A POESIA BRASILEIRA, EM QUE DIREÇÃO?
ANTONIO MIRANDA
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Agora é a vez de Antonio Vicente Pietroforte com seu “O Discurso da poesia concreta – Uma abordagem semiótica”. Recentemente foi a vez de Marcos Siscar com “ Poesia e Crise – ensaios sobre a poesia brasileira”. Há certas confluências entre as obras na medida em que eles abordam o cenário atual da poesia no Brasil e dedicam espaço considerável para o legado da poesia verbivocovisual e apontam para as questões da confluência tecnológica (imagem, som e texto numa plasticidade virtual amalgamadora).
Ainda estamos lendo o texto de Antonio Vicente Pietoforte, de forma adiantada mas não conclusiva, e ele revela uma complexidade na abordagem, sobretudo pelo método usado que é mais analítico do que crítico, que focaliza muito a fôrma embora ajude a interpretar a forma da nossa poesia. Usa instrumentos de precisão que requerem alguma iniciação para acompanhar o discurso do hermeneuta.
Nem Antonio Vicente nem Marcos Siscar pretenderam pautar a análise em termos conclusivos. O livro de Siscar não é um tratado mas um conjunto de ensaios bem encadeados. Pietroforte pretende estudar a herança do Concretismo mas os exemplos e análises com que esgrima são muito mais amplos, entrosam poetas de cânones diferentes, do modernismo às novas vanguardas, dos mais tradicionais aos desbravadores.
É difícil a análise do contemporâneo, sobretudo no momento em que ismos e escolas estão em retirada, mas continuam nas raízes. Quando se prega que acabou o conflito de gerações e se reconhece que há os passadistas e os blogueiros: há os que aproximam a poesia da música e do espetáculo e os que advogam pela torre de marfim. Os que apelam para a tecnologia nas instalações e os que usam o corpo nas interpretações. É isso mesmo. Creio até que há mais tolerância dos jovens da geração “Y” digital, dos virtuais de videopoemas e intervenções urbanas com relação aos poetas vivos de plataformas anteriores — os remanescentes da Geração 45, os seguidores do Modernismo, os que continuam avançando agora na animaverbivocovisualidade, os do tropicalismo e da poesia marginal, e até com o cordel e o soneto, do que dos mais antigos em relação ao jovens.
Poesia e tecnologia, poesia e periferia, paideuma e celeuma. Hip hop, rap e rapadura.
Pode não haver ainda distanciamento para estudar e entender as novas tendências, mas só penetrando em suas camadas produtivas e reprodutivas é que será permitido acompanha-las e até entende-las... Favela e condomínio de luxo. A escolarização, a inclusão digital e a elevação, ainda que “gradual” de nosso nível de cultura e cidadania, vêm desterritorializando esta questão, deslocando-a dos eixos tradicionais de análise e de hegemonia (editoras, livrarias, academia, distribuidoras, meios de comunicação). A síntese se dava pela migração, pelo repicar do litoral para o hinterland, do literal para o literário em escalas de ressonância e, quando possível, de diálogo e reciprocidade. Influências regionalistas sobre o ponto irradiador, agora da periferia para o centro.
Falta que alguém trace e mostre para valer este panorama. Algumas revistas mais inclusivas estão tentando, ao abrirem espaço para novas vozes em confronto com as consagradas. Algumas antologias deixam de ser gremialistas e a serviço de tendências muito doutrinárias (que era o padrão do século passado) para serem mais inclusivas e dialogais. Os festivais e encontros de poetas precisam também ser mais abrangentes, menos regionalistas e sectários. Louvando as exceções, é óbvio... Mas também é justo e saudável encontrar grupos entrincheirados em suas crenças estéticas.. Loggias literárias... Pertencimento a grupos e relações pessoais sempre entram em jogo, fazem parte da logística, mas há mais espaço além do quadrado em que se vive. E melhor quando há janelas.
A academia vem ampliando seus horizontes críticos. É óbvio que se concentra mais em revisitar os autores clássicos e permanentes, deitar olhares sobre detalhes, revisitando obras nas estantes. Nossa universidade está saindo do ideológico para o estético, do metodológico único para focos mais interdisciplinares e transversais. Saindo dos dogmas para novos territórios de observação. Talvez numa perspectiva mais brechtiana de colocar-se antes na posição do outro para o diálogo do que de enquadrar tudo na camisa de força estruturalista a priori. Naquela resposta do Picasso sobre seu modo de trabalhar: “eu não busco, eu encontro”. Bússola é importante, se ela não ficar magnetizada numa única direção...
(Gostaria de receber comentários, sobretudo críticas:
antmiranda@hotmail.com)
Julho 2011
PRIMEIROS COMENTÁRIOS RECEBIDOS
(julho 2011)
As novas formas e linguagens do poema, e ou poesia, notadamente no que podemos chamar de experimental, não têm nada de conclusivo. São/foram experiências surgidas pela vontade de se criar algo diferente. E isso se deu a partir do Concretismo que, sem dúvida alguma, mudou a forma da palavra no papel.
Os Campos, Décio e outros contribuíram para a mudança. Não nos esqueçamos de Wlademir Dias-Pino, figura de proa no Concretismo.
Estou falando de nomes, sem que isso contribua para a sua crítica.
Depois tivemos muita coisa que evoluiu em decorrência do Concretismo: o Neo-concretismo que se deu fora do circuito Rio-São Paulo e se manifestou no Ceará e Minas Gerais; a Poesia Práxis, com Mário Chamie (São Paulo), o Poema/Processo, com Wlademir Dias-Pino (Rio-Minas) e, por fim, o Poema Visual que não se concentrou em um núcleo, e sem um nome ou nomes específicos, mas foi pulverizado pelo país todo, além de estabelecer pontes com países desde o Uruguai até o Japão, passando pela Austrália e Nova Zelândia.
Hoje, no Brasil, o termo Poema Visual, e erroneamente dito Poesia Visual foi apropriado até pelas colunas sociais.
Acredito que chegamos ao fim de um ciclo. O Poema Visual completa 40 anos em 2012. Acredito que esgotamos essa forma experimental que contribuiu para mudar o conceito da leitura das imagens e, mesmo, do que hoje os estudiosos chamam de NOVAS LINGUAGENS.
Hugo Pontes
www.poemavisual.com.br
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Parabéns pelo belíssimo texto e análise sobre a direção da poesia brasileira, se é que ela tem alguma direção ou direcionamento. Penso que o Brasil é o país da POESIA, e não da prosa.
Ler poesia, por exemplo, não é exercício fácil para muitos leitores (e deveria, no meu pobre entendimento!). A adesão do público à poesia é necessariamente menor do que à prosa. A poesia pede mais empenho e atenção do sujeito leitor, pois além de trazer linguagem altamente plástica, requer análises internas e externas de seus versos, às vezes impregnados de metáforas e metonímias.
Manuel Bandeira definiu o poeta como um sujeito que sabe desentranhar a poesia que há escondida nas coisas, nas palavras, no gritos, nos sonhos. Para Bandeira, há poesia em tudo, pois "a poesia é o éter em que tudo mergulha e que tudo penetra".
Harold Bloom enfatiza o prazer da memorização de versos como grande contribuição à leitura da poesia, porque o poema gravado pela memória passa a possuir o leitor que lê minuciosamente, "conforme o exige e faz recompensar a grande poesia". Segundo Bloom, a "grande poesia perpetra em nós um grau de violência que a ficção em prosa raramente consegue (ou mesmo tenta) realizar.
O estudioso de poesia contemporânea pode experimentá-la (a poesia) como quem deseja romper os limites da significação e do sentido, como propõem os poetas mineiros do movimento aldravista. (infelizmente estamos no interior!). Ler a poesia desse movimento significa participar da criação de uma nova história, trajetória, filiações estéticas e filosóficas. Leitura de produtos literários novos, essencialmente prazerosos, mesclar-se-á a leituras de ofício de estudioso da literatura.
Em sua concepção dicionarizada, aldravismo (mais uma vez o ISMO) vem de aldrava, termo que designa o utensílio com o qual se bate nas portas para que estas sejam abertas. Trata-se de uma forma de criação e de divulgação de cultura (literatura e artes visuais) em que o foco principal é o SUJEITO. (Estética da recepção e Hermenêutica) O estilo trabalha com a conceituação de arte METONÍMICA, em que o sujeito (autor e leitor) é livre e heterogêneo para perceber porções daquilo que é possível, ou seja, o artista não compõe sua obra sozinho, determinando a sua interpretação, sabe que o leitor é livre para buscar sentidos....
Desculpe o tamanho do e-mail e da resposta. Mas seu ensaio é excelente. Sou de Mariana - MG (interior de Minas).
Faço mestrado em literatura e defenderei dissertação de mestrado desse movimento mineiro, silenciado pelas Academias, mídia, etc.
Andreia Aparecida Silva Donadon Leal - Deia Leal
Diretora de Projetos do Jornal Aldrava Cultural
Governadora do Instituto Brasileiro de Culturas Internacionais-Minas Gerais
Presidente Fundadora da ALB-Mariana
Mestranda em Literatura-Cultura e Sociedade pela Universidade Federal de Viçosa
---------------------------------------------------------------------------------- Salve, Antônio, gostei dos comentários com pinceladas de crítica e anlálise do seu texto. Mas realmente parece prematuro se concluir sobre o status quo da Poesia Brasileira, visto que são recentes todos os ismos e vãs-guardas que por aqui gr(p)assaram, mas ainda acho, aberto às discordâncias, que o grande sacolejo e arranco da nossa Poesia foi o Modernismo, com seus arremedos, Tropicalismo, Poesia marginal. A ressonância modernista sempre irá existir e em escala bem maior, isto porque reafirma que o homem é um ser da palavra, essencialmente da palavra, retoma à tradição, ao acervo de nossa história Ocidental da Literatura e Poesia. Houve uma tentativa recente, com o Concretismo, de não negar essa tradição, mas ser uma espécie de oráculo e trazendo presságios, tipo vez e outra ouvi dizer que o livro tem seus dias contados, pois o homem é um animal: verbivocovisual. Eureca! Eureka! Mas toda palavra encerra isto, é só pegar os exemplos dos ideólogos do Concretismo, todos obsecados pela palavra. Agora: que eles fizeram a festa, ah, isso fizeram, foi um pandemônio, um corre, corre. Imagine: poeta é quem não usa a palavra! Duvido se Dante já não sabia disto, duvido se Auden, Eliot, Pessoa, Neruda, Drummond, Bandeira, Murilo, etc, etc, etc.. Desconfio, então, Antônio, que muita água vai correr ainda por baixo da ponte, ou Poesia. JORGE ANDRADE 23/07/2011
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