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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


GRACIELA CROS

 

Nasceu em Carlos Casares, província de Buenos Aires, Argentina, em 1945. Publicou, entre outros, os seguintes livros de poesia: Pares partes (1985), Flor azteca (1991), La escena imperfecta (1996), Cordelia en Guatemala (2001) Libro de Boock (2004) La Cuna de Newton (2007) – e a novela Muere más tarde (2004), que ganhou o 1º lugar no Premio de la Secretaria de Cultura de la Nación por la Región Patagónica. Realizou a seleção e prólogo de Marcas en el tránsito. Antología de poetas jóvenes de Bariloche (1995). Ganhou vários prêmios na Argentina e no exterior, tendo sido finalista, em 1994, do Premio de Poesía Casa de las Américas. Vive em San Carlos de Bariloche desde 1971 e coordena cursos de literatura e escritura criativa. Tem realizado numerosos recitais de poesia acompanhada por músicos e atores. Também tem sido convidada para ler sua obra em festivais internacionais de poesia dentro e fora de seu país.

 

Urca ganhou menção especial no Concurso Literário IDENTIDAD. DE LAS HUELLAS A LA PALABRA, composto pelos jurados José Luis Mangieri, Noé Jitrik e Delfina Muschietti. O texto foi publicado em volume coletivo de mesmo título, na coleção DIREITOS HUMANOS, Editorial EUDEBA, Universidad de Buenos Aires, 1998, e também no livro Urca (Buenos Aires: Libros de Tierra Firme, 1999).

 

Indicación de Rolando Revagliati.

 

 

TEXTO EM PORTUGUÊS

 

Tradução: Cristiane Grando

 

 

Urca*

 

*Bairro do Rio de Janeiro, Brasil.

 

 

a-

 

Luz, jardins que antecipam

a sombra. Ar espesso,

relutante

 

Distantes

sirenes, algum barco, explosões de bruma

 

E por último, o mar

 

Urca destece fábulas, conta histórias

por compaixão e tranqüiliza; finge

a partir de sua mansa, indiferente, fraternal

mentira

 

O menino estrangeiro busca tateando

a amarela lajota de seu jogo para

saltar, saltar, saltar

ao outro lado da história

e ver a engrenagem partida

 

         Tenso, iluso

 

 

 

-b-

 

Praça verde, redes, risos em outro idioma

 

Na esquina, uma igreja

e escadas

 

escadas para alcançar

talvez constatar uma porta perdida

em outro tempo?

 

À espreita balcões e sabores

peixes fritos e cítrus

cantarolar e frutas

bandidos de portal, promessas de regresso

 

mas aonde

pergunta

 

         O FORASTEIRO

                    MENINO

 

 

-c-

 

No véu da Urca arde o desejo

e uma voraz quietude

altera

os acordos,

sua delgada rotina

 

         E por último, o mar

 

           que NÃO responde ao MENINO

 

                       ESTRANGEIRO

 

 

-ch-

 

O silêncio, tormenta do passado, butim de incerteza,

expande seu contorno ao contrário da chuva que

         na Urca

           se retrai

 

Nem sinal de telefone nem punho que à porta golpeie

nem carta com vistosos selos de uma cidade ao sul

 

Curiosa caixa chinesa de mudez mercenária:

    com olhos de moiré alguém vigia

    e no silêncio oculta

        o roubado

 

Em seu desterro

o menino se busca no vidro e não se dá conta de nada

 

A sede o leva à água real

 

                            O SANTO LEITE ANSEIA

 

 

d-

 

No céu, nesse ar limitado que respira

há um veneno primordial

de gestos inconclusos, histórias por viver, cenas truncadas

 

A macabra insistência de peixes apodrecendo

 

Nem sequer se admite

essa descomunal distância do que era antes:

menino elo perdido fora da corrente

menino que arrasta

um ínfimo relato em outra língua

 

Nada é aquilo que era

 

                   SANTO LEITE

 

                            SEM URCA

 

 

-e-

 

Alcione Clara Milton Caetano Chico Maria Ney

 

Cometas de matéria luminosa

 

         Veludo do Rio

 

Suavidades na noite estrelada

onde roda

a falsa biografia do cativo

 

E o mar

 

         o mar com sua engrenagem única

 

para sobreviver ao simulacro

 

         nos Jardins da Urca

 

 

f-

 

Roga por cardamomo, por benjoins, por canela;

em aguardente de gengibre impregna

sua pobreza de pais

 

Roga em queixosa instância:

confuso monge, coração despido

sitiado pelos dias, reminiscente, obtuso

 

Roga o estrangeiro, menino elo perdido que tinha sido

oscilante fantasma elusivo

 

                           Que o Cão da Piedade

                     ao fatigado menino o proteja

 

                          Ao que se solta da mão

                      e a gritos chama os amigos

                             o proteja

 

                      Ao que foge da morte

 

                      MÃE CALADA

 

                                       o proteja

 

-g-

 

 

O que antes foi filho verdadeiro, o pertinaz infante

aceita o deserto

ainda que haja umidades na rua, ainda que um rumor

de brisa fale ao ouvido

 

Não há terra prometida nos Jardins da Urca

 

Sua palavra de imigrante de repente

há de crescer em outra parte

e ele

não está lá

nem acá

onde o presente

é

rasgo, puxão, fiapo

ausência

que se instala

 

 

         Que foge da morte

 

                   MÃE CALADA

 

 

Esse lugar ao que sem pompa chama o presente

         agora é

         o que há

         entre aqui e lá 

 

 

Nunca

         de modo pleno lá

 

Nunca

         de modo pleno acá

 

onde

 

         Urca

 

abre sua boca mentirosa e oferece

 

 

                                      UM PEITO SECO

 

-h-

 

Busca, tenta, reclama, necessita, suplica?

 

                            O quê?

 

                   O SANTO LEITE ORIGINAL

 

 

Nisso

ainda que não saiba de que fala

se esconde o que é

e se a morte

o consente

O ESTRANGEIRO

revolverá no escuro

 


-i-

 

O desterrado sem ontem sabe

que a memória é o espaço onde ocorrem as coisas

   pela segunda vez

 

Sabe

que memória é verdade

que verdade não é esquecimento

e espera

    -grito atado em trapos-

aprende

a esperar

 

desabrigado, sem idade,

recorre o caminho para trás

para reunir sob a luz dos Jardins da Urca

as chaves de seu MENINO

 

 

    E por último o mar

 

       que NÃO responde

 

 

 

Página publicada em outubro de 2007.




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