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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA SURREALISTA PORTUGUESA

 

ANTÓNIO MARIA LISBOA

 

António Maria Lisboa (Lisboa, 1 de Agosto de 1928 — Lisboa, 11 de Novembro de 1953) foi um poeta português.

Apesar da sua evidente preferência pelas artes e letras, foi obrigado pelo pai a frequentar o Ensino Técnico, que detestava. A partir de 1947 forma, com Pedro Oom e Henrique Risques Pereira, um pequeno grupo à parte das atividades dos surrealistas, adoptando uma postura inconformista diante da transformação do surrealismo numa escola, no que acabaria por conduzir ao abjecionismo, termo em que convergem os princípios da estética surrealista e uma postura poética de «insubmissão permanente ante os conceitos, regras e princípios estabelecidos»1 . Em Março de 1949, parte para Paris, onde permanece por dois meses. Datam provavelmente dessa curta estada os seus primeiros contatos com o Hinduísmo, a Egiptologia, e o Ocultismo em geral. Escreveu Erro Próprio (1950), o principal manifesto do surrealismo português, e foi redator de Afixação Proibida, em colaboração com Mário Cesariny, amigo que o acompanhou até aos últimos dias de vida. Atormentado por dificuldades existenciais, morreu de tuberculose com apenas vinte e cinco anos.

Ainda que inserida no surrealismo, a obra de António Maria Lisboa (em parte publicada postumamente por Luiz Pacheco na editora Contraponto) caracteriza-se por uma faceta ocultista e esotérica que a torna muito particular. Lisboa prefere intitular-se «metacientista», e não surrealista, porque, como argumenta numa carta a Mário Cesariny, a «Surrealidade não é só do Surrealismo, o Surreal é do Poeta de todos os tempos, de todos os grandes poetas». Em 1977 foi publicado um volume com a sua obra completa organizado por Cesariny. Na introdução, este salientou não só o facto de a destruição dos manuscritos operada por familiares do poeta constituir uma perda irreparável para a história do surrealismo português, como o facto de a sua morte prematura parecer encimar um itinerário fulgurante ao longo do qual poesia e vida constituíram uma unidade indissolúvel. Escreveu ainda acerca de António Maria o seguinte 2 : Preocupado com uma verdadeira aproximação às culturas exteriores à tão celebrada civilização ocidental, há na sua poesia uma busca incessante de um futuro tão antigo como o passado. Pode, e decerto deve, ser considerado o mais importante poeta surrealista português, pela densidade da sua afirmação e na direção desconhecida para que aponta.

Obras: Afixação Proibida (1949); Erro Próprio (1950); Ossóptico (1952); Isso Ontem Único (Lisboa, 1953); A Verticalidade e a Chave (Lisboa, 1956); Exercícios sobre o Sonho e a Vigília de Alfred Jarry seguido de O Senhor Cágado e o Menino (Lisboa, 1958); Uma Carta: Estrela da Ilha em Puros Ministros (Lisboa, 1958); Poesia de António Maria Lisboa (org. Mário Cesariny, Lisboa, 1962)

 

 

V A R E C H

 

Eu estimo sobre tudo os teus olhos incolores

as tuas mãos inúteis, a tua boca verde

 

Eu falo somente dos relógios caídos, dos autocarros

 

Eu falo somente dos pés vermelhos

 

Eu falo... eu falo... eu falo...

 

No vigésimo século as nuvens são árvores

e os pássaros mais pequenos grandes paquidermes

 

Sim, é verdade, os cabelos loiros

 

Então, meia-noite!

 

Senhora, s me dá licença, este dia acabou

por este dia

 

simplesmente

 

A criança é porca, é inútil

 

Muito obrigado.

 

 

 

POEMA DO COMEÇO

 

Eu num camelo a atravessar o deserto

com um ombro franjado de túmulos numa mão muito

          aberta

 

Eu num barco a remos a atravessar a janela

da pirâmide com um copo esguio e azul coberto de

          escamas

 

Eu na praia e um vento de agulhas

com um Cavalo-Triângulo enterrado na areia

 

Eu na noite com um objecto estranho na algibeira

— trago-te Brilhante-Estrela-Sem-Destino coberta de

          musgo

 

 

 

z

 

As formas, as sombras, a luz que descobre a noite

e um pequeno pássaro

 

e depois longo tempo eu te perdi de vista

meus braços são dois espaços enormes

os meus olhos são duas garrafas de vento

 

e depois eu te conheço de novo muma rua isolada

minhas pernas são duas árvores floridas

os meus dedos uma plantação de sargaços

 

a tua figura era ao que me lembro
da cor do jardim

 

 

Fonte da imagem:  tertuliadogarcia.blogspot.com (Publicada por Mário Plácido)

 

 

Página publicada em janeiro de 2014

 

 


 

 

 
 
 
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