GUILHERME BRAGA
Guilherme da Silva Braga (Porto, 22 de Março de 1845 – Porto, 26 de Julho de 1874) foi um tribuno e poeta português.
Nascido na Rua de Sant'Ana, no bairro da Sé do Porto, Guilherme Braga era irmão de Alexandre José da Silva Braga, tio de Alexandre Braga, filho e amigo de infância de Alberto Pimentel. Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra, Guilherme Braga foi redator-chefe da Gazeta Democrática, tendo-se correspondido com Victor Hugo. Traduziu o Atala de François-René de Chateaubriand, colaborou em diversas revistas e jornais, tais como Giralda, Diário da Tarde, Nacional e Luta.
A sua obra poética mostra constantemente o tema obsessivo da morte, pressentida dia-a-dia, expressa de forma tão coloquial que chega a lembrar Cesário Verde. Cultivou, também, a temática social e humanitária, de inspiração victor-huguana, e o lirismo amoroso, de tonalidade parnasiana. Nos seus versos, Guilherme Braga era violento contra os falsos ministros da religião, entusiasta apaixonado pela liberdade, de grande sensibilidade e ternura ao descrever as alegrias do lar.
Era casado com Maria Adelaide Braga, que sucumbiu dois meses depois do falecimento do marido. Alberto Pimentel, no livro intitulado Homens e datas, consagra um saudoso artigo biográfico à memória do desditoso poeta portuense, que morreu contando apenas 29 anos de idade, vítima de tuberculose, já depois de ter sofrido a perda de quatro filhos.
Fonte: Wikipedia
[Conservando a ortografia original]
AMOR
Olha estas velhas árvores frondosas
Que enchem de sombra a solitária rua,
E êsse chão de verdura, e aquelas rosas
Que dos muros se pendem curiosas
Para verem passar a imagem tua.
Não te diz tudo amor? Ouves? Suspende!
Lá derramam as aves pela selva
As doces notas que tua alma entende:
Vês? Mais pálido um raio a lua estende
Para beijar-te os pés na escura relva.
Quando sabem que vens, tudo prepara
Recepção festival, como se fosse
Cousa do céu que por aqui passara;
Então a luz dos astros é mais clara,
Das florinhas o hálito mais doce.
Gorjeia o rouxinol já de mais perto,
Gemem as auras melodioso idílio,
Em tudo há um som de cânticos incerto,
E do livro das árvores aberto
Chovem rimas de Horácio e de Virgílio.
Eu pela tua mão, calcando a alfombra
Do verde musgo, absorto em sonhos vagos,
Cismo no teu amor que esta alma assombra,
E julgo que nos céus por entre a sombra
Nos está rindo a estrêla dos Reis Magos.
É que, se a natureza, que te admira,
O musgo e o cedro, as rosas e o perfume,
Formam, para cantar-te, ignota lira,
Nos seios de mính'alma outra suspira
Que mais poesia e mais amor resume.
LIVRO DOS POEMAS. LIVRO DOS SONETOS; LIVRO DO CORPO; LIVRO DOS DESAFOROS; LIVRO DAS CORTESÃS; LIVRO DOS BICHOS. Org. Sergio Faraco. Porto Alegre: L.P. & M., 2009. 624 p. ISBN 978-85-254-1839-1839-5 Ex. bibl. Antonio Miranda
DOLORES
Sentado à mesa, o príncipe da Igreja
inclina a calva fronte aos seios tímidos
duma espanhola, cujo olhar flameja,
e em cujos lábios úmidos,
rindo, o prazer de beijos s´inebria!
Ao ver-te assim, mirrada
pelos impuros hálitos da orgia;
ao ver-te assim, na sombra, arremessada
dos canteiros natais à impura alcova,
quem há que se comova,
pobre flor dos jardins de Andaluzia?
Tem por nome Dolores...
Por ofício, vender a quem lh´os paga,
como não tem amor, os seus amores.
É soberba e formosa!
Brilhante e sedutora! — imagem vaga
d´Eva... já criminosa,
escondendo a nudez por entre as flores!
Misto de sombra e luz, de lava e gelo,
d´Éden oculto e precipício aberto,
prende, fascina, atrai, cega, arrebata!
Para quem dorme, em êxtase, coberto
pelas ondas gentis do seu cabelo,
é como no deserto
a mancenilha, que adormenta a mata!
Os braços nus da jovem messalina
cingem o padre, que, sorrindo, oscula
a carne branca, aveludada e fina,
que lhe é dado gozar... mesmo sem bula.
Calam-se, em longo beijo,
as duas bocas ávidas, famintas...
Escuta, ó Cristo, escuta, embora sintas
o rosto frio a chamejar de pejo!
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Página ampliada e republicada em fevereiro de 2023
Página publicada em outubro de 2015
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