa
um ar inocente, ácido
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TEXTOS EN ESPAÑOL
LA FUENTE
en la mudez del pinar
la fuente
siempre tiene
um murmullo casual
de vigilar quien pasa
que viene
de vera al mar, tan siervo
del sol, ave de fuego en el horizonte
HISTORIA DE PERRO
yo tenía un viejo tormento
yo tenía una sonrisa triste
yo tenía un presentimiento
tu tenías los ojos puros
tus ojos llenos de agua
como dos mundos futuros
entre parada y parada
había un perro de por médio
en medio estaba la calle
después de todo se alcanzó
fuímos iguales un momento
ese momento paro
aún existe la extensa playa
y la gran casa amarilla
hacia donde la calle desmaya
están aún la noche y el aire
de aquella misma manera
con que te veia pasar
y los senderos sin fondo
azul y blanca ventana
donde pusimos el mundo
el perro certifica esta historia
sentada en medio de la calle
pero de nosotros no hay memória
de los lados no quedo nada
VISUALIZACIONES
I
suave
la vela se abre
y principia
el día
ella
que por el azul
que corta
considera y llama
a otras velas hermanas hacia el claro río
y mientras
el muelle
es un enorme navio
que se noiega
y sin embargo cumple
el más extraño viaje
ella
que parte
dirige
hacia lo que abandona
una mirada de blancura
que es toda la matemática
sencilla
de la mañana que la inspira
RETRATO
geometria
rumbo incierto
alegre y triste alegria
siempre más cerca
fuerza fria
madre del día
regazo puro y protegido
don breve
silueta esbelta
catapulta en el desierto
EL NIÑO
Objeto que se usaba para provocar soledad.
Los últimos em conocer su empleo fu
ron los druidas, que le llamaban “el clavo
de la melancolía” y lo clavaban en la cabeza de las
mujeres para que fuesen puras y exentas
de precipitación.
Hay fósiles que permiten localizar la apari-
ción de este utensilio durante todo el se-
gundo glacial.
Página publicada em janeiro de 2008. |