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ALDISIO FILGUEIRAS: A PALAVRA INVENTA E DEVORA

 

 

 

 

Por Antonio Miranda

 

 



Pois o homem é palavra

que inventa

e assina em baixo

para não esquecer”.

 ALDISIO FILGUEIRAS

 

A poesia do poeta amazonense Aldisio Filgueiras, em sua mais recente obra poética — NOVA SUBÚRBIOS (Manaus: Valer Editora, 2006) — certamente renova a linguagem da poesia contemporânea brasileira como queria Edgar Morin: pela raiz, pelas entranhas. Voz apocalíptica, sem fé, denunciando a decadência e a miséria humanas de nossos subúrbios eufemizados: “—Ai! Este povo em fuga/ Que nem a bênção / do Pai norteia.”

 

Descarna gentes estranhadas, rasas, de “formas písceas e humanas”, bestas-feras inocentes, vítimas da miséria, vistas pelo avesso, pelas vísceras. Imagens demenciais, de povos desterrados, retirantes, em diáspora sem fim. Numa linguagem coloquial, confessional, de espanto, de medo e arremedo daquelas (estas) vidas mínimas, ínfimas, exíguas, que vagam pelas ruas, pelos subúrbios, “no triunfo do lixo”.

 

           “Até mesmo/ os pássaros / arriscam-se / a viver sem /para não morrer de.”

 

Antilinguagem. Aldísio evita as metáforas e se entrega à alegorias, às palavras mais cruas como signos pulsantes, denunciantes, sem mistificação, sem temor ao banal e ao coloquial. Versos às vezes truncados, que apenas insinuam, vociferam.

 

            “Maldita a cruz em que eu.”

             “... lá — bem longe / onde o pôr-do-sol.”

 

Denuncia a condição (des)humana, seus espelhismos: “visagens de vídeo”, que são miragens de um consumismo às avessas, que nos consome, nas frustrações e ilusões de “zona franca” e de bugigangas:

 

            “mas eriçam / (em vão) os pêlos mais / discretos e, sem existir / em carne e

              osso e suor, existem, de tanto insistir / que existem. Para quê”.

 

Evoca um rio ditirâmbico e mambembe, no centro da hiléia amazônica (como por associação, em qualquer metrópole do mundo em desespero): “... o rio ...e ... rua”, dialeticamente como o campo e cidade, dos retirantes com “uma bagagem de filhos”, despojados de ser e de ter, despejados na urbe, pois : “A cidade / engana quem a procura / para ser um lugar”.  Um rio que serpenteia e se metamorfoseia em rua por onde as pessoas “nadam sem endereço”.

 

             “O ser humano / é um rio / de uma só / margem interior”.

 

Homem-rio, serpentário. Impossível não associar o texto de Aldisio Filguieiras ao do mestre João Cabral de Melo Neto. Um rio menos didático e prosaico que o do mestre pernambucano, mais instigante ainda, menos contido e introvertido que o do poeta da paisagem agreste. Versos tensos, curtos, ressentidos: “em restos e trapos: roupas / ou o que restou delas) / têm remendos de pele suja”, mas sem declinar do lirismo:

 

               “Traz notícias frescas / de festas ribeirinhas / e uma lista / de saborosas     

                saudades / como se nunca viu / para o café da manhã. ”

 

Como flor de lótus ou lírios despontando dos dejetos de igapós poluídos. Em vez de mocambos, palafitas. Metapoesia justiceira que “Não bastante, atualiza.”

 

                “E se a palavra se fecha

                  em copas e num piscar

                  de olhos (como o homem

                  se fecha em si e finda

                  mudando de nome e dono

                  não quer dizer que vá

                  terminar em nada e sim

                  acabar em tudo, palavra.”

 

Experimentalista, ensaia poesia visual, plástica, na concretude das letras que constroem arquiteturas verbais significantes:

 

                                  mata                  mato

                                  mata     verde      mato

                                  mata                  mato

 

Às vezes cínico, às vezes sarcástico, não raro também paranóico, deixa o leitor sem fôlego, sem sossego. Outras vezes ironiza, satiriza a politização do discurso e a mercantilização da fé, em versos cruéis:

 

“Uma camisa

sem pé nem cabeça

despenca

dos andaimes

frouxos

mão na

frente

outra atrás

sem pagar o aluguel.

 

Aleluia! Aleluia!”

 

Um livro-poema sálmico, irado como a voz de um profeta do destino. Demoníaco, que reconstrói  “este texto em que quase / jazz.” Obra de decantação e remissão, porque “Esta é a ecologia / no cotidiano do texto.”

  

Com Aldísio Filgueiras a poesia brasileira do século 21 se renova pela melhor tradição, renasce das cinzas da mesmice, dando um coice no beletrismo (ainda) em voga e se institui, consciente e agressiva — ainda que com certo pessimismo por não crer “mais que o sol possa / aquecer sozinho o sol”.

 

“Nova Subúrbios” é o melhor livro desta temporada e poucos virão com tanta força e tanta qualidade. É um livro para se ler muitas vezes.

 



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