EDITORIAL N. 30
Mapa assinalando os pontos (em azul) onde os internautas estavam conectados ao
Portal de Poesia Iberoamericano no dia 11/06/2009.
BLOGUEIROS E SONETISTAS ...
DA NÃO POESIA À POESIA DO NÃO
Por Antonio Miranda
Há dias estive com uma amiga que é leitora assídua de poesia. Não é poeta. Vive nos círculos de poetas, compra livros, freqüenta saraus, entende do assunto. Mas estava perplexa. Havia comprado uma antologia de poetas jovens e confessou que não gostou de nada, não entendeu nada.
Ela queria que eu explicasse este verso: “a agulha afiada espirra aquarelas”. Ou estes outros: “para esta gruta/ do beiral do poço (ou do prédio (das velas)/ um suicida (potes (de picles))/ e um palhaço (malabarismo (como malabarismo))/ halo de suas cabeças em seu chão consagrado”. Saí pela tangente, respondi com uma resposta: “Como reagiram aqueles que leram pela primeira vez aqueles versos de Drummond: “No meio do caminho tinha uma pedra / tinha uma pedra no meio do caminho” ??!!!
Lendo a biografia dos poetas, percebeu que todos tinham seus blogs, mas estavam numa antologia impressa, como para ter reconhecimento literário. Viu mais: que nem todos eram (tão) jovens assim... alguns tinham a idade dela! Muitos eram universitários; outros, graduados em Letras e, muitos, tinham mestrado e doutorado e estavam dando aulas em universidades.
Descobriu que nem todos estão no versilibrismo, ou na verbivocovisualidade pós-concretista. Alguns até metem umas rimas esparsas, enfiam uns tercetos e até praticam sonetos!!! Mas numa linguagem neobarroca, outros num automatismo verbal desconcertante, uns que parecem ser letristas de mpb ou derivados. Alguns são minimalistas na linguagem, usam dois pontos no início da linha (como já fazíamos nos anos 50 do século passado) e raramente usam maiúsculas ou ponto final, uns quantos nem usam títulos em seus poemas, como já acontecia também nos anos 50, na época do surgimento do rock´n´roll, da poesia de vanguarda. Agora é poesia de invenção, experimental. É isso mesmo.
Nada de ismos, de manifestos ou de ortodoxias. Muita crítica, desabafo e desaforos, mas nenhum protesto no sentido ideológico do termo... Buscam imagens criativas nos versos mas também ilustrações (fotos, desenhos, grafite, montagens), insólitas, muitas criadas por eles ou copiadas de fontes livres na internet... Publicam também em revistas eletrônicas, ou freqüentam os espaços dos blogues dos amigos, formando redes sociais de poetas solidários na web. Um comentando o trabalho do outro, numa cadeia de relacionamentos que continua no orkuts, no message, ning, twitter e tudo o que permitir a comunicação além do celular (por onde também mandam torpedos poéticos).
Pois é, o que havia antes do soneto? Antes da gráfica do senhor Gutenberg, antes do jazz e da bossa nova, antes do Caetano e do Petrarca? O que vem depois de tudo isso? A poesia acompanha as tecnologias, os valores, os formatos, as idiossincrasias e os meios de comunicação de cada época. Bons e maus poetas invadem a página em branco, os cadernos dos colegiais, os diários das meninas (agora na internet), os muros pichados, os recursos multimídia, completam a composição musical, vão para o palco e fazem parte de performances. Sempre foi assim, de alguma maneira. Antes do livro, e será assim depois do livro (ou no e-book).
Quem estuda e tenta classificar estas linguagens e formatos de poesia é o meu amigo poeta e lingüista Antonio Vicente Pietroforte. Já deve ter mais de uma dúzia de categorias, ou muito mais, mas o número deve ser limitado. Uns criando, outros imitando. Alguns vão sobreviver enquanto que outros vão sumir no anonimato, como aconteceu com muitos românticos, parnasianos, e modernistas.
Muitos destes blogueiros estão em nosso Portal de Poesia Iberoamericana. Ao lado dos clássicos, dos contemporâneos e dos poetas visuais. Somos mais de 2.000 poetas, mas de 14.000 poemas! Não compomos uma revista literária, nem uma academia de letras, mas um painel, um repositório de poesia. Como mais de 80% dos nossos leitores vêm direto pelo Google, sem saber que existimos como editores de poesia, sabemos que encontram o que procuram. Muitos se “customizam”, continuam freqüentando o Portal. E acompanhamos, através de ferramentas como o Amung.us e o Google Analytics, o comportamento dos leitores*: vê-se que há uma diversidade fantástica nas buscas. Mas tudo indica que a maioria dos leitores – são mais de um milhão de visitas por ano!!! – é composta por estudantes, a julgar pelo tipo de poetas que procuram, e certamente são jovens, são da classe média cultural e social. (Na época das férias escolares cai o número de usuários...) Estão entre os quase 30 milhões de brasileiros que lêem poesia, conforme revelou o último censo da leitura no Brasil. Na medida em que tenham mais e mais acesso ao computador, este número seguirá crescendo, e é previsível o que vão ler..
Apesar de perplexa, minha amiga ficou muito otimista com a poesia que se escreve e se lê nos dias de hoje, e está tentando adaptar-se aos novos tempos. De não-poesia e da poesia do não., que não deixa de ser afirmativa.
*Acompanhamos um caso singular: um(a) leitor(a) que vive em um navio ou submarino estacionado na costa africana. O Amung-us mostra a bandeira das Nações Unidas em vez de ostentar a bandeira do país de onde vem o internauta marinho; não revela o nome da cidade de onde está, aparece como “Unkown”... Quem duvidar, entre na nossa página www.antoniomiranda.com.br e procure um botão que aparece na coluna da esquerda, clique sobre o botão e, dentro do Amung.us, clique em “ Leitores” para listar as páginas que estão sendo acessadas no momento... E devem clicar, uma vez mais, em “Recent” para ativar as bandeiras dos países e ver há quanto tempo que permanecem lendo as páginas que estão visitando simultaneamente. Se não aparecer a bandeira das Nações Unidas (em azul), é porque o(a) internauta está momentaneamente fora do circuito... Então, faça mais uma prova: clique em “Mapas” para ativar os pontos luminosos estáticos ou que estão pulsando (estes indicando que os leitores estão ativos). Cada ponto no mapa assinala as visitas nas últimas 24 horas. É bem provável que esteja um ponto na costa africana; basta clicar nele para ver a bandeira das Nações Unidos e descobrir que existe um marinheiro que há meses nos freqüenta quase que diariamente, e não raras vezes mais de uma vez por dia, para ler poesia. E pasmem: lê em inglês, em espanhol e em português!!!
Jul. 2009
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