LARA DE LEMOS
Nasceu em Porto Alegre, em 1928. Jornalista, professora, advogada e tradutora. Colabora em jornais: “Correio do Povo” e “Última Hora”. Dedicada ao magistério e à administração pública, também exerceu diversas atividades no campo jornalístico e literário. É autora de muitas obras, sendo a mais abrangente sua Antologia Poética.
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
Extraídos de
ANTOLOGÍA DE LA POESÍA BRASILEÑA
Org. y Trad. Xosé Lois García
Edicións Laiovento
Santiago de Compostela, 2001
UM DIA, DE REPENTE
Um dia, de repente,
arrastam-nos à força
para um lugar incerto.
Um dia, de repente,
Desnudam-nos impudica/
mente.
Um dia, de repente,
somos apenas um ser vivo:
verme ou gente?
CELAS – 1
Viajo entre túneis de sono
como un cão vadio à procura
do dono.
Viajo em barcos fastasma
onde o tempo retrocede em busca
da alma.
Viajo consultando arquivos
e a memória ilumina rostos
redivivos.
Viajo procurando portos
e me encontro no país
dos mortos.
CELA – 6
A hora dos
capuzes negros
é a hora mais negra
dos prisioneiros.
Descer às cegas
pelas cascatas
apalpando paredes
adivinhando fissuras
Pisando superfícies
escorregadias
de sangue
e urina.
Às cegas.
CELDAS – 11
Habitamos onde
só existe arbítrio
Partir é permanência.
Voltar não é regresso.
Um mundo absurdo
nos cerca,
fragmentado e triste.
Jogo sem acerto.
Onde somos medo,
morte, sono
e nosso selo
- o degredo.
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De
Lara de Lemos
INVENTÁRIO DO MEDO
São Paulo: Massao Ohno, 1997.
"Uma voz como a de Lara de Lemos tem de ser ouvida. Falo por experiência, porque ouço esta voz há anos. E sempre a ouço com respeito e comoção. Encontrar a poesia de Lara de Lemos é encontrar a arte e a paixão, é encontrar a dignidade e a esperança. Nós precisamos da poesia de Lara de Lemos." MOACYR SCLIAR
"Em "Inventário do Medo", Lara de Lemos procede à exumação de sua traumática experiências durante as décadas de chumbo, tempo que podemos definir, juntamente com ela, de "malsinado", ou como descreveu em versos: "esse tempo de ameação,/ de fuzis e metralhas,/ de seres marcados para a morte."
A coletânea de poemas se estrutura tematicamente sobre a injustiça de que a autora foi vítima ao ser, de modo sumário, encarcerada e torturada." ASTRID CABRAL
DA RESISTÊNCIA
Cantarei versos de pedras.
Não quero palavras débeis
para falar do combate.
Só peço palavras duras,
uma linguagem que queime.
Pretendo a verdade pura:
a faca que dilacere,
o tiro que nos perfure,
o raio que nos arrase.
Prefiro o punhal ou foice
às palavras arredias.
Não darei a outra face.
CELAS - 16
Inútil bater
nas aldravas
das portas.
Inútil a espera
e a esperança.
Inúteis as palavras.
Inútil a trava
na garganta,
amarga a mágoa.
Agonia absurda:
a espada que nos fere
é cega e surda.
CELAS - 20
Fomos incursos
num código inconcebível
em improvável delitos.
Só nos resta
cumprir a sentença
imprescritível.
CELAS - 23
Eis que me retornam
vestes, sapatos,
óculos, relógios.
Bolsa povoada
de lenços, moedas,
inúteis estojos.
Despojada até aos ossos
não sei o que fazer
de meus despojos.
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ANTOLOGIA DA NOVÍSSIMA POESIA BRASILEIRA. Seleção e notas de Gramiro de Matos e Manuel de Seabra. Lisboa: Livros Horizonte, s.d. 194 p. (Coleção Horizonte Poesia, 14) 14x21 cm. Inclui os poetas: Adauto de Souza Santos, Francisco Alvim, James Anhanguera, Eudoro Augusto, Carlos Ávila, Ronaldo Azeredo, Alberto Luiz Baraúne, Antonio Carlos de Brito, Augusto de Campos, Haroldo de Campos, José Carlos Capinam, Ana Cristina César, Chacal, Mário Chamie, (Charles) Carlos Ronald de Carvalho, Moacy Cirne, Ronald Claver, José Falcon, Armando Freitas Filho, Leomar Froes, Mauro Gama, Pedro Garcia, José Ino Grunewald, Júlio Castañons Guimarães, Lara de Lemos, Florisvaldo Mattos, Gramiro de Matos, Leila Miccolis, Carlos Nejar, Afonso Henriques Neto, Torquato Neto, Libério Neves, Sebastião Nunes, Mário de Oliveira, Décio Pignatari, Roberto Piva, Fernando Py, Ricardo G. Ramos, Affonso Romano de Sant´Anna, Wally Sailormoon (Waly Salomão). Silviano Santiago, Olga Savary, Roberto Schwartz, Abel Silva, Adão Ventura, Bernardo de Vilhena, Ronaldo Werneck, Jairo José Xavier. Col. A.M.
Poema de Múltipla Escolha
EM QUE TEMPO VIVO
EM QUE HORA?
de aço ( )
de água ( )
de mágoa ( )
de arma ( )
EM QUE TEMPO VIVO
EM QUE HORA?
de faca ( )
de ferro ( )
de fúria ( )
de fuga ( )
EM QUE TEMPO VIVO
EM QUE HORA?
de canto ( )
castigo ( )
cegueira ( )
cadeia ( )
EM QUE TEMPO VIVO
EM QUE HORA?
de teia ( )
de muro ( )
de usura ( )
de guerra ( )
TEXTOS EN ESPAÑOL
Extraídos de
ANTOLOGÍA DE LA POESÍA BRASILEÑA
Org. y Trad. Xosé Lois García
Edicións Laiovento
Santiago de Compostela, 2001
DE PRONTO, UN DÍA
Un día, de pronto,
nos arrastran a la fuerza
hacia un lugar incierto.
Un día, de pronto,
nos desnudan impudica/
mente.
Un día, de pronto,
el duro frio
del oscuro catre.
Un día, de pronto,
somos apenas un ser vivo:
¿gusano o gente?
CELDAS – 1
Viajo entre túneles de sueño
como um perro vagabundo en busca
de su dueño.
Viajo en barcos fatasma
donde el tiempo retrocede en busca
del alma.
Viajo consultando archivos
y la memória ilumina rostros
resucitados.
Viajo buscando puertos
Y me encuentro en el país
de los muertos.
CELAS – 6
La hora de los
capuchones negros
es la hora más negra
de los prisioneros.
Descender a ciegas
por las escaleras
apalpando paredes
adivinando fisuras
pisando superfícies
resbaladizas
de sangre
y orina.
A ciegas.
CELDAS – 11
Habitamos donde
sólo existe arbitrio.
Partir es permanencia.
Volver no es regreso.
Un mundo absurdo
nos cerca,
fragmentado y triste.
Juego sin acierto.
Donde somos miedo,
muerte, sueño
y nuestro destino
el destierro.
Inventário do Medo, 1997
PARA QUE NO HAYA OLVIDO*
Tiempo sumidero.
El poema chispea
breve relámpago
en las tinieblas.
Árduo intento
de retener por milénios
el pájaro en su último
vuelo.
* escrito originalmente en castellano por la autora.
Pagina publicada em dezembro de 2007;ampliada e republicada em agosto de 2010. ampliada e republicada em outubro de 2013.
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