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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CARLOS EURICO DA COSTA
(1928-1998)

 

Carlos Eurico da Costa (Viana do Castelo, 1928 — Lisboa 1998) foi um escritor surrealista português , com atividade destacada na área do jornalismo e na indústria da publicidade.

É filho do escritor e jornalista Severino Costa. Trabalhou nos jornais "Diário de Lisboa" e Diário Ilustrado1 (1956-) do qual viria a ser afastado num processo político que ficou famoso na história do jornalismo português. Colaborou em publicações como a Seara Nova, Árvore, Serpente, Diário de Notícias, etc. Teve intensa actividade como crítico cinematográfico e foi dirigente cineblubista.

O seu nome ficou ligado à história do Surrealismo português. Integrou, em 1949, com os desenhos "Grafoautografias" a primeira Exposição dos Surrealistas portugueses, com nomes como Henrique Risques Pereira, Mário Cesariny de Vasconcelos, Oom, F. J. Francisco, A. M. Lisboa, Mário Henrique Leiria, Fernando Alves dos Santos, Artur do Cruzeiro Seixas, Artur da Silva, A. P. Tomaz e Calvet. Em 1951, foi um dos protagonistas da ruptura dentro do movimento surrealista português, ao subscrever a resposta a Alexandre O'Neill no panfleto colectivo Do Capítulo da Probidade.

Oposicionista ao Estado Novo, chegou a estar preso por motivos políticos enquanto cumpria serviço militar obrigatório. Manteve uma constante atitude de intervenção cívica, ligado aos meios oposicionistas à ditadura portuguesa. Foi membro da direcção da Sociedade Portuguesa de Escritores e presidente da Associação da Imprensa Diária. Entre muitas actividades na área do associativismo, foi fundador, em 1979, da Associação de Cooperação com as Nações Unidas em Portugal.  Fonte: http://pt.wikipedia.org/

 

DOZE JOVENS POETAS PORTUGUÊSES. Org. Alfredo Margarido e Carlos Eurico da Costa.  Rio de Janeiro: Serviço de Documentação, Ministério da Educação e Saúde, 1953.  56 p. (Os Cadernos de Cultura) 14x19 cm. Impresso pelo Departamento de Imp. Nacional. Inclui os poetas: Alberto de Lacerda, Alexandre Pinheiro Tôrres, Alfredo Margarido, Antonio Maria Lisboa, Carlos Eurico da Costa, Carlos Wallenstein, Egito Gonçalves, Eugênio de Andrade, Fernando Guedes, Henrique Risque Pereira, Mário Cesariny de Vasconcelos, Mário Henrique Leiria.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

ALTERAÇÃO DO ESTRANGEIRO

 

Eis finalmente este leito de moluscos

este pais insólito das campânulas fosforescentes

radioativando-nos na sua mesa de cristais

o país das fontes cautelosas

das florestas moveis do contraponto.

 

Ei-lo finalmente

e só temos para nós este silêncio

quando provocamos os insetos da tragédia

o carnaval frio das palavras

 

uma nênia entoada pelo pobre desencantador das vírgulas

a mão que treme idolatrando o pó da infecção

Está aqui. Acaso não reconheces ?

 

É bem certo que a partícula de saliva lhe deformou os olhos

e os braços estão exaustos de abater lustres, irreconhecíveis.

Mas não importa, é ele.

 

A porta o louco espera o momento oportuno de sorrir

e mais valerá que os relógios paisagísticos se alterem

mesmo que a fotografia (ex-estátua decepada)

nos exiba a inconfidência do desencontro.

 

Valerá mesmo que a égua encontre o seu caminho

que os esquemas dos aviadores tenham o seu oculto significado

ou até que a porta se abra ruidosamente.

 

Deste lado estaremos nós

como as lâmpadas dos pescadores no Mediterrâneo

como os crânios antevistos ao fim

nós, os doentes epidêmicos das cidades.

 

A febre que nos queima

é o contato dos objetos da manhã

a cadeia de oiro nos pulsos de Henry Miller

o arsenal dos paranoicos

que acordam com a morte nos olhos

o coração inundado por um liquido mais denso.

 

Todos os dias nos interrogamos

onde começa ou acaba este jogo mesmeriano

o terminus desta locomotiva que nos arrasta

deixando-nos loucos

como as mães que nos procuram ferindo os inimigos.

 

Dispersos ao norte ou ao sul

ante as estátuas de bronze de Mercúrio

no caudal do Lima

o nosso encontro sucederá no mar

a terra avistada como uma grande montanha.

 

 

Diremos                     . .

 

palavras de ódio, de tristeza, de fascinação; pala-

vras de rancor de deslumbramento, de ternura:

palavras de sangue, palavras mágicas, de

comédia, de destino, de morte; palavras

inquietas, excessivas; palavras de amor, pala-

vras precisas, eufônicas; palavras de magia;

de destruição, de profecia,

 

e nas sombras que decoram o sol

será admitido o nosso afastamento

acabaremos sobre um céu que nos transforma

diremos sim

para que o tempo seja reduzido

e os signos que encantam os amantes possam prevalecer.

 

Chegará a noite

expugnada noite oceânica

das deformadas estrelas que nos cegam

o refluxo branco e cinzento

as nuvens aspiradas pelo tufão sobre o nosso rosto.

 

 

 

NUMA ALTA PRAÇA

 

Numa alta praça de nuvens

terás o meu corpo sobre a própria sombra

com colunas de fumo descendo pelos braços

Do refúgio do seu silêncio

 

uma ave tomba a teus pés entre o trânsito da cidade

a ave-peixe a ave transformada em rio

como nos teus olhos um diamante

corno passa a noite em palavras selvagens

 

Esse sangue precioso

 

          a tua vida

 

uma pedra de verdade

 

Nos teus gestos sobe a minha memória

 

os nervos brancos do ódio que te doei

Não me verás nas cabeças curvadas prestes a chegar

mas na tranquilidade dum sono que te abarca

E na tua fronte contrata de percepção

essa luz que só as minhas mãos sabem

 

Entre sombras como nas lendas da bíblia

dormindo ficarás sete anos sobre o teu choro.

....................................................................

 

Da minha figura salvar-se-á a luz que em ti ficou

 

                                       Lisboa, Junho de 1952.

 

Página publicada em setembro de 2014.


 

 

 
 
 
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