ALMAS RUDES
Bem sei das gentes sua estranheza,
Que bem me julgam, no mal julgar,
Não me conhecem por sua certeza,
Qual a minha em saber-lhes do duvidar.
Por entre as névoas do preconceito,
O omisso é pretenso e rude espírito,
Não lhe dêem senão vosso peito,
Não calem mais que certo o grito.
Mas quem sabe desta mi alma,
Que o coração lhe achega a preceito,
De tão simples, a julgar direito,
Inda se esvai, com tamanha calma,
Por entre a estreiteza do que passa,
No seu caminho de regresso a casa.
À BANALIZAÇÃO DA POESIA
Ando cá e lá…
Sou tanto de desdenho
Como sou de incongruência,
De minhas múltiplas vontades,
Dos meus desejos mais carnais,
E já me questiono
No supremo abandono,
A que votei estes meus passos,
Que se eu fora um pouco mais,
Do que o que aqui se mutila,
Certamente veriam da luz o sobrolho,
E do olho a vasta pupila,
Que não cabe na vulgaridade,
Ou na banalização do facilmente
Dedutível.
Mas, por outro lado, se sou quem
Se omite e representa,
Quem é o que se ostenta
E vem até mim, de palavra vã,
Como num fulgor dado à manhã,
Sabendo eu que lá fora,
Ainda vai a noite
Segura e irreversível?
Sim… há aqui muita banalidade,
Mais de acomodatício,
Veja-se o quanto de falsidade,
Em prol de um ambidestrismo!
Antes então o que não cala
E é frontalmente isento,
De qualquer dualidade
Ou segundos critérios,
Que o sorriso como unguento,
Servido em frascos de arsénio.
(13/01/2004)
CARROSSEL
Eu sou como a flor do jardim
Que todos querem cuidar
Aparentemente sou assim
Uma coisa de bem guardar.
Sou como ao cristal bonito
Que à vista é bem parecido
Só não se vê o que vai escrito
Por falta do que está partido.
Menino doce e apaixonado
Sempre inquieto no querer
É louco, ou desajeitado?
Que lhe importa disso saber!
Que lhe importa disso saber
É questão fundamental
Leva os dias no bem escrever
Que a escrever não vem mal.
E é assim como ao pião
Gira que gira a doidar
Que quem paga é o coração
Sem ter com que pagar.
(16/Julho/03/03)
DA FORÇA DOS TEUS BRAÇOS
Da força dos teus braços,
Do suor do teu rosto,
É que te nascem os traços,
Do fogo quando é posto.
Real fragrância a deduzir,
Do cenho que constrói,
A semente que há-de vir,
Da certeza, enquanto dói.
E fazes jus, à tua acção,
Que homem só tem valor,
Quando é sua a convicção,
Da verdade ao seu dispor.
Mas ai, ergue-te, ó homem,
Não te negues à evidência!
Se medos há e te consomem,
Ei-los que são por tua ciência.
(02/09/04)
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