HERBERTO HELDER
Nació en 1930, en Funchal, isla de Madeira, Portugal. Estudió Letras en la Universidad de Coimbra. Trabajó como periodista y publicista. Es en la actualidad una de las personalidades más notables de la poesía portuguesa. Su poesía discurre desde una óptica surrealista, pasando por la experimental hasta crear una exquisita poesía, metafórica y simbolista.
Herberto Hélder de Oliveira (Funchal, 23 de Novembro de 1930) é um escritor português de ascendência judaica (ver http://www.citi.pt/cultura/literatura/poesia/helder/biogra.html,
Universidade Nova de Lisboa).
Freqüentou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo trabalhado em Lisboa como jornalista, bibliotecário, tradutor e apresentador de programas de rádio. Viajou por diversos países da Europa realizando trabalhos corriqueiros, sem nenhuma relação com a literatura.
É considerado um dos mais originais poetas vivos de língua portuguesa. É uma figura misantropa, e em torno de si paira uma atmosfera algo misteriosa uma vez que recusa prémios e se nega a dar entrevistas. Em 1994 foi o vencedor do Prémio Pessoa que recusou. É pai de Daniel Oliveira.
A sua escrita começou por se situar no âmbito de um surrealismo tardio. Escreveu "Os Passos em Volta", um livro que através de vários contos, sugere as viagens deambulatórias de uma personagem por entre cidades e quotidianos, colocando ao mesmo tempo incertezas acerca da identidade própria de cada ser humano (ficção); "Photomaton e Vox", é uma colectânea de ensaios e textos e também de vários poemas. "Poesia Toda" é o título de uma antologia pessoal dos seus livros de poesia que tem sido depurada ao longo dos anos. Na edição de 2004 foram retiradas da recolha suas traduções.
A crítica literária aproxima sua linguagem poética do universo da Alquimia, da mística, da Mitologia edipiana e da Imago da Mãe.
Fonte da biografia: wikipedia.
Poemas selecionados de la edición de la ANTOLOGIA LA ACTUAL POESIA PORTUGUESA, con traducciones de nuestro amigo XOSÉ LOIS GARCÍA, publicada originalmente en la revista HORA DE POESIA, n. 27/28, de 1983, de Barcelona, España. Ejemplar gentilmente donado por Aricy Curvello para la Biblioteca Nacional de Brasilia.
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
CICLO
I
Escuto a fonte, meu misterioso desígnio
de cantar o amor.
Da tremenda alegria da carne
deve vir o espírito do canto, da vossa
deslumbrante alegria, ó intensas
criaturas solares.
Tudo o que é como sinal fecundo
da terra, tudo o que se toca
entre comoção e pensamento,
deve participar de vosso cântico, ó
corpos apoteóticos, corpos
reconstruídos sobre o frio ascético dos cadáveres.
Vosso é o vinho libertador, a erva
virgem, ó pequenas cabras rituais, a erva
junto à água, junto ao silêncio,
junto à aragem — vosso é pólen inconscurpado,
o fruto, o dia, a delirante
lua vermelha.
Vindes na simples harmonia da fome
e da mesa,
com gestos sexuais de uma graça infantil,
o puro impudor,
a generosidade ingénua
do pecado.
Eu canto vossas coxas verdes, o antigo
Turbilhonar do instinto
que transportais castamente como um depósito
no sacrário do sexo,
canto vosso ventre diurno,
a grande inocência de uma entrega
milagrosa.
Humildemente teço minhas palavras gratas
sobre a bela ferocidade
da carne, ergo minha taça,
ouço o oculto rumorejar da fonte.
Humildemente dissipo a solidão, aceite apelo de esperma,
mereço a poesia.
—Humildemente repudio a morte.
O POEMA
I
Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne.
Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio
—a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
e a miséria dos minutos,
e a força sustida das coisas,
e a redonda e livre harmonia do mundo.
—Em baixo, o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
—E o poema faz-se contra o temo e a carne.
ONDE NÃO PODE A MÃO
Como se uma estrela hidráulica arrebatada das poças
Tu sim deslumbras. Por coroação:
por regiões activas de levantamento:
por azougue da cabeça,
Brilhas pela testa acima,
Ceptro: potência — ah sempre que o chão crepita
dos charcos de ouro,
E no corpo trancado a velas
E nervos: o sangue que se afunda e faz tremer
Tudo, Tocas
com um arrepio de unha a unha
o mundo, Pontada
que te abre e aumenta
ou
—onde se um troço dessa massa
intestina: e como respirada: às queimaduras
primitiva — Boca:
sexo: viveza
das tripas: uma glândula que te move
ao centro, Amadureces como um ovo,
Na traça carnal: todo
como um golpe muita força por dentro
De
OU O POEMA CONTÍNUO
São Paulo: A Girafa Editora, 2006
535 p. ISBN 85-7719-012-9
(Edição brasileira da obra do poeta português-universal Herberto Helder, que merece a atenção de nosso público)
NARRAÇÁO DE UM HOMEM EM MAIO
Estou deitado no nome: maio, e sou uma pessoa
que saiu
violenta e violentamente para o campo.
Um homem deitado entre os malmequeres
rotativos do mês atraves-
sado pelo movimento.
É a noite aproximada com o livro
dentro. Deitado sobre bocados
de estrelas no pensamento.
Era a casa absorvida na manhã
embatente.
Livro da poesia arrebatada. Poesia
da mulher emparedada no amor
e o homem emparedado na destruição
do amor.
É agora o leitor com a atenção corrupta
sobre o livro.
O livro que arde nos ossos
do leitor afogado no poema arrebatado.
Estou estendido como autor na ligeira
palavra que a noite molha
e os ventos sopram como se sopra
urna brasa.
Um homem que saiu de casa, com toda
a magnífica violência do amor.
E o tempo revelador.
Agora inteligente deste lado,
contra o lado exemplar de maio aglomerado.
Espécie de primavera comburente.
A dor total. O livro.
O pensamento do amor. A
experiência.
E a vida ardente do autor.
Deitei-me também no campo
de outras coisas. Com discurso. Com
rigoroso segredo.
Vi o caçador levantar o arco-íris
e atirar, fechada, a morte
ao cabrito primaveril.
E tudo calei como experiência
de um sono inspirado.
Vi a ressurreição, maio
infestado. Ouvi
passar o ciclista da primavera
sobre o ruído da ressurreição.
Conheci a existência do roubador, o ciclista
que penetra no exemplo da fábula.
Estou deitado em meio campo
de urna espécie de despedida.
Meio campo de maio, e outro meio
de pessoalíssima vida.
São coisas que já não estão mais
do que na maturidade da idade.
Fiz comércio. Indústria. Dor.
A garganta lavrada pelo canto.
Ia a bicicleta com o seu poeta que punha a mão
no poema da bicicleta.
E iam todos — poema, bicicleta, poeta e mão —
por sobre o coração da terra e a ressurreição
da primavera. Ganhei
a minha idade concluída.
Cacei. Ou plantei. Ou cortei.
A vida vida.
Havia o movimento com a sua bicicleta
e a canção com o seu poeta.
A vida merecida.
Vejo ervas movimentadas e estrelas paradas.
E a consumação das coisas universais.
Geram-se de novo as coisas
universais. A pureza.
A natureza da pureza.
A própria natureza das coisas universais.
Da dor sei o amor.
O amor do ardor. Sei mais
do que posso saber da matéria do amor.
Fico deitado no campo revolucionário:
a paciente brutalidade da primavera
é como a brutalidade
delicada da paixão.
O violentamente demorado amor,
e a sua ressurreição.
Já estivera deitado ao lado das mulheres.
Elas paravam completamente
como caçadores ou bichos fascinados.
Não tinham pensamento nem idade.
Era a força do corpo. O movimento.
Estou neste lado desse lado
do corpo. Sei o poema
do conhecimento informulado.
Respira monotonamente urna estrela
entre os ossos.
Estrela levemente destruída.
Roída pelo louco rato lírico
da idade. Estou no pensamento.
Parado no movimento de uma vida.
Mexo a boca, mexo os dedos, mexo
a idéia da experiência.
Não mexo no arrependimento.
Pois o corpo é interno e eterno
do seu corpo.
Não tenho inocência, mas o dom
de toda urna inocência.
E lentidão ou harmonia.
Poesia sem perdão ou esquecimento.
Idade de poesia.
HELDER, Herberto. Poemas completos. Rio de Janeiro: Tinta da China Brasil, 2016. 736 p. capa dura. ISBN 978-85-65500-05-8 Ex. bibl. part. Antonio Miranda
AOS AMIGOS
Amo devagar os amigos que são tristes com cinco dedos de cada lado.
Os amigos que enlouquecem e estão sentados, fechando os olhos,
com os livros atrás a arder para toda a eternidade.
Não os chamo, e eles voltam-se profundamente
dentro do fogo.
— Temos um talento doloroso e obscuro.
Construímos um lugar de silêncio. De paixão.
TEXTO 1
Todo o discurso é apenas o símbolo de uma inflexão
da voza insinuação de um gesto uma temperatura
à sua extraordinária desordem preside um pensamento
melhor diria "um esforço" não coordenador (de modo algum)
mas de "moldagem" perguntavam "estão a criar moldes?"
não senhores para isso teria de preexistir um "modelo"
uma ideia organizada um cânone
queremos sugerir coisas como "imagem de respiração"
"imagem de digestão"
imagem de dilatação"
"imagem de movimentação"
"com as palavras?" perguntavam eles e devo dizer que era
uma pergunta perigosa um alarme colocando para sempre
algo como o confessado amor das palavras
no centro
não tentamos criar abóboras com a palavra "abóboras"
não é um sentido propiciatório da linguagem
introduzimos furtivamente planos que ocasionais”
ocupações ("des-sintonizar" aberto o caminho
para antigas explicações "discursos de discursos de discursos"
fixemos essa ideia de "planos"
podemos admiti-los como "uma espécie de casas"
ou "uma espécie de campos"
e então evidente para serem habitados percorridos gastos
será que se pretende ainda identificar "linguagem" e "vida"?
(walpurgisnacht)
Eu não durmo, respiro apenas como a raiz sombria
dos astros: raia a laceração sangrenta,
estancada entre o sexo
e a garganta. Eu nunca
durmo,
com a ferida do meu próprio sono.
Às vezes movo as mãos para suster a luz que salta
da boca. Ou a veia negra que irrompe dessa estrela
selvagem implantada
no meio da carne, como no fundo da noite
o buraco forte
do sangue. Aveia que me corta de ponta a ponta,
que arrasta todo o escuro do mundo
para a cabeça. Às vezes mexo os dedos como se as unhas
se alumiassem.
Mas nunca durmo entre os meus braços
pulsando
como grandes carótidas
que alimentem a beleza e rapidez do rosto sobre
músculos fechados.
Enquanto o sol rompe as membranas
dos espelhos: não danço, não
durmo, não respiro mais que a terra esquartejada pelas chamas lunares.
Não trabalho tanto como no verão o sangue
sob o pelo
baixo
dos animais, a elegância violenta,
o alimento.
Há dias em que as mãos se movimentam por si,
mal tocando nas fendas
o tremor hirsuto de um cometa cravado desde as costas
aos lençóis. Nunca sei
onde é a noite: uma sala como uma pálpebra negra
separa
a barragem da luz que suporta a terra.
— Agora, a fundura de uma
lavoura aérea, o fôlego, uma pedra com o meu tamanho
coberto
de poros, ou tendões a ligar
arquipélagos límpidos
na penumbra. Estes,
os obscuros fulcros da loucura.
Alguém devia tocar-me para sentir que estou vivo,
que sou
uma estaca atravessada pelo sangue, e dela rebentam
por exemplo: áscuas. Isto é uma fábrica de demência:
palavras
onde se manobra a púrpura, onde
o aroma que mata ascende de jardins construídos
levemente
na escuridão. E uma imagem fecha
tudo o que se fecha: quartos,
dias sobre si mesmos, as frutas redondas por força
da doçura interna. Quando as vozes
ferozes se desengolfam, a terra
move-as como um músculo encharcado entre a boca
e o coração que não dorme
nunca. — E todas as minhas vísceras são
inocentes.
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TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducción de Xosé Lois García
CICLO
I
Escucho la fuente, mi misterioso desígnio
de cantar el amor.
De la tremenda alegria de la carne
debe venir el espíritu del canto, de vuestra
deslumbrante alegría, oh intensas
criaturas solares.
Todo lo que es como señal fecunda
de la tierra, todo lo que se toca
entre conmoción y pensamiento
debe participar de vuestro cántico, oh
cuerpos apotósicos, cuerpos
reconstruidos sobre el frio ascético de los cadáveres.
Vuestro es el vino liberador, la hierba
virgen, oh pequeñas cabras rituales, la hierba
junto al agua, junto al silencio,
junto a la brisa — vuestro es el polen incorrupto,
el fruto, el día, la delirante
luna encarnada.
Venís en la simple armonía del hambre
y de la mesa,
con gestos sexuales de una gracia infantil
o puro impudor,
la generosidad ingenua
del pecado.
Canto vuestros muslos verdes, el antiguo
torbellinar del instinto
que transportais castamente como un depósito
en el sagrario del sexo,
canto vuestro vientre diurno,
la gran inocencia de una entrega
milagrosa.
Humildemente tejo mis palabras gratas
sobre la bella ferocidad
de la carne, levanto mi taza,
oigo el oculto rumorear de la fuente.
Humildemente disipo la soledad, acepto vuestra llamada de esperma,
merezco la poesía.
— Humildemente repudio la muerte.
EL POEMA
I
Un poema crece inseguro
en la confusión de la carne.
Sube aún sin palabras, sólo ferocidad y placer,
tal vez como sangre
o sombra de sangre por los canales de ser.
Fuera existe el mundo. Fuera, la espléndida violencia
o los granos de uva de donde nacen
las raíces minúsculas del sol.
Fuera, los cuerpos genuínos e inalterables
de nuestro amor,
los rios, la gran paz exterior de las cosas,
las hojas durmiendo el silencio
— la hora teatral de la posesión.
Y el poema crece tomando todo en su regazo.
Y ya ningún poder destruye el poema.
Insustentable, único,
Invade las órbitas, la superficie amorfa de las paredes,
y la miséria de los minutos,
y la fuerza equilibrada de las cosas,
y la redonda libre armonía del mundo.
—Abajo, el instrumento perplejo ignora
la dificultad del mistério.
—Y el poema se hace contra el tiempo y la carne.
DONDE NO PUEDE LA MANO
Como una estrella hidráulica arrebatada de los charcos,
Tu si deslumbras, Por coronación:
por regiones activas de levantamiento:
por azougue de la cabeza,
Brillas sobre la frente,
Cetro: potencia — ah siempre que el suelo crepita
de los charcos de oro,
Y en el cuerpo atrancado de venas
Y nervios: la sangre que se ahonda y hace temblar
Todo, Tocas
como un escalofrío de uña a uña
el mundo, Punzada
que te abre y aumenta
o
— donde si un trozo de esa masa
Intestina: y cómo respirada: a las quemaduras
primitvas — Boca:
sexo: viveza
de las tripas: una glândula que te mueve
al centro, Maduras como un huevo,
En la trama carnal: todo
Con un golpe con mucha fuerza hacia adentro
EROTISMO & SENSUALIDADE EM VERSOS – antologia de poesias eróticas da antiguidade até aos nossos dias. Seleção: Renata Cordeiro. Ilustrações: Auguste Rodin.
São Paulo: Landy Editora, 2005. 126 p. 15x24 cm. ISBN 85-7629-041-3 Ex. biblioteca de Antonio Miranda
A mentruação quando na cidade passava
o ar. As raparigas respirando,
comendo figo — e a menstruação na cidade
corria o tempo pelo ar.
Eram cravos na neve. As raparigas
riam, gritavam— e as figueiras soprando
de dentro
os figos, com seus pulmões de esponja
branca. E as raparigas
comiam cravos pelo ar.
E elas riam na neve e gritavam: era
o tempo da menstruação.
[...]
Alguém falava: sangue, tempo.
As figueiras sopravam no ar que
corria, as máquinas amavam. E um peixe
percorrendo, como uma antiga palavra
sensível, a página desse amor.
E alguém falava: é a neve.
As raparigas riam dentro da menstruação,
comendo neve.
HELDER, Herberto. O corpo o luxo a obra. Seleção e apresentação de Jorge Henrique Bastos. Posfácio Maria Lúcia Dal Farra. São Paulo: Iluminuras, 2009. 159 p. N. 10 883 Exemplar na biblioteca de Antonio Miranda
A MENSTRUAÇÃO QUANDO NA CIDADE PASSAVA
A menstruação quando na cidade passava
o ar As raparigas respirando,
comendo figos — e a menstruação quando na cidade
corria o tempo pelo ar.
Eram cravos no neve. As raparigas
riam, gritavam — e as figueiras soprando de dentro
os figos, com seus pulmões de esponja
branca. E as raparigas
comiam cravos pelo ar.
E elas riam na neve e gritavam: era
o tempo da menstruação.
As maçãs resvalavam na casa.
Alguém falava: neve. A noite vinha
partir a cabeça das estátuas, e as maçãs
resvalavam no telhado — alguém
falava: sangue.
Na casa, elas riam — e a menstruação
corria pelas cavernas brancas das esponjas,
e partiam-se as cabeças das estátuas.
Cravos — era alguém que falava assim.
E as raparigas respirando, comendo
figos na neve.
Alguém falava: maçãs. E era o tempo.
O sangue escorria dos pescoços de granito,
a criança abatia a boca negra
sobre a neve nos figos — e elas gritavam
na sombra da casa.
Alguém falava: sangue, tempo.
As figueiras sopravam no ar que
corria, as máquinas amavam. E um peixe
percorrendo, com um antiga palavras
sensível, a página desse amor.
E alguém falava: é a neve.
As raparigas riam dentro da menstruação,
comendo neve. As cabeças das
estátuas estavam cheias de cravos,
e as crianças abatiam a boca negra sobre
os gritos. A noite vinha pelo ar,
na sombra resvalavam as maçãs.
E era o tempo.
E elas riam no ar, comendo
a noite,
alimentando-se de figos e de neve.
E alguém falava: crianças.
E a menstruação escorria em silêncio...
na noite, na neve —
espremida das esponjas brancas, lá na noite
das raparigas
que riam na sombra da casa, resvalando,
comendo cravos. E alguém falava:
é um peixe percorrendo a página de um amor
antigo. E as raparigas
gritavam.
As vacas estão espreitando,
e nos focinhos consumia-se o lume em silêncio.
Pelas janelas os violinos
passavam pelo ar. E a menstruação nas raparigas
escorria pela sombra, e elas
Gritavam e comiam areia. Alguém falava:
fogo. E as vacas passavam pelos violinos.
E as janelas em silêncio escorriam
o seu fogo. E as admiráveis
raparigas cantavam a sua canção, como
uma palavra antiga escorrendo
numa página pela neve,
coroada de figos. E no fogo as crianças
eram tocadas pelo tempo da menstruação.
Alimentavam-se apenas de figos e de areia.
E pelo tempo fora,
riam — e a neve cobria a sua página de tempo,
e as vacas resvalavam na sombra.
Em silêncio o seu lume escorria das esponjas.
Partiam-se as cabeças dos violinos.
As raparigas, cantando as suas crianças,
comiam figos.
A noite comia areia.
E eram cravos nas cavernas brancas.
Menstruação — falava alguém. O ar passava —
e pela noite, em silêncio,
a menstruação escorria pela neve.
*
Página ampliada e republicada em fevereiro de 2024.
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Página publicada em janeiro de 2008 |