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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

FERNANDO FÁBIO FIORESE FURTADO

 

 

Nasceu em Pirapitinga (Minas Gerais) em 1963. Formado em comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Na Universidade Federal do Rio desenvolveu sua tese de doutorado sobre “A comunicação poética entre o símbolo e o simulacro”. Faz parte do conselho editorial de várias revistas.

 

 

 


De
UM DIA, O TREM
São Paulo: Nankin; Juiz de Fora: Funalfa, 2008

Da primeira vez que no filho morre,
ao pai a morte semelha um estrepe
— não por doer, mas porque nela revolve
quanto há de menino num corpo em febre.
E dele  é menor o pasmo também
quando das demais morre por igual,
pois nessas ele apenas entretém
aquela outra, maiúscula e cabal.

 

BRINQUEDO DE OUTRO

Trem não é dos brinquedos que se desmonta
para, com seus bocados e algum miolo,
engendrar um esconso outro, nem conta
entre aqueles de guardar em estojo
ou de olhar na vitrine (tal a monta)
embora exija brincar respeitoso,
até mesmo cuidado, igual pompa,
com que brincamos o brinquedo de outro.

Mas brincá-lo longe não o torna logro,
pois esta a condição que mais convém
quando se quer do brinquedo o caroço
dos tantos que, por dentro, ele tem.
E não copiam dele apenas brinquedos:
quando descarrila, ao poeta também
empresta este modo, quase arremedo,
como no texto se dá a forma-trem.


O MENINO EM PROSA


Porque menos importa a viagem quando
da locomotiva o menino aprende
o duelo do metro com o acidente,
do comboio imita a soma e o arranjo
de com outros meninos tomar corpo
(maior, embora menos desenvolto),
e assim fazer-se vermelho reclamo
nas páginas de uma ficção de bolso.

Quando de viagem, como quem o poema
enfarda nas horizontais da prosa,
sem qualquer quebra, apara ou empena,
à linha o menino se acomoda.
Dir-se-ia que muda de manuscrito
para um capa-dura, muito embora
seja uma forma de adiar o menino
esse traduzi-lo em outra bitola.
 

 

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MANHÃ

 

na claridade do pátio

nada se move.

 

apenas o mármore das colunas

duela com o vento.

 

todo o solo prenuncia a queda

a palavra que fenda a manhã.

 

emigrado da sombra

me entrego ao desgaste do vento.

 

ah o azul

o azul me desampara.

 

 

DANAÇÃO

 

         Bom mesmo

Era morar num lugar de nome bonito

— Nossa Senhora dos Remédios,

São Tomé das Letras,

Dores do Turvo —

cultivar violetas e samambaias

e fazer do itinerário dos peixes

minha mística.

                            E não

ficar polindo os ossos do mito.

 

 

MULHER DORMINDO

 

apenas a alma dorme

o corpo insone

                   trabalha

os minérios do sono

                   sustenta o pânico

o naufrágio

na penumbra

                   fogo e relva

os músculos dançam

debruçados sobre o nada

 

os olhos não

os olhos sonham

         a sombra da alma

— e sobrevivem

                   ao dilúvio.

 

 

Y QUISERA DESCARNAR AS MÁSCARAS

(A SIBILA)

 

E quisera descarnar as máscaras

do mistério que, mesmo sob esporas,

resiste, e me desafia a existir

quando o desamparo me desposa.

 

Mas tudo que desvelo são desertos.

Não há fuga, habito as distâncias.

O silêncio urge e me desperta

para o inventário de suas lanças.

 

Eis o cacto, a serpente e a pedra.

Toda brutalidade se avizinha,

em meus lábios nenhum deus vocifera.

 

Aqui, tudo que digo é diferente,

a palavra circula sob o turvo

e, como antes da queda, esplende. 

 

                   Ossário do Mito (1990)

 

 

BAÚ DE OSSOS

 

zelo de guardar miudezas

reter o tempo

em dentes-de-leite

mechas de cabelo

retratos sem data

como a dizer:

memória

eis a história

do zero

 

 

ARTE POÉTICA

 

porque de todos os livros sei
apenas o silêncio
porque o número não calcula
a idade que tínhamos
quando o medo chegou
porque o espelho oferece seus avessos
porque imolamos a infância na palavra
a palavra que nada gera
nem se destrói
 
 

===============================

AVÓ DEPOIS DE MORTA

A avó ainda rega o canteiro
onde mirraram os brinquedos.

Mesmo morta ainda
ralha com a tempestade
que escondeu os meninos
em outra idade.


VICENTIM, REPARADOR DE LIVROS

Fui muitos antes.

Desta pequena queda,
um corpo oblíquo espera
mapa ou sentença.

Da história me desfaço,
rascunhando uma rosa
nos obituários.

Erratas também recolho
com mãos que desconheço:
a linhagem do homem
ninguém sabe.

A limpo e a luto passo
livros, desertos, cidades
— os hóspedes
em frases demudados.

E posso mudar em verbo
até a última paisagem.

 

CAPRFICHOS BIBLIOGRÁFICOS

Livro só existe no plural.
De modo que não há como abrir
um único, sem com isso outro,
e assim acionar a espiral
que, par em par, outros abrirá;
o mesmo que mão a dentro do bolso
surpreendesse outro e, nesse um, outro
bolsos em seqüências infinitas,
à semelhança de uma dízima;
e em cada qual houvesse chaves
de cofres há muito saqueados,
de gavetas que nenhuma abre,
da cidade depois dos bárbaros,
porque chegamos sempre tarde.

Como dissera versos antes,
para o livro chegamos tarde,
cedo demais para o não-livro;
na estante um espelho inimigo,
esse olhar só possível quando
o silêncio entre amantes queda,
e o mínimo rumor é tanto
que, no corpo, o corpo analfabeta.
Livro é como, em outros, a morte
se abre para ensaio ou trégua;
livro é mapa, mesmo conforme,
onde o território desconcerta;
é quando não há enigma algum
—nem termo, início ou promessa.


Extraídos da antologia OIRO DE MINAS a nova poesia das GERAIS. Seleção de Prisca Agustoni.  S. l.: Pasárgada; Ardósia, 2007.   

Corpo Portátil

De
Fernando Fábio Fiorese Furtado
 
Corpo Portátil
 São Paulo:  Escrituras, 2002.  185 p.

 

Corpo portátil, livro de livros do poeta mineiro Fernando Fábio Fiorese Furtado, demarca quanto  a arte da poesia contemporânea é fundação das coisas, pesquisa do solo, afundamento das raízes, mistério da memória e recriação do destino. Assim, granítica, lavrada na Zona da Mata do coração, esta poesia se destaca, com sotaque peculiar, numa geração de grandes poetas de Minas e do Brasil, como Iacyr Anderson Freitas, Edimilson de Almeida Pereira e Júlio Polidoro. E já pode ser vista com abrangência e horizonte partilhado, em luz forte e, às vezes, inoportuna, criando seus portáteis esconderijos de memória. Portáteis, porque o poeta reconhece a efemeridade, contra o que se acha sozinho e desarmado. E simultaneamente, duráveis na linguagem, com a volta à Ítaca (novo Ulisses), “como o menino há de surpreender o pai no espelho.”

                  CARLOS NEJAR, poeta, da Academia Brasileira de Letras

 

Um hóspede que demora
(por um pernoite que seja)
depois de fazer praça,
de todo não vai embora.

Deixa a fome na cozinha,
fome larga das estradas,
como se ali ficasse a alma
à espera, enquanto caminha.

Retratos sem data 

Em homenagem a La chambre claire,

de Roland Barthes

 

 I/Rosto de menino

 Podia retocá-lo
com o verde desta tarde,
com o verbo deste lápis,
com o vento na janela. 

Eis o termo da linhagem:
monstro ou borboleta
arrastando nosso cadáver. 

Há um ricto
escondido nessa catástrofe. 

O rosto acolhe uma filiação incerta.
 

Serpente tudonada  

Aos hóspedes não convém
senão desfazer as malas
e vigiar as nódoas na parede.

Esgotou-se o tempo
de arranjar a sintaxe
dos talheres,
de repetir o ricto
após o último verso,
de empilhar os jornais
sobre a escrivaninha,
de recolher no pires
o farelo de pão,
de calçar as meias do avesso,
de ajeitar a gravata
dos amigos, de adiar o jardim
para depois dos quarenta.
Aos hóspedes convém esquecer,
conquanto em mim distraídos.
O corpo e as cidades 

 

Das cidades

em geral

De quantas cidades estive
(e não digo as que, de passagem,
guardei apenas uma rubrica
e o rumor do jornal dormido,
nem aquelas em livro escritas
ou contrabando dos amigos,
em cartões-postais e souvenirs)
poucas vestiram este corpo,
camisa feita de encomenda,
sem rugas, pences, rebordos. 

 

De Diamantina

De quantas cidades estive,
Diamantina tem o tamanho
do corpo com que se ama e vive,
com folgas e bolsos largos
para acolher-nos no regaço.
Tem os olhos da altura do homem,
e ruas que arregaçam as mangas,
e pátios de pássaro destros,
e capelas que erguem as saias
para deixar fugir o céu.
 

Conversa na alfaiataria 

 

Aos meus tios, alfaiates

Aviamento

- Em tal ofício, menos não se admite,
ainda que a obra seja para o cabide,
não descura a severa matemática. 

Nem cós nem colarinho aqui se avia
como se fora rol de mercearia,
pois, à roda do metro (diz a prática), 

um corpo recusa, menino e agreste,
a cifra com que confirme e ateste
a medida do homem e a sua hora. 

- Pouca ou nenhuma serventia terá
o método que queira abolir o azar.
Trata-se de pôr o número à prova, 

de repetirum gesto até a diferença,
da lei que todo labirinto ostenta,
até que o olho em horizontes desdobre-o. 

Corpo é como ter o mar na gaveta,
um cômodo a cumular nossas perdas,
uma pausa conspirando o relógio. 

 

Das palavras

e dos gestos

Palavras apenas as que contam.
Para histórias do começo,
quando homem falava.

Mesmo um gesto demora,
até que o músculo
substantiva. 

  

De Deus

Quem diria que há? 

Por mim ficava longe
que eu não tenho estatura. 

O medo de quem vê
pela primeira vez
uma palavra doendo.

 

 

FURTADO, Fernando Fábio Fiorese.  Ossário do mito.  Juiz de Fora, MG: Edições D´Lira, 1990.  57 p   ilus.  11,5x20 cm.  Capa: Baldung Grien (1514)  Ilustrações no  miolo do livro: Albrecht Durer.  Tiragem: 500 exs. Col. Bibl. Antonio Miranda

 

EX-VOTO

 

a casa sitiada pela chuva

 

caes devoram pedras nuvens plantas

o oratório consumido por relâmpagos

deuses enterram-se no quintal

 

nenhuma devoção.

 

E QUISERA DESCARNAR AS MÁSCARAS

(A Sibila)

 

E quisera descarnar as máscaras

do mistério que, mesmo sob esporas,

resiste, e me desafia a existir

quando o desamparo me desposa.

 

Mas tudo que desvelo são desertos.

Não há fuga, habito as distâncias.

O silêncio urge e me desperta

para o inventário de suas lanças.

 

E i s o cacto, a serpente e a pedra.

Toda brutalidade se avizinha,

em meus lábios nenhum deus vocifera.

 

Aqui, tudo que digo é diferente,

a palavra circula sob o turvo 

e, como antes da queda, esplende.

 

 

 

TEXTOS EN ESPAÑOL

Extraídos de la
ANTOLOGÍA DE LA POESÍA BRASILEÑA
Org. Trad. de Xosé Lois García
Santiago de Compostela: Edicións Laiovento, 2001.

 

MAÑANA

en la claridad del patio

nada se mueve.

 

apenas el mármol de las columnas

lucha con el viento.

 

todo el suelo anuncia la caída

la palabra hiende la mañana.

 

de la sombra emigrado

me entrego al desaste del viento.

 

ah, el azul

el azul me desampara.

 

 

MALDICIÓN

 

         Bueno mismo

era vivir en un lugar

—Nossa Senhora dos Remedios,

São Tomé das Letras,

Dores do Turvo —

cultivar violetas y helechos

y hacer del itinerário de los peces

mi mística.

                            Y no

quedar puliendo los huesos del mito.

 

 

MUJER DURMIENDO

 

apenas el alma duerme

el cuerpo insomne

                   trabaja

los minerales del sueño

                   sustenta el pânico

el naufragio

en la penumbra

                   fuego y hierba

los músculos bailan

apoyados en la nada

 

los ojos no

los ojos sueñan

         a la sombra del alma

 y sobreviven

                   al diluvio.

 

 

Y QUISIERA DEHUESAR LAS MÁSCARAS

(LA SIBILA)

 

Y quisiera deshuesar las máscaras

del misterio que, bajo las esporas,

resiste, y me desafía a existir

cuando el desamparo me desposa.

 

Pero todo lo que desvelo son desiertos.

No hay fuga, habito las distancias.

El silencio urge y me despierta

para el inventario de sus lanzas.

 

He ahí el cactus, la serpiente y la piedra.

Toda brutalidad se aproxima,

en mis labios ningún dios vocifera.

 

Aquí, todo lo que digo es diferente,

la palabra circula bajo la confusión

y, como antes del declive, resplandece.

 

                  

                   Ossário do Mito (1990)

 

Página publicada em janeiro de 2008, ampliada em dezembro de 2008.ampliada e republicada em abril de 2014.


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