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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CADERNOS DE DA NIRHAM EROS



  Da Nirham Eros é uma criação de Roland Grau, o artista plástico chileno que vivia no Rio de Janeiro, no final da década de 50, e nos anos seguintes. Vivia em minha casa na Tijuca e na dele, como um efebo que acompanha seu mestre. Era uma figura extraordinária e a ele devo grande parte de minha iniciação. Trazia-me livros, com ele ia a galerias de arte, passávamos horas e horas conversando, até o alvorecer, no seu apartamento no morro do Cantagalo, em Copacabana, uma região quase desabitada, com vistas para os edifícios da orla e para a Lagoa Rodrigo de Freitas e o Corcovado.

Roland fez dezenas de retratos de Da Nirham Eros. Eram idealizados, mas alguns guardavam traços do personagem. Desenhos a guache, a nanquim, pinturas a óleo. Uma dos retratos sobre tela esteve vários anos na parede de minha casa da Tijuca, depois foi levado para a casa de minha irmã, em Nova Iguaçu, quando eu imigrei para a Venezuela. O retrato acabou numa prateleira e foi destruído pela umidade, mofo e cupim. Senti que uma parte de mim desaparecia para sempre. Restou uma foto em preto e branco da pintura...

Das leituras que fazia, criava cadernos, em que copiava, comentava e escrevia meus próprios textos. Muitos deles traduzidos por Roland ao castelhano, em forma de incentivo. Nas traduções ele fazia reparos, orientava meu trabalho, e eu, quase sempre, retocava os originais...

Guardo muitos desses cadernos. Num deles aparece a lista dos livros que eu lia, muitos deles tomados por empréstimo à Biblioteca Pública do Rio Comprido, onde a bibliotecária vivia assustada comigo, chegando a confessar à minha mãe que eu lia obras “impróprias” para a minha idade (entre os 17 e 18 anos!!!) como Nietzsche (“O Anticristo”) e Bertrand Russell (“Porque não sou cristão”)...   Lia filosofia, muitas peças de teatro, poesia...

Lia muito, mas não lia demais. E relia. Horas e horas no meu quartinho lá na ladeira que subia desde a Rua Barão de Itapagipe. Ou na varanda, com a paisagem do Pico da Tijuca. Os jovens iam jogar bola, eu ia para a livraria. Não era feliz, mas achava que sim, apesar do ar melancólico que eu disfarçava com o meu humor (que acabou vencendo-me, ao longo de minha vida). Era uma época de preconceitos e limitações. Um jovem pobre, mas que frequentava teatros, ia aos ensaios das peças de seu amigo Ziembinsky, comia em restaurantes convidado por artistas e escritores, graças ao genial polonês que mudou o teatro brasileiro.

         “Fui ao espelho e encontrei minha orelha pela primeira vez. Uma só. A outra era amorfa, inconsequente. Estava vermelha e a pressão alta; pensava coisas ininteligíveis. Já não era o amor próprio que saía pela orelha. Tinha vergonha de vê-la.

         Com um recalque vieram os outros e saiam pela orelha, em tom escarlate, cartilaginoso. Afloravam à pele, em seu rubor súbito. Tal era o meu espanto ao ver-me.

         Foi quando me interpelaram:
         — Você está triste?

         Eu nem sabia. Disse que não.

         Vinham ruídos esquizofrênicos, gritos e, abrindo a porta, descobri o corredor entupido de gente, jovem e estrepitosa. Na sua maioria, garotos de 15 a 18 anos, fazendo fluir toda a juventude em seu extrovertimento.”


E amava. Amores platônicos e reais. Que registrava para ruminar as frustrações e conquistas.

 

Antevisão da minha dor
em teu rosto em fuga.

Mis-en-scène:
                   O teu corpo, volátil,
                   em blue-jeans:
                   formas híbridas
                   de flagrante juventude.

                   Passeei teu corpo
                   no curto trajeto
                   em que aparecias.
                   Teu corpo esquivo,
                   teus olhos de fuga,
                   atitude cismada
                   como a defender-se.

                   Teu corpo apenas,
                   em súbita aparição.

O Personagem
                   Primeiro o corpo
                   que é como se o vê:
                   em blue-jeans,
                   camisa aberta,
                   a defender-se.

                   Camisa aberta:
                   existência dúbia.

Não buscar, mas encontrar,
porém estar para ser encontrado.

2. Tema:
                   Importa é que haja amor sobre a terra:
                   entre os homens,
                   dos homens pelas coisas,
                   o amor preserva
                   ou dá origem ao mundo.

 Maquillage:
                   Cabelos — linhas concêntricas
                  espiraladas,
                   em luzes marrom-pastel.

                   (Antevisão da minha dor
                   no teu rosto em fuga)

                   Riso flácido à intimidade,
                   sisudo
                   à primeira vista:
                   olhos de lince,
                   golpeantes
                   levantando um muro,
                   por timidez
                   — muro de vidro.


                   Modelas o mundo em tuas encenações:
                   forma de dominar o mundo,
                   levantando um muro.

                   Vivendo em outros corpos
                   pelos atos que lhes ditas,
                   ser-plural,
                   neles tua continuidade.

3 Amor equacional
´                 É o amor que volta,
                   asas em abraço
                   prodigamente.

 


Um poema apenas esboçado, incompleto. Numas folhas amareladas e encardidas pelo tempo, num caderno de colégio. Um simples registro, circunstância. Não vou pretender decifrar o seu sentido. Eu era outro, e usava um heterônimo. Eu me imaginava, mas vivia no mundo, como qualquer outro.

 

Antonio Miranda,
Brasília, 8 de março de 2011,
Carnaval.

 





                  






 

 

 

 
 
 
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