CARLOS WALLENSTEIN
(1925-1990)
DOZE JOVENS POETAS PORTUGUÊSES. Org. Alfredo Margarido e Carlos Eurico da Costa. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação, Ministério da Educação e Saúde, 1953. 56 p. (Os Cadernos de Cultura) 14x19 cm. Impresso pelo Departamento de Imp. Nacional. Inclui os poetas: Alberto de Lacerda, Alexandre Pinheiro Tôrres, Alfredo Margarido, Antonio Maria Lisboa, Carlos Eurico da Costa, Carlos Wallenstein, Egito Gonçalves, Eugênio de Andrade, Fernando Guedes, Henrique Risque Pereira, Mário Cesariny de Vasconcelos, Mário Henrique Leiria. Ex. bibl. Antonio Miranda
POEMAS
Inflama cravos vermelhos
com o seu olhar escuro.
Cravo vermelho entre os olhos
corpo róseo de joelhos.
Nascem vermes dentre o tato
da pele com este dedo.
E toiros entre o cabelo.
E mãos em cada contato.
Passou junto ao roseiral
colhendo insetos corados.
Nascem pedras dos seus braços.
Nasce o bom e nasce o mal.
Oh! astro de estranha forma!
Mulher em astros vertida
A realidade contorna
o céu ao fundo da vida.
Verde vida que me tomas
passa lesta ai vem gente.
Neste meu contentamento
um longo som de redomas
aquece o alegre pensar
sobre as cores do teu noivado:
opala na gargantilha,
tom de amor ao corpo anexo.
E vermelho sobre o sexo
quente vermelho que brilha
entre colunas de jaspe
e pelos de negra renda.
De ti, nada me ausenta.
Sou mar em que te banhaste
e em soluços te tomou
nos braços de algas eternas.
Dormes nas minhas cavernas.
Vives no ar do: meu voo.
Morre! Ah, peco-te que morras...
branca estátua entre as águas
no negro das minhas fráguas
ao som das minhas redomas...
Um dedo meu erguido há-de riscar teu nome no céu azul
da cidade
nome ideia
loira ideia como astros
meiga e violenta
cravo, pedra de alicérece, lisa superfície
(não grito)
apenas ciciar de dentes cerrados, cio e força
No céu ingénuo da cidade
cinzento o teu nome rastro de algodão
no cinzento ofuscante céu de uma ilha verde
no negro teto amplo de uma ilha do mar
entre tubarões e pombas
e ondas
e ecos
e búzios...
Cruel dedo meu escreverá teu nome em todo o mundo
no céu igual de todo o mundo
em nuvens
ou cruelmente com sangue violento
esta unha em ti rasgando entre dois ossos uma veia
para escrever teu nome aladamente
realidade survolante
asa de avião igual-a-música.
Um dedo meu e mais
alto dedo esguio chaminé vermelha de fábrica
escreverá no céu teu nome.
Um apito de barco no silêncio
vazio silêncio
noite de silêncio vazia
um apito de barco escreverá teu nome no céu da sangue.
Nenhum poeta do género sexual
saberá medir angústias fora de teu nome.
Nenhum simples dedo.
nenhuma cama
nenhum jardim
nenhum carro
nenhuma sepultura à sombra de ciprestes ou no descampado
nenhum fumo de lareira
fumo de gasolina
de barco
será alheio à realidade
violenta substância de teu nome.
E as praias
os rios as docas
o cordame dos barcos dentro da noite
nada
que respire nesta vida intima que de nós dimana,
terá sentido físico ou abstraio
sem que teu nome no rasgado horizonte desça e na memória
[persista transformação discordante]
mensagem
promessa e fruto
paixão antes da morte
teu nome existência estranhamente colorida
enfeitado de algas
e luzes,
— e se misture no sangue e no sangue viva corpoiento e duro
pedra entre pedras
onda entre ondas
barco entre montanhas
florido encontro de penedo e seiva.
"Almada" selecção de textos de Carlos Wallenstein ditos por Carlos Wallenstein e Lia Gama (1974)
http://www.youtube.com/watch?v=RnTWc3QVBwY
Página publicada em setembro de 2014.
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