TARSO M. DE MELO
Tarso M. de Melo nació en Santo André, São Paulo, en 1976. Es el editor de la revista Monturo. Hizo pequeñas ediciones artesanales con sus poemas, Odisseu Sandeu (1996) y Mimos mínimos (1997). Publicó también el ensayo Poesia, pão e circo (1997). En 1999 apareció A Lapso. [Traducciones de R.J.]
Extraído da revista
TSÉ = TSÉ
7/8 otoño 2000
Buenos Aires, Argentina
NOVO
pulso, dias,
vida alguma
nada muda muito:
algum deus,
alguém (livre
de memória)
desistindo de voltar
toda manhã
NUEVO
pulso, días,
alguna vida
nada muda mucho:
algún dios,
alguien (libre
de memória
desistiendo de volver
toda mañana
ALEGRIA
alegria de quem
percebe
entre suas idéias
uma que
agrada e joga
luz sobre as demais
quanto exausto
de contornar
cores em brando
ALEGRÍA
alegria de quien
percibe
entre sus ideas
una que
agrada y juega
luz sobre las demás
cuando exhausto
de contornear
colores en Blanco
UM POEMA
por trás dos –
em preto e nítidos
- caracteres
à página presos,
verdade que, in-
útil, contra
o que esperam,
mácula no branco:
UN POEMA
por detrás de los –
en negro y nítidos
- caracteres
en la página presos.
verdad que, in-
útil contra
lo que esperan,
mácula en lo Blanco:
MEDO
medo das coisas
à sombra de car-
regados semblantes
cinzas
entre outras luzes:
contra-luas? pensar
em nada – in-
vestem
contra aquela noite
MIEDO
miedo de las cosas
a la sombra de car-
gados semblantes
cenizas
entre otras luces:
¿contra-lunas? pensar
en nada – em-
bisten
contra aquella noche
GUAPÉ
entre a rua e meus
óculos, janela
e alguma grades
- nuvens atrás –
a tarde fria
segura, secas
guias por onde
meninos passam
...
os dias gravados
no muro
com a cor indecisa
das tintas ausentes
GUAPÉ
entre la calle y mis
anteojos, ventana
u algunos escalones
- nubes atrás –
la tarde fria
segura, secas
guías por donde
chicos pasan
...
los dias grabados
en el muro
con el color indeciso
de las tintas ausentes
MELO, Tarso de. Planos de fuga e outros poemas. São Paulo: Cosaac Naifly; Rio de Janeiro: Viveiros de Castro Editora, 2005. 88 p. (Coleção Ás de Colete, v. 9)
11,5x18,5 cm. ISBN 85-7503-436-7 “ Tarso de Melo “ Ex. bibl. Antonio Miranda
2.
a cidade que usamos, nossas roupas, esses carros — dentro da máquina surda há a paisagem se desfazendo. Um visco correndo no lugar do rio. Contra o rio. O dia em solavanco repõe a espera. Compasso dos postes; o olhar é vago. Agora é a manhã que instala seus fios por entre os da cortina criando neste um pouco de seu mundo, outro. O rosto gasto: nos sulcos, nas superfícies — fuligem. A cada desvio. "Os deuses se cansaram, as águias se cansaram, a ferida, cansada, fechou-se." O castigo espera paciente, respira nos batentes, nas fechaduras, resiste.
Purgatório
céu, estrelas: o rio lança outra esfera
e fogo ainda pende das barbas do vate —
escorro por onde narro, varo portais
e entro, observo desde o terraço vasto
da linguagem a vida (o que desespera,
o que multiplica, a viagem que basta,
o futuro que foge com tudo que passa)
- a música que levo dessa margem a outra
é a música que invade o resto do riso,
é a música que amarra as festas da fala,
fende a razão, prende, entalha um astro
em cada asterisco, deus em cada traço
: sofrer o poema, pagar seus pecados;
vingar-se da língua é singrar suas águas
(daquela que falo, daquela que rapto), hábil
rio do que esqueço? translúcido escarneço
nódoas da memória, gritos migram até blocos
de notas e insanos velam ainda seu sentido)
CALIXTO, Fabiano; MANTOVANI, Kleber; MELO, Tarso de. Um mundo só para cada par. Santo André, SP: Alpharrabio Edições, 2001. 40 p. formato 11x20 cm. Col. A.M.
PAISAGEM
inibido olhar de fora,
falar incerto - mas
por dentro - mudar
(a forma muda de um
verbo) desde um rádio chiante
as palavras, já inúteis
orbe iníquo - contrito
revolver as sombras
sobre m i m (sobre a estrada
de M/nas?) inscrevo
paisagens inânimes
- uma fiação retesa: atrito de
fios contíguos no azul:
persegue o que não se diz
M., 1
lembrar amanhã: estalos
no vazio ao redor
de um dia chegando simples
: nada se transtorna
(o céu se resolve em céu,
os prédios revolvem)
a estrutura - tocada - resiste
no dia seguinte
de uma a outra inscrição no calendário
que se esvai idêntico
(ler talvez não seja,
formigas tentam ensinar)
tempo ignorado, nosso
vocabulário obscuro adere
ao que, dentro, sustenta
MELO, Tarso de. Deserto – 10 poemas. Santo André, SP: Alpharrabio Edições, 2991. Edição sobre papel sanfonado. 10,5x15 cm. Col. A.M.
19
SEUS CACOS ao alcance do olho
estilhaços: um cão late
ao longe, talvez ao acaso
o que sobra da vida
entre um e outro passo
poça, o que fica da chuva
como uma flor-precisa
em seus disparos; a dor
como presença
nos detalhes; o corpo de
uma cor, seus claros
espaço que se abre
temporário
no agosto desse concreto
armado
20
OUTRO PASSO, o corpo
do gesto extinto entre vigas
(vacinas contra a raiva)
enquanto as plantas crescem
no jardim
(escravo exercício
de distração
anotar as coisas que não
o jamais dos dias
o nunca a falta o oco)
não há crepúsculo
nem palavras - apenas o céu
ruindo
intervalos exatos
descuidos da noite
.
estrelas
: a página do caderno abandonado aberto é um
deserto
MELO, Tarso. Alguns rastros: uma antologia. Goiânia, GO: martelo casa editorial e comércio de livros ltda., 2018. 40 p. (coleção coisa fina, 1) 16 X 23 cm. Livro protegido com uma sobrecapa ilustrada. Ilustração da capa: Vinicius Yano. Coordenador editorial: Miguel Jubé. Tiragem: 450 exemplares. ISBN 978-85-68693-20-9 Ex. bibl. Antonio Miranda
FÚRIA
chega um dia em que o concreto cansa,
o aço depõe suas armas, dissipa os vidros,
desatam-se os nós impotentes da madeira,
cordas, cabos, correntes desistem da tarefa,
o plástico não se lembra de suas obrigações,
o mármore dobra sob nossos pés e levamos
a ponte pouco a pouco em nossos pulmões,
um dia, é a cidade inteira que se aconchega,
maligna, no vão livre de suas costelas
TARSO
(com as letras do meu nome
escrevo ratos, astro, rotas
altero um pouco, troco letras
e tudo pode ser prosa, rosas,
mas logo me reponho — farto! —
e fujo, tardo, sem deixar rastro)
TALENTOS EMERGENTES. 9 REUNIDOS. SETEMBRO/06. Santo André, SP: Alpharrabio Edições, 1996. s. p. 10,5x15 cm. Apresentação de Dalila Teles Veras. Inclui os poetas: Moacyr Costa Silva, Wilma Lima, Fernando Cereja, Rosana Destro, Margarete Schiavinatto, Tarso Menezes de Melo, Fabiano A. Calixto, Artur Cruz e Heitor C. Gonçalves. Tiragem: 100 exs.
Ex. bibl. Antonio Miranda
se todo santo é são,
por que não são sãs
as pessoas que aqui estão
santos, sp
ora ora, ora não ora
perde a vida,
a joga fora
e na sua crença
se escora
mês de abril
as iluminações de Rimbaud
aquecem meu frio
primeiro dedo do frio
no ombro do tempo
respiro
espero, só, o estio
e ao fim desta hora
a demora de um ônibus
unhas e ânimos devora
lá se vai o conto de fada
entre o sono leve
e a consciência pesada
tanto faz como tanto faz
o coração inventa
a razão desfaz
MELO, Tarso de. Deserto. 20 poemas. Santo André, São Paulo: Alpharrrabio Edições, agosto 2001. S.p. páginas dobradas. (Criando idéias design gráfico) 10,5 x 15 cm.
Ex. bibl. Antonio Miranda
"...o ouvido perde a música. A mão
já não retém o eterno — nem o efêmero.
.........................................................
................................. estranhos fios
o corpo levam pela estrada curta
e circular, deserta, seca e nua. "
Mário Faustino
[A seguir, 4 dos poemas do livreto:]
1
CURTA E CIRCULAR, DESERTA,
SECA E NUA, sustentar
a palavra enquanto — oclusos
sob a tinta preta dos cartões
escritos ao acaso, a ninguém
carimbos, grampos —
a voz — um sertão, um
instante entre as sílabas,
sons se desmontam; nu-
vem: presença de estrelas
2
CARTÕES ESCRITOS AO
ACASO, som longe do trem
trêmlula arquitetura em que
linhas, o vazio se esvai
— varal a ligar quem passa
rápido e a paisagem desidra-
tada ao seu redor (roedores:
escuro, escuro, faróis
levam a luz para o outro lado
como rastros de dia)
3
A PAISAGEM anula a fala
sela as esferas
abrupta engole o alcance
da tarde e seus olhos
o sol intercala-se à poeira
e aos arames
do que se acaba de ler
guarda a parede um retrato
de cesário verde, um pedaço
do que era espelhos, um rádio
mudo (incêndio, indícios
4.
DO QUE SE ACABA
quatro centenas, páginas
e sinais de interrogação
infinitos contornos
do que foi,
setas miram o olho
e seu oco (chuva,
desabar) talvez
ruínas inacabadas
5
CHUVA , DESABAR
TALVEZ, escrever as casas
Na paisagem — papiro — cor-
pos passam e são apenas pas-
sos (umas palavras de inglês)
refletidas: néon, ninguém)
pouco abaixo da noite, suas
calçadas, suas fendas, ruas
6
APENAS PASSOS inters-
tícios no azul (o horizonte,
um muro, música dos carros)
se chove, plástico entre o tempo
e silêncios, se chove,
janelas antecipam a solidão
.
dali a alguns metros, luzes
acesas, à espera, dormem
7
PLÁSTICO, sob os olhos
por fora, verde fugindo
da sombra deixada, à parede,
por um pôster, por dentro,
óleo sobre tela de van gogh
8
SOMBRA DEIXADA, reabro
no caderno
alguma palavra não gravada
a ser escrita — pesa
ainda sua atmosfera — luz
silente, dores construídas
(entre sombras) nítidas
9
GEOMETRIA entre abismos
detida, uma idéia vaga
rapta signos — convívio,
inflexões de tantos dias
nuvens, lidas, sobrevoam
uma vertigem: seu avesso
: mudez daquilo que digo,
vazio daquilo que é tudo
10
SEU AVESSO, manhã
domingo, ensaiar vivo
o que imagino e o nada
depois dos mortos
um corredor para fora — luz
quebrada por flores e seus ecos,
pesadelos, permanência no vazio
de grafites à som-
bra vermelha da noite
11
NADA DEPOIS da várzea
onde outras janelas se insinuam
desato pacotes que a rua despeja
porta adentro
(pregos entre buzinas, desmaio
do que cruza a avenida
e os ouvidos na memória)
um livro, algumas paredes
no descanso que um verbo,
cativo, incendeia
12
CRUZA A AVENIDA E
OS OUVIDOS NA MEMÓRIA, o traço
cansada figura
do que as palavras não
atingiram (no nome curto, um g
coreano remete a leitura,
insistente, aos rodapés) (o recife
dito com triplo "s") (sob a
palavra, liberdade —
rugas e olhos tensos) (o gigante,
paciente, a instruir seu próprio
inventário) (os olhos do gato, flash
e espelho, precipitando
poemas entre a barba e a câmera
fotográfica) (os último dentes, pontas
de faca, por trás do bigode
a ameaçar a língua) (o pedido
ao amigo
para queimar tudo) (a voz abatida
a suspender os versos ao fim do
verso)
13
PONTAS DE FACA abrem
de um canto a outro
a manhã —filhos,
sacolas
um casal na noite
expande o vulto duro
de uma árvore
volta-se um
contra o outro
até cegarem,
quem
lhes observa
14
EXPANDE ao sol o barro
água preta
dutos sangram a pista
entre dunas
: lixo, carros, mato
bóiam, nossos corpos
fuligem para os dias
o céu ainda mais cinza
onívora nuvem
onde a paisagem
miragem
vertical desaparece
CONTRASTE DA AMÉRICA: antologia de poesia brasileira. Organizador Djami Sezostre. São Paulo, SP: Editora Laranja Original, 2022. 189 p. ISBN 978-65-86042-40-5.
Ex. biibl. Antonio Miranda
AR LIVRE
o olho caça sem força
bromélias acácias ipês
florescem farmácias
ao longo do caminho
nas dobras do jardim
há sempre algum soldado
brotam gestos brutos
de todas as sementes
os caules já hasteiam
a flor do desespero
pássaro e aço rimam
na manhã entreaberta
as plantas consomem
o que não queremos ver
e descansam nos sulcos
de que a mão desistiu
: aparo a febre do dia
sem esperança de fruto
HOJE
Amanhã vai chover mais forte,
todos nós já sabemos.
E é estranha a calma dos rios.
Os guarda-chuvas seguem fechados,
os meteorologistas fingem não ter nada com isso,
o barro não demonstra qualquer apreensão,
o vento lambe as roupas secas no varal,
nenhuma janela ainda se fechou.
A água vai vir, forte, como sempre,
engolindo todo o sossego ao redor,
mas os buracos não confessam
as tristes peças de amanhã.
As casas, as coisas, as vidas,
o que sucumbirá ao mar inevitável
não dá sequer um suspiro,
não de despede de nós, de nada.
Plantamos no solo morto
esse esquecimento do futuro
— e tudo o que brota chamamos
hoje.
RAIZ E MINÉRIO
ainda é possível ouvir (mais fundo, mais fundo,
você encontra) o som da lama se arrastando por baixo
das portas e aos pé do sofá (o que há é o homem,
esse bicho) nos vãos da estante e no meio dos livros
nas gavetas da geladeira (que invade a terra procurando
outro homem, na altura do peito e entre os dentes
na clareira dos cabelos e na mão (o que há é o homem,
fera descontente (entre os dedos do pé e entre os dedos
da mão no jardim morto (cavando sua própria cova)
na linha da memória e na pia (mais fundo, mais fundo)
nos sulcos do azulejo (rasgando o manto da terra
para chegar a si mesmo) nas gretas em os interstícios
(o que há é esse bichos) nos orifícios e nas grutas
do corpo (incansável, surdo de si, sem projeto) no oco
do sonho no toco das unhas (comendo os próprios pés
e o chão sob eles) invadindo os relógios e os lençóis
nas palavras (cada vala, cada veia) e entre os versos
nos parágrafos e nas ideias abandonadas (ali está, espelho)
caindo do chuveiro dura (o homem diante do homem)
e inegociável comendo o pão e o chão (o lobo e suas garras
roendo) bebendo toda a água da casa (mais fundo, mais
fundo) engasgando vozes (ali está o homem) fundindo
meus gritos aos seus ruminando (cada vez mais homem,
cada vez mais bicho) como fede como fende come
o tempo come a fuga come (homem não tem limite)
e cospe e rói (bicho não pede licença) e cospe e
*
Página ampliada e republicada em julho de 2023
*
Página ampliada e republicada em janeiro de 2023
*
VEJA E LEIA outros poetas de SÃO PAULO em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/sao_paulo/sao_paulo.html
Página publicada em janeiro de 2023
Página publicada em março de 2010, ampliada e republicada em julho de 2013; página ampliada e republicada em junho de 2015. Ampliada e republicada em abril de 2019.
|