Epitafios
1
De un puente
Fui el arco de triunfo
de un agua clara con sonido.
2
De una florecilla del campo
No fui sino una gota
de pintura amarilla entre la yerba
que no me dejó levantar cabeza.
3
De una rosa.
Peregrino,
detente ante la inmortalidad,
la rosa vive sin término
en las hojas del rosal
o en las hojas del poeta.
4
De la tarde
Acosté al sol dormilón,
levanté a la estrella con túnica
de jacintos y esmeraldas.
5
De un cirio
Me consumí
de tanto llorar
en este valle de lágrimas.
Epitáfios
1
De uma ponte
Fui o arco do triunfo
de uma água clara com o som.
2
De uma florzinha do campo
Não fui senão uma gota
de pintura amarela entre a erva
que não me deixou levantar a cabeça.
3
De uma rosa.
Peregrino,
detém-te ante a imortalidade,
a rosa vive sem final
nas folhas da roseira
ou nas folhas do poeta.
4
De tarde
Deitei o sol dorminhoco,
levantei a estrela com túnica
de jacintos e esmeraldas.
5
De um cirio
Me consumí
de tanto chorar
neste vale de lágrimas.
(Traduzido por Antonio Miranda)
CONSOLACIÓN POR EL BURRO MUERTO
No era la leña ni el carbón ni una carga de rosas;
era la muerte sobre su espalda sola.
Venía por el caminho bebiéndose l aluna,
por sus ojos pasaba uma alameda oscura
¡ era la carga última !
El burro se murió, me lo dijeron ellos:
los niños, los suspiros y los besos.
Trajeron el alcohol, corrieron por el médico:
el corazón soñaba, dijeron que había muerto.
Dormido en yerba seca, dejádmelo em la yerba
sin epitafio vano, ni enterro de primera.
Que los pájaros verdes que trepaban su cuello
lo miren tan dormido, que lo sigan durmiendo.
Que el sol seque su carne y que la azote el viento;
ramas tronchadas — los desabitados huesos —
de un árbol blanco y viejo.
Y que nadie pregunte si murió de vejez o de pena,
ni reciban coronas, ni repartan esquelas.s
Basta pra morir uma cruz y una estrella.
Por el burrito blando de las Nueve Posadas,
por el burrito negro del Domingo de Palmas,
que los arrieros vayan a ensillar una estrella.
¡Dejádmelo que muera!
¡Ay, cómo nos pesa el mistério a las espaldas!
¡Somos leña de muerte y com la vida a cargas!
Nos reclama la tierra.
¡Dejádmelo que muera!
Y atemos sólo um llanto pequeno a sua orejas:
del polvo muerto nacerá la primavera.
CONSOLAÇÃO AO BURRO MORTO
Não era a lenha nem o carvão nem uma carga de rosas;
era sobre o seu lombo livre a morte.
Vinha pelo caminho bebendo a gosto a Lua,
por seus olhos passava uma alameda escura:
era sua carga última!
O burrinho morreu — disseram-me eles:
as crianças, os suspiros, mais os beijos.s
Trouxeram álcool e correram pelo médico;
o coração sonhava, disseram que morrera.
Na erva seca adormido, deixai-mo sobre a erva
sem epitáfio vão, nem enterro de primeira.
Que os passarinhos verdes que sobre ele pousavam
o mirem tão dormido, que dormindo o acompanham.
Seque o sol sua carne, e que os ventos a açoitem;
ramos partidos — os desabitados ossos —
de árvore branca e anosa.
E que ninguém pergunte se morreu de velhice ou
de pena,
nem recebam coroas, nem avisos expeçam.
Basta, para morrer, uma cruz e uma estrela.
Pelo burrinho branco lá das Nove Pousadas,
pelo burrinho negro do Domingo de Palma,
que os arrieiros vão encilhar uma estrela.
Oh, deixai-mo morrer!
Ai, como nos pesa o mistério sobre os ombros!
Somos lenha de morte e com a vida aos montes!
Reclama-nos a terra.
Oh, deixai-mo morrer!
E atemos só um prantozinho às suas orelhas:
da poeira morta há de nascer a primavera.
(Traduzido por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira.)
Página publicada em maio de 2018