EDUARDO PITTA
Eduardo Pitta é um poeta, escritor e ensaísta português. Nasceu em Lourenço Marques a 9 de Agosto de 1949, tendo vivido em Moçambique até Novembro de 1975. Escreve e publica desde 1967. Entre 1974 e 2007 publicou oito livros de poesia, um romance, uma trilogia de contos, quatro volumes de ensaio e crítica, e um diário veneziano. Em Fractura, ensaio sobre a homossexualidade na literatura portuguesa contemporânea, sinaliza as suas representações numa perspectiva que não elide a «negociação de identidade». Colaborou e colabora em publicações literárias de vária índole. Actualmente escreve crítica literária no jornal Público, e é colunista da revista LER. A seu respeito já se falou de timbre neo-expressionista, visão pulsional e agreste da existência, ritmo acelerado, pathos autobiográfico, triunfo do recalcado, narrador centrado na identidade sexual do sujeito e, last but not least, de hermenêutica gay. Alguma razão haverá. Mantém desde 2005 o blogue Da Literatura.
Página do autor: http://www.eduardopitta.com/
Agora que as palavras secaram
e se fez noite
entre nós dois,
agora que ambos sabemos
da irreversibilidade
do tempo perdido,
resta-nos este poema de amor e solidão.
No mais é o recalcitrar dos dias,
perseguindo-nos, impiedosos,
com relógios,
pessoas,
paredes demasiado cinzentas,
todas as coisas inevitavelmente
lógicas.
Que a nossa nem sequer foi uma história
diferente.
A originalidade estava toda na pólvora
dos obuses, no circunstanciado
afivelar
dos sorrisos à nossa volta
e no arcaísmo da viela onde fazíamos amor.
♠
Temos das coisas a lembrança das viagens
ignotas. E o sentido delas estilhaça
no primeiro espelho da memória.
Como aquelas noites muito brancas
povoadas de crimes inenarráveis.
Também as nossas mãos, vorazes,
tacteiam um percurso de sangue:
o de inquestionáveis desígnios do amor.
♠
Ocupamos a paisagem
que, desocupada, se ocupa
de nós.
Tempo de ocupação, este.
Somos o estrangeiro
que o silêncio de paredes
brancas e esquecidas
perturbou.
Extasiado ao menor rumor
de um estio
duro e claro
— todo lâminas.
Perplexo da memória
destes dias
sufocados em tédio
e cal.
Da palavra para a pedra
arrastando-se aquáticos
— as mais sazonadas
as menos polidas.
Crestada que foi,
na raiz do tempo, toda
a subliminar tentativa
de retorno.
Extraídos de la Revista de Poesía PROMETEO, nos. 81-82, 2008.
Memorias del XVIII FESTIVAL INTERNACIONAL DE POESÍA DE MEDELLÍN
TEXTOS EN ESPAÑOL
Ahora que las palabras se secaron
y se hizo noche
entre nosotros dos,
ahora que ambos sabemos
de la irreversibilidad
del tiempo perdido,
nos resta este poema de amo y soledad.
Lo demás es la insistencia de los días,
persiguiéndonos, impiadosos,
con relojes,
personas,
paredes demasiados cenicientas,
todas las cosas inevitablemente
lógicas.
Pues la nuestra ni siquiera fue una historia
diferente.
La originalidad estaba toda en la pólvora
de los obuses, en el circunstanciado
disimulo
de las sonrisas a nuestro alrededor
y en el arcaísmo de la calleja donde hacíamos el amor.
*
Tenemos de las cosas el recuerdo de los viajes
ignotos. Y el sentido de ellos se despedaza
en el primer espejo de la memoria.
Como aquellas noche muy blancas
pobladas de crímenes inenarrables.
También nuestras manos, voraces,
palpan un camino de sangre:
de incuestionables designios del amor.
*
Ocupamos el paisaje
que, desocupado, se ocupa
de nosotros.
Tiempo de ocupación, éste.
Somos el extranjero
que el silencio de paredes
blancas y olvidadas
perturbó.
Extasiado al menor rumor
de un estío
duro y claro
—todo láminas—.
Perplejo de la memoria
de estos días
sofocados en tedio
y cal.
De la palabra a la piedra
arrastrándose acuáticas
—las más sazonadas
las menos pulidas—.
Calcinada como fue,
en la raíz del tiempo, toda
La subliminal tentativa
de retorno.
Página publicada em julho de 2008
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