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A POESIA DA FORMA:

Brasília e a Proposta da II Bienal Internacional de Poesia de Brasília – II BIP (que, lamentavelmente, não aconteceu...)

 

por Antonio Miranda

 

 

 

Texto extraído do exemplar único, tentando entender a origem do design arquitetônico, a poesia da inovação e a integração das artes propostas desde a Bauhaus até o advento das novas tecnologias no processo criativo:

 

II BIENAL INTERNACIONAL DE POESIA DE BRASÍLIA – Poemário. Org. Menezes y
Morais.  Brasília: Biblioteca Nacional de Brasília, 2011.  s.p.  Ex. único.

 

 

Acompanhando Max Bense em sua visita a Brasília, 1961:

 

Enquanto com Max Bense eu ia

como que sua filosofia

mineral, toda esquadrias

do metal-luz dos meios-dias,

arquitetura se fazia:

mas um edifício sem entropia,

literalmente, se construía,

um edifício filosofia.

 

Enquanto Max Bense a visita

e a vai dizendo, Brasília,

eu também de visita ia:

ao edifício do que ele dizia;

edifício que, todavia,

de duas formas existia:

na de edifício em que se habita

e de edifício que nos habita.

 

         João Cabral de Melo Neto

         (Museu de Tudo, 1975)

 

         Cabe ressaltar, a II BIP – Bienal Internacional de Poesia era para ter sido celebrada em 2010, comemorando o cinquentenário de Brasília, mas a crise institucional – que levou à derrocada do Governo do Distrito Federal –  obrigou-nos a adiar o evento para 2011. Ou seja, uma Bienal que acontece no terceiro ano... Mas celebramos uma Pré-Bienal, com poetas estrangeiros e de Brasília, com a presença de Zeca Baleiro, para dar satisfação à comunidade. Agora estamos de volta, trazendo à consideração do publico uma valiosa plêiade (no seu sentido estelar de “coisas maravilhosas e pessoas ilustres”) que estão na origem da cidade e, muitas delas (quase todas!)  circunstanciadas com o conceito da criação e da Poesia. Afinal, poesia vem de poíesis e tem tudo a ver com a idealização da Nova Capital do Brasil, no sentido da concretização de uma ideia como forma de expressão civilizatória incomum. Como percebeu o genial Max Bense, o urbanismo da nova Capital permite uma consciência poética inteiramente distinta, uma consciência que também abre espaço à poesia artificial da pureza estrutural e à concreta materialidade da palavra (Max Bense), em seu livro emblematicamente intitulado Inteligência brasileira. (p. 30).

 

         Brasília tem a ver com um projeto novo de país, com a projeção de um novo conceito de criação coletiva, com novas formas de habitabilidade e socialização. Não é à toa que o filósofo da arte alemão Max Bense, que a visitou em seus primórdios, entendeu o sentido teleológico, de futurismo e de projeção social da cidade.

 

         “Daí que em Brasília interessam menos as edificações isoladas do que o seu conjunto, prevalecendo a relação topológica e estética que elas estabelecem entre si” (...), “pois Brasília não é um aglomerado humano, é um projeto de urbanização que orienta um novo sentido de vida e de viver: também aqui pode-se observar a mecânica do mundo técnico liberar-se do modo crescente das articulações casuais da existência e das partes do corpo e tornar-se abstrata. E neste tipo de monumentalidade a arquitetura, enquanto plano e espírito, retoma o que perdeu em sentimento e sensibilidade”. (Max Bense, p. 27)

 

         Palavras proféticas, ao mesmo tempo em que resumem a proposta do urbanista  Lúcio Costa e sua equipe, na concepção arquitetônica e vivencial de Brasília. Então, “podemos falar de concreção, de realização concreta, de uma capacidade concreta de expressão, de representação, arte, arquitetura” (p.28). Ou seja, “o urbanismo da nova Capital permite uma consciência poética inteiramente distinta, uma consciência que também abre espaço à poesia artificial da pureza estrutural e à concreta materialidade da palavra”, (p.30). Brasília é o exemplo vivo de uma nova forma de criar e conceber o Brasil, que vinha sendo gestada em nossa miscigenação e em nossa urgência de criar uma nova civilização, como bem perceberam visionários (vistos como utopistas) como Dom Bosco, Stefane Zweig e Max Bense, entre tantos.

 

         Na celebração do primeiro cinquentenário de Brasília, queríamos homenagear o poeta Ferreira Gullar, um dos pioneiros na pregação do ideário da integração das artes. Gullar foi o primeiro diretor da Fundação Cultural do DF e promoveu, nos esqueletos da construção do Teatro Nacional, um encontro de intelectuais de que participaram o já citado brazilianista Max Bense e o nosso teórico máximo das artes, que foi Mário Pedrosa,  em 1961, quando ainda Brasília firmava sua identidade. Ferreira Gullar é o principal homenageado da II Bienal Internacional de Poesia de Brasília.

 

         Mas, cabe ainda ressaltar, na gênese desse pensamento construtivista, a teoria da integração das artes. Brasília é a primeira expressão urbana deste conceito proposto nos primórdios do Bauhaus, como agenda criadora de um novo design de cidade e de vida. O modernismo na arquitetura –  que tem raízes meridionais e expressões como Le Corbusier –  está na origem de nossa concepção estética de arquitetura moderna, desde a construção do antigo Ministério da Educação e Cultura, hoje Palácio Capanema, no Rio de Janeiro, associado com os gênios de Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Burle Marx e Cândido Portinari, entre outros. Integrar arquitetura, paisagismo, urbanismo com a escultura, a pintura, a cenografia, a música e a poesia numa criação coletiva e transformadora. Acreditando que só existe criação no coletivo, que o individualismo é apenas um recorte de uma criação coletiva... Ainda que se reconheça que os grandes criadores rompem paradigmas e apontam para novos caminhos.

 

         E foi nos canteiros de obra de Brasília que aqueles sonhadores do concreto projetaram a materialização de uma nova poesia.

 

         A exposição de poesia visual intitulada Obranome 5, no âmbito da pluralidade da II BIP, com projeto e a curadoria de Wagner Barja – que hoje orienta o programa museal e as mostras de nosso Museu Nacional do Conjunto Cultural da República e da galeria CAL / DEx – UnB –  vai revelar pela terceira vez em Brasília um conjunto de obras de poetas “verbivocovisuais”, aqueles que integram na poética visual a imagem da palavra com o som, em tecnologias analógicas e digitais do vídeo, da animação computacional eletroeletrônica, que, face às novas tecnologias, impulsionam a poesia do século XXI. Poetas visuais brasileiros e estrangeiros, com obras voltadas para o tema central da BIP, exibirão em Obranome 5 peças originais, especialmente criadas ou integradas pela curadoria no contexto da convergência das linguagens artísticas. Conforme o proposto pela BIP, estas obras serão exibidas no Museu Nacional da República, em conluio com a própria arquitetura desse maravilhoso espaço em formas planas, tridimensionais, bidimensionais e unidimensionais, em videopoemas, performances, instalações, projeções ou simplesmente em releituras de textos. Nesta 3ª edição, a mostra Obranome 5 pretende plasmar –  de forma mais evidente que nas edições anteriores – o fenômeno da multidimensionalidade espacial, os seus ambientes imersivos e interativos, para transmitir ao público o estado da arte concebida numa nova poética processual que se afirma e se diferencia numa verdadeira profusão de linguagens artísticas, como quer o conceito transversal da II BIP.

 

         “Não pode nenhum poeta — nem ninguém — ter a pretensão de estabelecer rumos e regras para a poesia. Não resta dúvida de que a poesia, como qualquer outro fenômeno social, está sujeita a determinações do espaço e do tempo históricos, mas o modo como essas determinações atuam sobre a produção do poema é absolutamente impossível de prever-se.” Ferreira Gullar.

 

         Não temos receita para turbinar e reciclar a poesia, porém, temos os fermentos e podemos criar as situações. Assim entendemos a Bienal Internacional de Poesia de Brasília, como a busca do estado da arte, que compreende o que se propôs nos anos 50, como forma vislumbrada, mas desaparelhada: era uma antecipação. Só agora é que podemos atingir aquele utopismo, por caminhos radicalmente inovadores, mas, como queria Edgar Morin, em sua teoria da complexidade, com a poeira da estrada, com a constância de nossos ideários e raízes, interligados.

 

         Não há saudosismo, muito menos reaquecimento na proposta da discussão da integração das artes. Brasília foi enjaulada durante duas décadas de ditadura. Houve  uma suspensão daquela inteligência, que só persistiu na clandestinidade. A “verbivocovisualidade” estava na poesia e na arquitetura. A integração das artes se dava ainda mais por somatórios do que por amálgama... No tripé que citamos, do Max Bense reclamando a parte tecnológica, agora é que amadureceu e aponta para desdobramentos imprevisíveis em termos de criação solidária, coletiva. O conceito de Obranome –  que tem a ver com o poema-não-objeto do Gullar, com o conceito de obra múltipla do Bense, com a teoria do não-objeto dos neoconcretistas –,  está ainda amadurecendo...

 

         Melhor é fazer e mostrar do que ficar fazendo proselitismo, redigindo manifestos, criando ortodoxias e ditando formulários para a criação alheia.

 

         A II BIP pretende, também, fazer um balanço da Poesia que se oferece no mundo, com a participação de poetas convidados de muitos países, do  Brasil e da nossa cidade. Uma poesia que escapou dos “ismos”, das ortodoxias e dos manifestos vanguardistas, para assumir uma pluralidade de formas e expressões que acontece agora não apenas nos livros e revistas, nos bares e teatros, mas também nos blogs e revistas eletrônicas, nos CDS e DVDs, combinada com música e teatro, em espaços públicos e por toda e qualquer forma de criação. Mesmo as tradicionais e consagradas como o soneto, o cordel, a MPB - Música Popular Brasileira ou a da crítica social e política, a que revela as questões das minorias e dos despossuídos.

 

         A I BIP começou com o II Simpósio de Crítica de Poesia, coordenado por Sylvia Cyntrão, da Universidade de Brasília, onde o tema entrou em questão pela visão dos especialistas convidados. Entretanto, a I BIP aconteceu em toda a cidade, irradiando-se dos espaços da Biblioteca Nacional de Brasília e do Museu Nacional, passando pelo Teatro Nacional Cláudio Santoro, bibliotecas públicas das cidades satélites, pelos centros culturais do SESC, faculdades e terminando em bares e cafés e na Barca Brasília, no passeio turístico-cultural que acontece no final de semana da lua cheia no Lago Paranoá, chamado de “Barca da Poesia”, que proporciona aos tripulantes uma paisagem diferenciada da Capital do Brasil.

 

         Poesia é, no sentido atual, a criação de uma nova realidade e não mais a descrição de realidades visíveis... O conceito de poesia visual é, pois, arquitetônico, de design, de constituição de uma realidade autônoma, exógena, que é projetada para fora, que é reinterpretativa, recriada pelo leitor ou espectador. No fundo, sempre foi assim, mas não admitíamos. “A tarefa não é tanto ver o que ninguém tinha visto, mas pensar o que ninguém pensou a respeito do que todo mundo vê”, como disse Schopenhauer, ou seja, que a literatura desvenda o não visto e que só é visível pelos meios que concretizam uma ideia, um sentimento, uma visão de mundo. Todos vemos Brasília, porém, algumas pessoas desvendam significações que escapam à nossa percepção descuidada ou despreparada. A Arte nos aproxima de um entendimento do mundo, que reconhecemos sem termos visto antes. Um paradoxo que só a Poesia pode revelar-nos.

 

         A II BIP quer revelar o que a Arte tem de original, de própria e de construtiva: a do design como “uma modalidade de mediação da configuração do mundo”, a constatação de que a cidade se construiu na utopia de uma integração das artes, “mediante a construtividade técnica, a concepção artística e a produção industrial”, ingrediente de um “novo conceito de civilização”, como ressalta Max Bense. Ele, que no início da cidade, a partir da arquitetura, da arte e da poesia, anteviu um Brasil de criatividade renovada, sem ufanismos e chauvinismos. “Esta cidade inteiramente artificial — está claro o que pretendo dizer com isso — é a primeira expressão visível de um cartesianismo na forma do design. Expressão de um design total análogo à ideia de uma obra de arte total, um enorme reservatório, tanto da inteligência técnica quanto da artística, e representação não casual, porém necessária dessas forças sintéticas, num espaço prospectivo de civilização”, ainda na interpretação de Bense, que está na proposta do temário da II BIP.

 

         Palavras que necessitamos ouvir no momento de reflexão sobre o significado da Capital Federal, como poiesis, quando estávamos à beira de um pessimismo que nos turva a visão de futuro, para reencontrarmos, ou melhor, reorientarmos os nossos caminhos. E para não dizer que não falamos de flores..., devemos relembrar que o momento da criação de Brasília, na precariedade da infraestrutura do país nos anos 50 do século passado –  quando fomos capazes de espantar o mundo com a construção de nossa Capital Federal como marco decisivo da arquitetura moderna –  levamos aos cinemas de toda parte a inventividade do Cinema Novo apenas “com uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”; projetamos a Bossa Nova de forma definitiva em todo o planeta a partir de barzinhos e redutos universitários da Zona Sul do Rio de Janeiro; e conquistamos, pela primeira vez, a Copa do Mundo de Futebol em 1958, e devemos marcar nosso vanguardismo com a irradiação do conceito de poesia concreta, que hoje é tema de teses e pesquisas em muitos países, além de outras conquistas que, havendo espaço e tempo, poderiam ser rememoradas. Nesse afã, a II Bienal Internacional de Poesia de Brasília pretende cunhar mais um título para a cidade, a de Capital Brasileira da Poesia. Por que não? Haveremos de.

 

         BENSE, M. Inteligência brasileira. (São Paulo: Cosacnaif, 2009. 120 p.)

         GULLAR, FERREIRA. Sobre arte; sobre poesia  - Uma luz do chão. (2ª ed., Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2006).

 

 


 

 

 
 
 
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