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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto: https://www.google 

ANTÓNIO LADEIRA

 

(Almada, Portugal, 1969)

É licenciado em Estudos Portugueses pela Universidade Nova de Lisboa e doutor em Línguas e Literaturas Hispânicas pela Universidade de Yale, Estados Unidos.
Poeta, publicou Todas as línguas são estrangeiras, 1996,
e A minha cor favorita é a neve, 2000.
Eu vi jardins no inverno; Somos infelizes: Seis drones.

 

 

PINTO, EDUARDO BETTENCOURT. Da outra margem.  2ª. edição.  Lisboa: Instituto Camões, 2001.   175 p.  (Coleção Diáspora)  13 x 21 cm.
ISBN  972-566-216-4     Ex. bibl. Antonio Miranda

 




MEU DEUS DAS COISAS QUE ACONTECEM

Penso tanto em ti.
É preciso nadar tanto.

Adormecer todos os dias.
Correr, ter muitos anos.

Mas eu vou, talvez, chorar.
Como alguém a que mostrassem por maldade,
raios.

(Raios,
e risse!)

Serei o homem que, sem olhar,
saltou para baixo.

Para onde lhe cobriram os filhos
com milhares de sombras.

Com sombras que são anos
que não deixam respirar.

Vou procurar-te.
Vou voar para ti como um preso por um fio.

Consegues ver-me?

        Ainda sei viver e caminhar.
Dizer coisas que reconhecerias.

Não sei parar de imaginar.
De ver viver debaixo da água,
Eu queria muito era ir para ti,
parar.

 

        Chegar às ondas mais visíveis
pela mão da tua tranquilidade.

Mas pensar em ti é ser sempre de noite.
É passar um segundo e haver gente a rir,
ao lado.

“Passou um visitado das aranhas,
em nossas largas roupas estranhas...”

Lembras-te?

Começando a ver os dias onde estás,
começo a ver melhor.

Olha para mim,
primeiro,
a casa.

E, no quarto
crianças salvas,
a dormir.

Papéis em franca desordem.

Tu e eu a rir num espelho,
no estrangeiro.

Ou a jantar com sombras,
sem falar.

Aqui, tristes, sobre um copo.
Ali movendo um prato em ouro.

 

 

 

 

                AS PESSOAS INSTANTÂNEAS

Quando a morte cai sobre as pessoas
é porque tem as asas cansadas
de dar voltas ao mundo

Escolhe, hesitante, um dos seus cantores.
Escolhe quem, matinalmente, a cumprimenta.

A morte um dia esquece e desce
sobre os mesmos reverentes.

Esqueceu tudo o que dissera.
Ou fingiu que esqueceu tudo.

Alguém parou misteriosamente de falar.

E o silêncio quer dizer: “Acabou tudo.”
Quer dizer: “Venham comigo até àquelas grutas!”

Agora finjam que estão velhos.
E que ninguém está nada triste.

Olhem para as nossas pernas,
não há pernas!

Nem mãos,
excepto para tocar em coisas indescritíveis.

As crianças que morriam.

Vou viver para a neve com os meus filhos
mergulhar nos rios soturnos e profundos
em segundos.

Por entre as algas e os peixes que prendiam
os braços das crianças que agarravam
os polvos misteriosos que ensinavam
a nadar os que mereciam.
Se a mim viesse algum dos mortos que ensinasse
a morrer a quem vivesse
a nadar a quem andasse
a dormir a quem falasse

Sem parar.

Imitaria a vida que vivesse
esse monstro que ensinasse.

Que morresse.

Que matasse.

Sem matar.

 

 

 

Página publicada em maio de 2020.

 

 

 

 


 

 


 

 

 
 
 
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