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                   CONCRETISMO E NEOCONCRETISMO 
                  por Gilberto Mendonça Teles 
                    
                  O  concretismo tem as suas raízes numa qualidade essencial da obra de arte, ou  seja, a noção do espaço ocupado pelo objetos que trata esta ou aquela  modalidade artística.  Noutras palavras:  o objeto de determinada obra de arte, isto é, o material, o conteúdo, a  mensagem que o artista quer expressar, seja na música, na pintura ou na  literatura, nada mais é que um objeto visual (ou absurdo), ocupando também um  lugar virtual, mas que ao expressar-se concretiza, torna-se material, como os  sons de uma sinfonia (por exemplo a V Sinfonia de Beethoven, a 1812 de  Tchaikovsky, a A Aquarela do Brasil de Ari Barroso), como as linhas e as cores  de uma paisagem e os ritmos e as mensagens de uma poema escrito. 
                   
                    2. O artista deforma a realidade e  extrai dela a sua visão pessoal, abstrata, impressionista, , que, para ser  comunicada, precisa tomar uma forma concreta qualquer. 
                    Essa qualidade da obra de arte, entretanto, vinha sendo posta de lado.  Aproveitam-se mais outras qualidades, como a imitação da realidade , a estética  puramente  sintática, isto é, somente  sentida na totalidade da frase, em correlação com outras palavras conhecidas  pelo sujeito, predicado e complementos.   Chegou-se a um momento de crise em que o artista se encontrava diante do  mundo só e podia revivê-lo dentro de determinadas formas consagradas. Era  preciso mudar de métodos, tentar novas formas consagradas. Era preciso muar de  métodos, tentar novas fórmulas estéticas para fazer uma mensagem original,  nunca emitida. A linguagem, além de deficiente, já estava demasiado gasta,  inoperante, o que vale dizer, a linguagem como a conhecemos já havia oferecido  toda a sua contribuição ao artista. Toda a sua estrutura sintático-discursiva  nada mais era que um espécie de chavão, sem nenhuma originalidade e incapaz de  transmitir certas importantes mensagens humanas.   
                  3. O  tempo presente reclamava outra maneira mais rápida e — digamos — mais explosiva  para a comunicação de ideias, principalmente estéticas. Para o poeta moderno —  não o concreto — pudesse continuar original, transmitindo alguma coisa sua  dentro de uma forma ainda virgem, foi preciso que a significação das palavras,  ou seu conteúdo semântico significativo, se metamorfoseasse adquirisse novos  significados, ficando o poema quase sempre herméticas, indecifrável  Prova disso, mesmo no Brasil, porque isso é um  fato comum em todo o mundo civilizado, são os últimos poemas de Ledo Ivo e  principalmente os de João Cabral de Melo Neto, dois precursores do concretismo. 
                     
                    4.  
                    Havia portanto um esgotamento na formalística da poesia brasileira, quando um  grupo de poetas, que há muito vinha tentando novos recursos de expressão fazer  o homem voltar ao terra-terra, àquilo que o cerca e com que ele está sempre em  contato que, por um preconceito, havia sido posto de lado. Esse grupo que  queria que o poema participasse da vida do homem, que ele fosse útil e que  desse, além da sensação lírica conhecida, um sentido artístico da atual  infraestrutura econômica e social do povo brasileiro. Era precisos fazer a  poesia aproximar-se do homem, neste mundo tão conturbado e materialista. Era  preciso fazer no entanto fazer uma poesia materialista, tomada a palavra no seu  mais amplo sentido, sem nenhuma restrição de significado  político-ideológico. E por aí passa uma das  contradições do concretismo.  Para fazer  a poesia ficar mais em contato com o mundo contemporâneo, os poetas desse grupo  lançaram mãos de novas técnicas estruturais e temáticas para o poema. Assim  começaram a utilizar os anúncios luminosos, os semáforos, a técnica de  propaganda, os recursos visuais capazes de chamar a atenção do homem da era  atômica. 
   
                    1. HISTÓRIA 
                   
                  A  história do concretismo pode ser traçada  dentro de um quadro bastante sintético, onde  somente se mencionam os fatos mais característicos, como: 
                  
                    - Mallarmé,  o pai do símbolo, no fim de sua carreira literária realiza uma obra que vinha  romper com o sistema tradicional da linguagem.   Trata-se de seu poema-livro — Um coup de dés — de 1897, onde o  Mestre simbolista lança mão de elementos como o espaço em branco, as variações  tipográficas das letras para tirar disso maior efeito não só vocal, mas também  visual. Esse poema entretanto só veio a ser publicado em 1951.
 
                     
                    - Outro  poeta que também contribuiu com suas experiências estéticas para o nascimento  do Concretismo foi Ezra Pound, americano que, com os seus ideogramas à maneira  chinesa, revolucionou os círculos literários do mundo. Os Cantos de  Pound são a grande épica do século. É bom esclarecer que o chinês, língua do  tipo monossilábico, tem a sua sintaxe puramente relacional baseada  exclusivamente na ordem ideogrâmica das palavras. Pois bem, o chinês não possui  nenhum termo correspondente ao nosso termo abstrato — vermelho. Para  expressá-lo, já que o sente, utiliza ideogramas justapostos, como:
 
                   
                   
                    c) 
                    
                  Rosa 
                    Cereja 
                    Ferrugem 
                    Flamingo 
                   
                                                  (todas palavras  indicando vermelho. 
                    
                  
                    - Apollinaire  é também outro poeta que os seus Calligrammes A   ajudou a construir o alicerce da poesia concreta. Merece aqui  que se faça uma distinção entre "ideograma" e Caligrama".
 
                      Enquanto o ideograma é uma palavra ou grupo de palavras com significados mais  ou menos semelhantes que se associam para representar outra idéia, o  caligrama  (que foi usado por  Apollinaire) nada mais é que um conjunto de palavras associadas a um desenho,  sugerindo a forma do objeto que se descreve   como no poema sobre a chuva , em que o poeta da à frase um sentido  vertical, imitando a chuva. 
                     
                    - Joyce  é outro que contribuiu para a poesia Concreta, através de sua prosa  especialística , principalmente no Finnegans Wake (romance que lhe custo  quinze anos de trabalho e cuja linguagem constitui motivo principal da  obra).  James Joyce , o poeta-pensador  irlandês, associa palavras por justaposição, criando termos diferentes, como  aliás está acontecendo aqui no Brasil com João Guimarães Rosa. Exemplos de  associações: minúltima, milágrima, canceulou, etc.
 
                     
                    - Cummings,  outro poeta americano de grande valor e cujas experiências foram aproveitadas  pelos concretistas. O espaço tem grande importância impressionista em seus  poemas, como tem também o aspecto físico da palavra.  
 
                   
                  
                    -  Giuseppe Ungaretti, poeta italiano  ("Mattina" : M´illumino d´inmenso"). 
 
                   
                  
                    - Garcia  Lorca tem o poema — Remansos" — em que a sintaxe é abolida:
 
                       
                      Ciprestes 
                      (água represada) 
                      Chopo 
                      (água cristalina) 
                      Vime 
                      (água profunda) 
                      Coração 
                      (água de pupila)  
                   
                  
                    - O  Concretismo no Brasil
 
                       
                      I  – Oswald de Andrade, grande figura do modernismo, com o seu poema: 
                         
                        As coisas são 
                        As coisas vêm 
                        As coisa vão  
                   
                  II –  O nosso querido Cassiano Ricardo tem poema desse tipo em suas obras, como  "Serenata": 
                  Rua     lua      tua 
                    torta     morta     porta  
                  III  – João Cabral de Melo Neto é dentre todos o mais concreto, conquanto ainda  ainda discursivo. Mas ele utiliza objetos ou referências concretas para sugerir  idéias abstratas como nas suas áreas de "faca só lâmina", de engenharia,  etc.  Definindo o acaso, diz "tiro nas  lebres de vidro / do invisível". Diz que "flor é a palavra flor" e usa ainda  faca, bala, relógio, para expressar o ato de procurar a poesia (a faca), o  encontro ocasional (bala, tiro) e o tempo (relógio). 
                   
                    NOTA:  Em 17.01.1950, o mesmo jornal publicou a segunda parte deste artigo, sob o  título "A Experiência Vanguardista – II", hoje transcrita em Gilberto Mendonça  Teles  Estudos Goianos – (A  Críticae o Princípio do Prazer).   Goiânia: UFG, 1995. 
                     
                  Extraído de: 
                  
                  TELES,  Gilberto Mendonça. Improvisuais: poemas visuais. Goiania,  PUC-GO; Kelps2012. 150 p. ilus. col. (Coleção Goiana em Prosa e Versos) ISSN  978-85-8106-286-0  
                    CDU 821-134-3(81)-                                                                        Ex.  bibl. Antonio Miranda 
                  
                   
                  
                    
                
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