FERNANDO ESTEVES PINTO
Nasceu em Cascais em 1961. Colaborou no DN Jovem e no Jornal de Letras. Em 1990 recebeu o Prêmio Inasset Revelação de Poesia do Centro Nacional de Cultura. É publicado em Espanha por revistas literárias e editores independentes. Em 1998 obteve uma bolsa de criação literária pelo Ministério da Cultura /Instituto Português do Livro e das Bibliotecas .Está representado na Antologia DN Jovem, 1990.
Livros publicados: Na Escrita e no Rosto (poesia) Editora Europresas; Siete Planos Coreográficos (poesia, edição bilíngüe) Editora 1900, Huelva; Ensaio Entre Portas (poesia) Editora Almargem; Conversas Terminais (romance) Editora Campo das Letras; Sexo Entre Mentiras (romance) Editora Leiturascom.Net.
Blog do autor: www.escritaiberica.weblog.com.pt
Textos extraídos de POEMA – ANTOLOGÍA DE POESÍA PORTUGUESA ACTUAL (AULLIDO Revista de Poesia 15, Uberto Stabile Editoara, Punta Umbría, Huelva 2006)
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
olhar sem distância
acontece por vezes não encontrar um olhar
que sirva de depósito para os meus sentimentos
um rosto que aguardasse o tempo obscuro da minha vida
ou um campo corporal que resgatasse o que é verdade nos meus actos
escuto sempre o movimento de alguém a rastejar na minha direção
como se as palavras que indicam os seus passos enlouquecidos
não encontrassem o meu coração
porque há palavras que se perdem na forma de as pensar
e porque um olhar sem distância
é a cegueira natural da humanidade.
música profética
a escrita é um jogo de precipícios
é a minha infância num campo de solidão
é o medo de dar um belo passeio a favor do tempo
estas palavras abrem o pano de minha existência
expõe-me como se eu fosse um letreiro memorial
marsalis é um acumulador de emoções
escuto um som que vem como uma onda
a onda prolonga-se para além daquilo que sinto
estou em queda livre no horror das palavras sofríveis
a infância é uma música profética.
sentir o tempo
escrever é sentir o tempo
imperdoável sobre a vida de quem pensa
as imagens que entram em minha casa
são luzes ambiciosas que se esgotam na razão de as sentir
não desconheço que hajam forças que se temem
como simplesmente contemplar uma idéia destruída
um rascunho de medo transportado até ao limite
o tempo é um assunto de deus e do silêncio
assim como a escrita que provoca em cada acto
a construção do sofrimento.
teatro
havia o teatro das mãos postas em deus
não digo teatro para sufocar o teu acto de existires
antes glorifica a cenografia do sagrado
a tua presença a decorar o que é verdadeiro
um caminho amplo revela-se neste acto
de unir o medo e a convicção
no interior desse tempo criminoso
eu fazia o estudo dócil de uma escrita
inocente no teu perigo a abraçar uma escuridão.
POEMAS INÉDITOS
Um sistema de relação
Considere-se o caso em que A é igual a 1.
Obtém-se a função ípsilon igual a X à vida inteira
partindo da convicção que nenhum amor é para sempre
sendo A o mínimo absoluto do que és capaz de amar
e 1 uma falha de expressão comum ao tempo
em que sofrias fechada num quarto
a sentir uma régua de luz com origem sobre o teu rosto
a definir a região inundada do teu espaço
à medida que o tempo ocupa uma parte da cidade
e a tua situação representada numa estação de comboios
onde o esquema da vida se define por perpendiculares
aos dias cruzados na tua memória
sendo cada dia um gesto que te posiciona
em relação a todos os medos
mentiras de origem abjectas
e a proporção de ípsilon na mais estranha irracionalidade
no centro de um jardim onde se passeia geometricamente
apenas com o pensamento intimamente ligado
por símbolos de circunferência e dimensões harmoniosas
comparando o valor da vida à mais bela arquitectura
da experiência e da perda
um processo prático desenvolvido no laboratório
das horas mais simples e gráficas
ordenadas de uma forma circular
no teu caso um valor compreendido
entre duas questões humanas
por comparação do que foi destruído
pois há uma maior concentração de tristeza nos teus olhos
se designarmos por sofrimento algumas atitudes provocadas por 1
e se traçarmos duas rectas de amor paralelas à desigualdade de amar
e que passem pelos dias intuitivamente felizes
nesse quarto classificado de nuvens pesadas
onde a tua vida é agora inferior à média da felicidade
se concluirmos que o estado de ser feliz é um ponto diário
que varia de predominância e influência
nos tempos nulos condenados e negativos
na figura mínima encostada ao balcão do álcool
numa noite de cubos de gelo
e o que uma bebida especial
servida à mistura com a estratégia das palavras fez dos teus planos
calculando agora o valor referente aos lucros do amor e das promessas
introduz as marcas do teu corpo e obténs as medidas do teu prejuízo
define o tempo correspondente a cada acto de amor
seleccionando o menu da tua experiência
e tens uma lista que confirma o historial da tua personalidade
para que função o problema X tem significado
se o volume da tua casa tem todas as janelas fechadas
e o teu corpo é um fio de comprimento que mede a solidão dos dias
ou se os teus braços já não traçam uma recta de prazer abaixo da cintura
ou ainda se o teu sexo é um foco distante que se fecha em curva
e não há intersecção nem arco entre dois corpos
considerando as arestas da tua vida propriedade de defesa
uma estimativa do tempo ao fim do qual tudo se perde
e tens deste modo um amor protagonizado pelo desespero
sujeito às regras da obediência e da ilusão.
O tempo
O tempo é a esperança dos inactivos.
Uma cadeira de baloiço onde o pensamento adormece.
Atravessava os dias como se enchesse sacos de paciência
preciosidades existenciais para servir de cultura aos amigos.
Colecções de ódios sobre a mesa da discórdia.
As razões que reclamava para si
eram tão válidas como antiguidades falsas.
Tudo estava avariado na sua mente de relógio.
Os amigos escutavam-no pacientes à volta das palavras
que aprisionavam a temática da vida e do amor.
Não por medo mas por respeito pelo calendário das ideias apresentadas.
Muitas mentiras a brilhar nas folhas
que protegiam do calor o pátio em ruínas.
O riso do tempo ouvia-se no silêncio de quem o escutava
e a verdade voava dali para fora num alívio de liberdade.
Tão pura como as aves que pousavam desconfiadas
nos ramos da sabedoria humana.
E ele falava para que o tempo fugisse com ele para sempre.
Porque seria o tempo o transporte da sua imobilidade crónica
o grande mestre da loucura que ele representava
em sessões de rotinas para criar tonturas nos dias que passavam.
Como uma doença dizia ele como uma doença.
Chegavam os amigos e rodeavam-no com perguntas sobre o tempo.
Jovens mulheres com o ciclo do juízo atrasado
encantadas por verificar que o tempo é uma mente sem corpo.
E depois sentiam-se abstractas e dominadas pelo artifício da lição.
Os corpos expostos numa expectativa burlesca.
O tempo que ele sempre imaginara a ganhar forma humana
porque o tempo que marcava as fases da sua vida eram os outros.
Prisioneiros amarrados com palavras num sufoco de atenção.
Nem esperança nem tempo numa cadeira de morte
em face dos seus esquemas de empreendedor em acções imaginárias.
e o tempo a adormecer-lhe a vida se um dia a sua mente o abandonasse.
TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducción de Eva Lacasta Alegre
FERNANDO ESTEVES PINTO
Nació en Cascais en 1961. Colaboró en el DN Jovem y en Jornal de Letras. En 1990 recebió el Prémio Inasset Revelação de Poesia del Centro Nacional de Cultura. Ha publicado en España en revistas literarias y editores independientes. En 1998 obtuvo una beca de creación literaria del Ministério da Cultura /Instituto Português do Livro e das Bibliotecas. Está representado en la Antologia DN Jovem, 1990.
Libros publicados: Na Escrita e no Rosto (poesia) Editora Europresas; Siete Planos Coreográficos (poesia, edição bilíngüe) Editora 1900, Huelva; Ensaio Entre Portas (poesia) Editora Almargem; Conversas Terminais (romance) Editora Campo das Letras; Sexo Entre Mentiras (romance) Editora Leiturascom.Net.
Blog do autor: www.escritaiberica.weblog.com.pt
mirada sin distancia
ocurre que a veces el no encontrar una mirada
que sirva de depósito para mis sentimientos
un rostro que aguardase el tiempo oscuro de mi vida
o un campo corporal que rescatase lo verdadero de mis actos
escucho siempre el movimiento de alguien rastreando en mi dirección
como si las palabras que indican sus pasos enloquecidos
no encontrarn mi corazón
porque hay palabras que se pierden en la forma de pensarlas
y porque uma mirada sin distancia
es la ceguera natural de la humanidad.
música profética
la escritura es un juego de precipicios
es mi infancia en un campo de soledad
es el miedo de dar un bello paseo a favor del tiempo
estas palabras abren el paño de mi existencia
me expone como si yo fuera una inscripción memorial
marsalis es un acumulador de emociones
escucho un sonido que viene como una ola
la ola se prolonga además de aquello que siento
estoy en caída libre en el horror de las palabras sufribles
la infancia es una música profética.
sentir el tiempo
escribir es sentir el tiempo
imperdonable sobre la vida de quien piensa
las imágenes que entran en mi casa
son luces ambiciosas que se agotan en la razón de sentirlas
no desconozco que hayan fuerzas que se temen
como simplemente contemplar una idea destruida
un bosquejo de miedo transportado hasta el límite
el tiempo es un asunto de dios y del silencio
así como la escritura que provoca en cada acto
la construcción del sufrimiento.
teatro
había teatro de las manos puestas en dios
no digo teatro para sofocar tu acto de existir
antes glorificar la escenografía del sagrado
tu presencia decorando lo que es verdadero
un camino amplio se revela en ese acto
de unir el miedo y la convicción
en el interior de ese tiempo criminal
ya hacía el estudio dócil de una escritura
inocente de tu peligro abrazando una oscuridad.
Página publicada em janeiro de 2009.
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