Foto: José Ignacio Padilla
MIGUEL CASADO
TEXTOS EM ESPAÑOL -- TEXTOS EM PORTUGUÊS
Extraído de
POESIA SEMPRE – Revista Semestral de Poesia. ANO 4 – NÚMERO 7 – JULHO 1996. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro, 1996. Ex. bibl. Antonio Miranda
El curso del río
En algunas orillas que aparecen
despejadas, el limo
forma un borde negruzco
de disuasión, que crece muy despacio.
Sólo en ellas el limo puede verse;
sin embargo, es sabido
que el estuche del cauce se define
por él.
"Cuidado, el fondo es de pecina",
avisaban a voces desde el centro
del río, mientras levantaban mucho,
con aspavientos, los pies. Era entonces
el tiempo en que regía aquella lógica:
inventar remolinos, resbalar
y hundirse, pese al bajo nivel de aguas.
La mezcla de materias
en descomposición,
restos orgánicos, grava pulida
y escasa: se sabía sin los ojos
el limo. Pero no era así su origen:
invisible el arrastre al reposar,
invisible al volverse
de agua.
También, junto al río, de arena
y herramientas de plástico amarillas
se fabricaba el barro;
su tacto y su duración eran distintos
cada vez, constaría muros sólidos
o se escurría entre las manos, casi
agua coloreada. Y esta ciencia
nunca evitaba el miedo ni lo frágil,
que continuaba oculto.
VIII
por costumbre se llama a un cadáver
pasado y se especula
sobre él con terquedad. Pero no hay nadie
que haya vivido en ese tiempo o pueda
descubrir algo vivo, al remover
en sus cristales rotos.
En cambio, a quien se asoma
a una ventana desde la que nunca
antes había esperado, le viene
una certeza oscura de retorno
que no puede explicarse.
Como aquel patio de columnas: líneas
gruesas convergen de todos los puntos
al centro: es un círculo
blanco; no entran en él y, sin embargo,
parecen definirlo. El tiempo cabe
quizá en aquel dibujo.
Y lo que ahora está
¿es lo que siempre estuvo? Así tal vez
no hay nunca nada que no sea previo
y en lo anterior se encuentra
el ser. Resulta entonces tan veraz
que no existe el pasado
como que todo arraiga
en la distancia. Así, la identidad
reside en lo carente de existencia;
lo que es, en lo que no es.
TEXTOS EM PORTUGUÊS
Tradução de Antonio Miranda
O curso do rio
Em algumas margens que aparecem
despojadas, o limo
forma uma borda negrusca
de dissuasão, que cresce bem devagar.
Apenas nelas o limo pode ver-se;
no entanto, é sabido
que a conformidade do leito se define
por ele.
"Cuidado, o fundo é de lodo",
avisavam vozes desde o centro
do rio, enquanto levantavam muito,
com espalhafato, os pés. Era então
o tempo em que regia aquela lógica:
inventar remoinhos, resvalar
e afundar, apesar do baixo nível de águas..
A mescla de matérias
em decomposição,
restos orgânicos, cascalho polido
e escasso: sabíamos ser os olhos
o limo. Mas não era assim sua origem:
invisível o arrasto ao repousar,
invisível ao tornar-se
água.
Também, junto ao rio, de areia
e ferramentas amarelas de plástico
se fabricava o barro;
seu tato e sua duração eram distintos
cada vez, continha muros sólidos
ou escorria entre as mão, quase
água colorida. E esta ciência
nunca evitava o medo nem o frágil,
que continuava oculto.
VIII
Por costume se chama um cadáver
passado e se especula
sobre ele com teimosia. Mais não existe ninguém
que tenha vivido nesse tempo ou que possa
descobrir algo vivo, ao mexer
em seus cristais rotos.
Ao contrário, a quem se coloque
numa janela desde que nunca
antes havia esperado, tem
a certeza escura do retorno
que não se pode explicar.
Como aquele pátio de colunas: linhas
grossas convergem de todos os pontos
ao centro: é um círculo
branco; não entram nele e, no entanto,
parecem defini-lo. O tempo cabe
talvez naquele desenho.
E o que agora está
é o que sempre esteve? Assim talvez
não exista jamais nada que não seja prévio
e no anterior se encontra
o ser. Resulta então tão veraz
que não existe o passado
como que tudo enraíze
na distância. Assim, a identidade
reside na carência da existência;
o que é, no que não é.
Página publicada em janeiro de 2018
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