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BORGES TRADUZIDO POR
AUGUSTO DE CAMPOS

 

 Resenha de Antonio Miranda



BORGES, Jorge Luís.  Quase Borges – 20 transpoemas e uma entrevista. Traduções de Augusto de Campos.  São Paulo: Terracota, 2013.  90 p.  ilus.  14x21 cm.  Em parceria com Musa Rara.

 

          Augusto de Campos remete-nos à transcriação, no lugar da mera tradução. Tradução-arte. Escuda-se na convicção de que a tradução literal é “a mais infiel de todas, por dar somente o sentido e não o essencial, que é a linguagem”.  E conclui: “Para tanto, seria preciso haver uma recriação do texto, ou talvez uma criação diferente” Seu último trabalho – Quase Borges — 20 transpoemas e uma entrevista — apresenta-nos um tradutor-criador maduro, com uma longa, perseverante e experimentada trajetória.


          No caso da tradução do castelhano existe a falsa facilidade da proximidade com o nosso idioma.


          Há quem prefira, no caso do espanhol, que se faça uma tradução bem literal ao lado da original apenas para servir ao entendimento da original...  Mas sabemos que não basta, que se espera do tradutor que nos brinde com uma tradução tão satisfatória que, em muitos casos, o leitor nem vá ao original, mesmo numa língua tão próxima. (As traduções de línguas tão longínquas como o russo ou o árabe: só em raros casos o leitor iria aos originais e, se for a eles, é porque domina a língua em alguma extensão... e a tradução seria como uma reiteração ou confirmação do entendimento de sua própria leitura.) De novo voltamos à questão da conveniência das edições bilíngues que Augusto adianta não serem da aceitação de Jorge Luís Borges.


          Estamos diante de uma edição bilíngue, de grande interesse para quem pretenda aprofundar-se na leitura do célebre escritor argentino.  Mas a edição conjunta Musa Rara e Terracota merece alguns reparos. Alguns problemas de revisão de textos e até de tradução. Por exemplo, à página 45 aparece o verso “O cheiro do jornal e dos periódicos” como transcriação de “El olor del café y de los periódicos”, verso que não oferece nenhum problema à tradução. “O cheiro do café e dos periódicos” seria o mais correto, e óbvio.

 
          Outro exemplo: na página 47 temos o verso transcriado “Só uma coisa não há. Esta é o olvido”.  Em espanhol temos: “Sólo una coisa hay.  Es el olvido.”  No original, uma afirmação, na tradução a negativa. “Esta é” soa redundante. Mas é aceitável, entendida a dificuldade de traduzir poesia rimada, metrificada, tentando manter sentido e ritmo. (*)

          Mas existe também o caminho de tentar recriar os valores formais do “original” ou “forma-alma” na acepção de Augusto de Campos. Verdadeiros “achados”... Na parte inicial do livro em que relata as duas visitas que fez ao apartamento de Borges em Buenos Aires, em 1984, Augusto comentou as virtuosidades das traduções com o grande mestre. No atual livro, Augusto traduz “rasgos” por “rugas”, mantendo o “r” e o “g”, em vez de optar por outras palavras, pois a tradução não é literal... “Traços”, “feições”, seriam outras alternativas, para falar dos elementos distintivos ou de reconhecimento de uma pessoa ou coisa. Sem dúvida, “rugas” faz referência a um só elemento distintivo, mas resulta um “achado” ou equivalente morfológico engenhoso, mais interessante e apropriado aos objetivos da transcriação.  (Na música preferem intitular “versão” o esforço de enquadrar uma letra traduzida no compasso da melodia; no poema se trata de um recurso morfológico no contexto da criação semântica — recriar, em vez de traduzir. Podemos até admitir a possibilidade de que a transcriação possa superar o original, em raríssimos casos. 


          Cabe ainda ressaltar que Augusto percebeu a relação entre a poesia e prosa do autor de O Aleph: “Não há praticamente nada em seus versos que não remeta às suas obsessões: o espelho, o tigre, o tempo, a vida desdobrada e redobrada sobre si mesma, os autores que assombram o seu imaginário e as suas vivências.”


         
A seguir, uma das traduções e o texto no original para o confronto:

 

UN CIEGO

 

No sé cuál es la cara que me mira

Cuando miro la cara del espejo;

No sé qué anciano acecha en su reflejo

Con silenciosa y ya cansada ira.

 

Lento en mi sombra, con la mano exploro

Mis invisibles rasgos. Un destello

Me alcanza. He vislumbrado tu cabello

Que es de ceniza o es aún de oro.

 

Repito que he perdido solamente

La vana superficie de las cosas.

El consuelo es de Milton y es valiente,

 

Pero pienso en las letras y en las rosas.

Pienso que si pudiera ver mi cara

Sabría quién soy en esta tarde rara.

 

 

UM CEGO

 

Não sei qual é a cara que me mira

Quando olho minha cara em um espelho;

 

Em seu reflexo não sei quem é o velho

Que me olha com cansada e muda ira.

 

Lento na sombra, com a mão exploro

As invisíveis rugas. Eis que assoma

Um lampejo. Vislumbro a tua coma

Que hoje é cinza ou ainda é de ouro.

 

Repito que perdi unicamente

A aparência superficial das cousas.

O consolo é de Milton e é potente,

 

Mas penso nas palavras e nas rosas.

Penso que se pudesse ver-me a cara

Saberia quem sou na tarde rara.

 

(*) Impossível não lembrar a ruidosa polêmica havida com o poeta Bruno Tolentino décadas atrás, quando o agressivo crítico questionou traduções dos irmãos Campos do inglês que não seriam “admissíveis”, gerando uma tremenda briga pelos suplementos literários, à época, com agravos e desagravos a favor e contra os tradutores.  Toda unanimidade é burra, dizia Nelson Rodrigues, sempre há espaço para a contestação. Mas agora é possível atestar a competência e a habilidade de Augusto de Campos no difícil território da tradução de poesia. Ou recriação, perdão.

 


 

 

 
 
 
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