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JAYRO JOSÉ XAVIER 

Nasceu no Estado do Rio de Janeiro, em 1936. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,  é poeta e professor.

Obra poética: Idade do Urânio (Cátedra, 1974), Enquanto vivemos (Achiamé, 1981), Estória de uma vaquinha (Globo, 1987). Ganhou o prêmio Associação Paulista de Críticos de Arte em 1988, com o livro Ulysses: canto para ajudar um menino a atravessar a noite (Melhoramentos, 1988).
 

Veja também: JAYRO JOSÉ XAVIER – Poesia visual


TEXTOS EM PORTUGUÊS  TEXTOS EN ESPAÑOL

 

Jayro José Xavier
Enquanto vivemos
Rio de Janeiro: Achiamé,   1981.  
Ilus, de
Júlio Görke.

 

NOTAS PARA UMA POÉTICA

Um poema se escreve sob granizo, ou nas frentes de inverno,
                   quando nos protegemos sob casamantas de zinco
Um poema se escreve quando a noite caiu e nem um fósforo
Um poema se escreve quando é preciso renascer das cinzas
                   — quando todos, para ganhar a vida, se tornaram
                   zelosos funcionários da Morte
Um poema não se escreve com a razão
Um poema se escreve com as mãos
                   com quem reza
                   como quem toma nas mãos um punhado de terra

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TEXTOS RECENTES

 

TRÊS GRAFITOS

 

A Bolsa fechou em alta.

Nós nos fechamos em nós.

As fechaduras e os dias

onde encontrar a chave?

Assumimos um ar

barroco. Alheio e doce.

Suportamos a dor

o tédio, a hierarquia.

Na soleira da noite

caímos de joelhos

pedindo perdão.

Mas de quê? Mas a quem?

 

 

TRÊS QUARTETOS E UM CREPÚSCULO

 

Minha janela é um pedaço do mundo

-- um pedaço pequeno do mundo.

Minha vida sou eu debruçado na janela

gastando o peitoril, ferindo o peito.

A janela apodrece sob o sol

que se põe. Com ela apodreço e caio.

Nas janelas em frente apodrecem outros homens

como eu. Sem sonhos, nos prédios altos.

Pela boca da noite a lembrança de um bonde

me espanta os pardais. Como um velho fantasma.

E a noite cai com seu poder de síntese

sobre o que um dia foi mundo

e é, apenas, memória.

 

Seleção de Walmir Ayala

Poemas publicados originalmente na

REVISTA DE CULTURA BRASILEÑA

Junio 1975 N. 39

 

 

QUINTA EPÍSTOLA

 

O princípio de tudo está no fim, e o fim no princípio.

Quando o ciclo se fecha, o ciclo recomeça.

O último gelo se vai, bicado pelo canto dos pássaros: é primavera

verão

outono

e novamente inverno. Esta é a lei de tudo,

maior que tudo mais: a instável sempiterna permanência.

Os dias se sucedem aos dias, e os olhos temos abrasados de poentes

e nascentes, e a água do rio é sempre a mesma e sempre outra.

A cabeça da serpente há de morder externamente a extremidade da cauda.

“Tudo nasce e renasce uma segunda vez”, o nosso Lucrécio a Mêmio.

Eu, já cantei o Caos, e canto a Primavera por nascer.

(Esta é a quinta epístola e também a primeira.)

Em verdade o tempo se aproxima em que, reunidos à noite à beira do fogo

bendiremos os deuses

e o pão repartiremos sem ódio e por igual entre todos.

Há coisas amadurecendo em subterrâneas árvores,

ruídos de vida nova nos galhos, altas

frondes. Por toda parte os frutos se preparam, se arredondam...

Um rio hesita

E avança para Leste, onde os rubros acenos esvoaçam.

Mas ainda não é o princípio da estação amorável, oh Fabio

dos risos e ritos consagrados nos deuses da Festa.

Em agosto (as ninfas se foram)

é o final do ciclo: os deuses desenham circunspectos.

As coisas não são as coisas. As palavras se movem

como marés por entre coisas todavia impermeáveis

e ecoa em nossa boca, resseca

só o som. E mastigamos o gosto salgado de som.

Nenhum de nós ainda a doçura provou

do licor de Dyonisos, cingiu de louro a fronte, feriu

de sua mão a ruidosa alegria das cordas

                   cólicas da vida.

Os dias, águas arrastam pesadas de óleo e desespero...

(Agosto, embora os ventos, não é um mês propício à Fantasia.)

Reunidos na sala e no tempo, nada nos une

exceto a mesma dor de nada nos unir, e o sentimento que sobe,

longínquo e tão doce, da flauta de Pã.

“Mas para Naxos?”, dirás. Sim, talvez precisemos rumar

para Naxos

com Acetes para o estreito de Naxos, sem hera nos remos.

Nada sabemos do tempo da colheita fraterna das uvas.

(Todo o tempo de ter

É um tempo de indiferenças de chá com torradas à tarde.)

Com a cabeça coroada de pâmpanes, ao binascido adolescente Baco

Acenderemos aras. E a Baco e não a Marte entoaremos hinos.

(Quando o ciclo se fecha, o ciclo recomeça.)

Podemos quase ouvir o rumor abafado dos dias nas folhas

de inverno

e a luz indecisa entre a noite e a antemanhã do ser.

O sol voltará a reinar por sobre estrôncio, tédio,

Miasmas. E será a cidade tão pequena e tão clara

que as palavras restarão inúteis

ou as palavras tão exatas

como se cada coisa, súbito revelada, se dissesse.

E na cidade de Apolo,

Na branca luz da Cidade-de-Mil-Portas

o amor se fará lúcido. Oh Fabio

guarda de novo o ardor com que espalhaste pelo mundo tantas empresas heróicas

e retoma a delgada avena em que, egresso das florestas,

entoavas rudes canções. E nos demos as mãos por essa estrada

que sobe...

 

 

XAVIER, Jayro JoséIdade do urânio.  Apresentação de Antônio Houaiss.  Rio de Janeiro:Editora Cátedra, 1974. 70 p.  14x21 cm.   “ Jayro José Xavier “ ex. bibl. Antonio Miranda

“É tão vivo e fundo e contraditório e antagonístico espectro de indagações vitais, quero dizer, poéticas, do poeta, que dele o pouco que se poderá dizer é quer é de vocação pansófica ou pampoética. Mas com abarcar tanto em tão pouco?  ANTÔNIO HOUAISS

 

 

EU ME DEFENDO COM SINTAXE E ROSAS

 

Eu me defendo com sintaxe e rosas

de teorias e teocracias:

quais, por aéreas brisas, fugidias

e quais, por duros ventos, desditosas.

Com soprarem as duas, enganosas,

de trevas são as trilhas destes dias:

daí a minha espada-de-utopias

ferindo o mundo (e mote) em novas glosas.

Fará meu verso a fábula fecundo.

E, um dia, um trovador de Sagitário

o reino que habitemos mais jucundo...

Terçar armas com reis é temerário;

pior, porém, é repensar o mundo

sem alma de poeta visionário.

 

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TEXTOS EN ESPAÑOL

Seleçción de Walmir Ayala

Poemas publicados originalmente en la

REVISTA DE CULTURA BRASILEÑA

Junio 1975 N. 39

 

QUINTA EPISTOLA

El principio del todo está en el fin,y el fin en el principio

Cuando el círculo se cierra, el círculo se reanuda. 

La última nieve se va, picada por el canto de los pájaros: es primavera

verano,

otoño,

invierno nuevamente. Esta es la ley de todo.

Mayor que todo: la inestable y eterna permanencia.

Los días suceden y tenemos los ojos abrasados de ponientes

y amaneceres, y el água del rio es siempre la misma y siempre otra.

La cabeza de la serpiente há de morder eternamente el extremo de su cola.

“Todo nace y renace uma segunda vez”, dice nuestro Lucrecio a Memio.

Yo ya cante el Caos y canto la Primavera por nacer.

(Esta es la quinta epístola y también la primera.)

En verdad se aproxima el tiempo en que reunidos reunidos en la noche junto al fuego bendeciremos los dioses

y repartiremos el pan sin ódio y por igual entre todos.

Hay cosas madurando en florestas subterrâneas,

rumores de vida nueva en los brotes, altas

frondas. Por todas partes los frutos se perciben, maduran...

Un rio duda y avanza para el Este, donde signos de púrpura tremolan.

Pero aún no es es el tiempo de la estación amorosa іoh Fabio!,

de las rosas y los gritos consagrados a los dioses de las fiestas.

En agosto (las ninfas se fueron)

es el final del siglo; los dioses se dibujan circunspectos.

Las cosas ya no son las cosas. Las palabras se mueven

como marea entre cosas todavia impermeables

y en nuestra boca reseca aflora

sólo el sonido. Y masticamos el gusto salado del sonido.

Ninguno de nosotros probó aún la dulzura

del licor de Dionisos, coronó de laurel la frente y pulso

con su mano la ruidosa alegria de las cuerdas

cálidas de la vida.

Los días arrastran aguas pesadas de aceites y desesperación...

(Agosto, a pesar de los vientos, no es un mes propicio a la Fantasía.)

Reunidos en la sala y en el tiempo, nada nos une

sino un mismo dolor de que nada nos una, y el sentimiento que sube

tan dulce y prolongado de la flauta de Pan.

“Para Naxos”, dirás. Sí, tal vez necesitemos dirigir

hacia Naxos;

sin rémora en los ramos nada sabemos del tiempo en que los hombres

conviven en ócios claros.

(Todo tiempo de tener es tiempo de tinieblas.)
Nada sabemos de la estación de la cosecha fraterna de las uvas.

(Todo tiempo de tener

es un tiempo de indidferencias, de té con tostadas a la tarde.)

Con la cabeza coronada de pámpanos, al bien nacido adolescente Baco encenderemos altares. Y a Baco y no a Marte dedicaremos nuestros himnos.

(Cuando el ciel se cierra, el ciclo se reanuda.)

Podemos oír casi el ahogado remo de los días en las hojas

del invierno y la luz indecisa  entre la noche y la antemañana del ser.

El sol volverá a reinar sobre el estrôncio com el tédio

y los miasmas. Y será la ciudad tan pequeña y tan clara

que las palabras serán inútiles

o tan exactas

Y en la ciudad de Apo0lo,

en la blanca luz de la Ciudad de Mil Puertas,

el amor será lúcido. іOh Fabio!

guarda de nuevo el ardor con que extendiste por el mundo tantas heróicas empresas y retoma la delgada avena en que, exiliado de las florestas,

entonaba sus rudas canciones. Y démonos las manos por ese camino

que sube...

 

 

 

XAVIER, Jayro José.  Idade do urânio.  Apresentação de Antônio Houaiss.  Rio de Janeiro: Editora Cátedra, 1974. 70 p.  Col. A.M.

 

NÃO SENDO JÁ DE AMOR AS DURAS LISES

 

Não sendo já de Amor as duras lises

as facas destes nossos ferimentos,

que feridas são estas, de raízes

tecidas de infinitos filamentos?

Que temporal poder, em novas crises,

movendo lâminas aos quatro ventos,

à flor dos nossos corpos infelizes

afia seus finíssimos inventos?

E como nos livrarmos deste enredo,

se um Nume nos devora, e fabricamos

seu aço em nós e nosso braço quedo?

Se para bem ferir quem mal criamos

só de pássaros, ventos e arvoredo

se fez o frágil ser que carregamos?

 

 

NÃO SEI SE ESTA MEDIDA ME DEVORA

 

Não sei se esta medida me devora

ou me desvenda o mundo, resolvida,

que o mundo é outro por medir agora

e morro sem me ver essa medida.

Mas com ser outro é o mesmo, e se aprimora

a mão nesse medir forma com vida:

avessa de Platão á passiflora       

sôbolos rios de Camões pendida.

Porém para medir o mundo, e parte,

quem dirá nova a clássica medida,

ainda que agora unidos Metro e Marte?

Aqui se perde a síntese arguida

e volto com saber, engenho e arte

à dúvida do ponto de partida:

 

 

 

Página publicada em dezembro de 2007. ampliada e republicada em fev. 2013. Ampliada e republicada em fevereiro de 2015

 




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