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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

BANDEIRA TRIBUZI
(1927-1977)

 

José Tribuzi Pinheiro Gomes, nascido em São Luis do Maranhão. Viveu e estudou em Portugal  até 1946. Obras: Alguma existência (1947), Rosa da Esperança (1950), Safra (1960), Sonetos (1962), Pele & Osso (1970). Suas Poesias Completas saíram em1979, pela Livraria e Editora Cátedra/INL, com prefácio de Josué Montello. Foi um modernizador, um agitador cultural, influenciando toda uma geração de poetas ludovicences.

 

 

TRIBUZI, BandeiraPoesias completas.  Prefácio de Josué Montello.  Rio de Janeiro: Livraria Editora Cátedra; Brasília, DF: Instituto Nacional do Livro –INL, 1979.  285 p.  14x21 cm.  ” Bandeira Tribuzi “ Ex. bibl. Antonio Miranda.

 

ITINERÁRIO DO CORPO

A Afonso Felix de Sousa

 

I

O pequeno lugar predestinado:

cama – lençóis, colchão e travesseiro:

objetos banais pousados sobre

a armação de madeira para dois.

 

Pequeno apartamento de cidade!

Pequenos corpos e cansados despem-se,

despem roupas, sapatos, conveniências

à pequenina luz que afaga as coisas.

 

Estão nus, lado a lado, sobre o leito

e se entrelaçam para desafogo

de raivas, lutas, ilusões, sentidos.

 

Talvez não saibam por que assim se prendem,

Já cantam sino pelo novo filho!

 

II

Entre o campo de neve a vida fende-se

barbaramente, para dar passagem

à colheita que vem sem estações:

bicho da terra que se chama homem.

 

Nove meses guardado e construído

com silêncio, carne, sangue e esperança,

ei-lo que rasga o ovo e se apresenta

disforme, placentário, precioso.

 

Ela está como o campo após a ceifa.

De seus peitos já mana o claro líquido

onde a vida se côa como um filtro.

 

Olha o pequeno corpo que se deita

a seu lado, entre o sonho e a realidade,

e, brandamente, diz apenas: - Filho!

 

III

Infância triste, tempo de castigos

e doces ilusões mas sem brinquedo

que teus olhos encontram nas vitrines

e tua débil mão jamais alcança.

 

Porém o corpo vai rompendo elástico

pesar do tempo amargo em que floriste.

Teus olhos já se pousam sobre a vida

embora ignorando-lhe a inocência.

 

Assim, surgindo vens dos alimentos,

cuidados e remédios e o alicerce

da sapiência que são letra e número.

 

Assim te formas resumido corpo

que será de homem e continuará

brincando em nova trágica maneira.

 

IV

Resides entre o sonho e coisas ásperas,

a confusão do trágico e a rosa,

a escola, o emprego, o livro clandestino,

a refeição modesta, o sono limitado.

 

Teu corpo é apenas máquina de sexo

e coração: toda a razão de ser

está na amada, amada inconsistente:

olhos, cabelos, seios, agressivos

 

somente, mas tu a colocas lá

bem no centro do mundo e lhe declamas

baladas, vossos corpos se aproximam.

 

Entre comícios, agressões, revoltas,

pressa, atenção, estudo, devaneio,

estás defronte ao mundo e interrogas.

 

V

A resposta és tu mesmo: corpo de homem,

o sentimento e pensamento de homem,

passo seguro de homem, ombros de homem,

boca, face, palavra e gestos de homem.

 

O que sabes do mundo! Gestos mágicos

te multiplicam ao calor dos corpos.

Uma coragem funda, o olhar sábio,

avanças com o tempo e o constróis.

 

A noite existe – não a das carícias,

de sono leve, corpos repousando –

noite pesando sobre cada coisa.

 

Avanças bloqueado pela Noite

(há muitos, muitos corpos avançando)

e teus passos vão dar na madrugada.

 

VI

És fogo que se apaga lentamente.

Folhas que vão tombando despem a árvore.

Árvore a quem a seiva foi faltando,

tua missão se acaba e envelheces.

 

Teus olhos já cansados de aprender

formas, gestos e a grande cor do mundo.

Tua boca já cansada de alimentos,

de beijos, de palavras, de protesto.

 

Outros vêm substituir tua coragem

com novos braços para a mesma luta,

e passos fortes para o mesmo fim.

 

Tua hora vem chegando necessária.

O corpo se dissipa. Tua passagem

não terá vermes para devorá-la.

 

 

CONCLUSÃO PARA CONSOLO

 

Bicho da terra estás apenas morto.

Já a terra de que és bicho te recobre

e uma pequena flor acena, leve,

um pequenino adeus sobre teu túmulo.

 

Tua mulher jamais esquecerá

tua sólida figura. Nem teus filhos

que em si a reproduzem e prosseguem

tua presença em gestos e palavras.

 

O tempo que rompeu teu rude corpo

como inverno passando sobre o campo,

não cortou a semente indispensável.

 

Ele mesmo será propício à nova

árvore forte que sustém o mundo

e reverdece o chão da vida mágica.

 

 

Lamentação do quase ex-príncipe


Menino sou do tempo que se acaba

e, consequentemente, sou aquele

para quem tudo que de novo venha

recorda o anterior que mais amava.

 

Sou filho do ruído das palavras

de que abusava para, sem sentido,

me ver de cores vivas revestido.

Não ter lugar real facilitava

 

o meu estar entre diversas forças,

neutro. Menos a idéia que o proveito

exerci. Filho do tempo e inculpável,

 

sempre exaltei gratuitas circunstâncias.

Não sei se me defendo, se me odeio,

se iludo o meu saber-me e odiar-me.

 


PAISAGEM

 

Eis aqui um cão

e defronte um homem:

ambos o pão

da fome comem.

Olha o cão a vida

triste das pedras

(coitado do cão

que não pasta ervas)

e por fim já morde

o osso das trevas.

 

Olha a vida o homem

com saudade amarga.

Os olhos do homem

já não olham nada.

Só, em seus ouvidos

de carne fanada,

teimam os latidos

da morte e do nada.

 

Bandeira Tribuzi

De
Bandeira Tribuzi
SAFRA
poemas MCMLXI
São Luis: Departamento Estadual de Cultura, 1961
s.p.

 

(...)

Viaja a roda do tempo na cadeia
ininterrupta, de milhões de dentes.
Ondeia o verde trigo e o pão ondeia
e ondeia o segredo das sementes.
A pouco e pouco na ampulheta descem
finos, inesgotáveis  grãos d e areia.
Quando a mão colhe o trigo que semeia
já um novo trigal novas mãos tecem.
E a onda vem e volta e vai voltando,
viva maré da vida flutuando —
asa de pássaro entre a morte e o ovo.
Ter sido já vai sendo o que será.
A cada morte um ventre se inchará
e o sangue que morreu nasce de novo.

(...)

Por ela quebro a rota do silêncio
e canto este meu canto duro e amargo:
rapsódio rude de sombrio tempo,
sonora lástima do corpo sob o látego.
Pela manhã que vem nas águas puras
do rio cujas lágrimas são ondas
e por ti, natureza, pelo som das
sinfonias da semente em fúria.
Contempla, companheiro, esta macia
e viva cor da vida nestes dias
quando se rompe o ventre dos trabalhos
na maré viva de pomo, vinho e pão
e o vento, pelas árvores, violão
longo e lento, se perde em seus atalhos.

Os dias acontecem sobre a carne
do tempo objetivo e singular.
Ao poeta, além da vida que lhe cabe,
cabe também o ofício de cantar.
E é tão maduro o tempo e incisivas
são de tal modo as circunstâncias de
que se vê rodeado o poeta que
cantando, canta apenas coisas vivas.
Para que sonha se o luar adulto
já é um sonho positivo e claro:
objeto sem forma, apenas vulto
macio e real. Que sonho raro
será mais puro e belo e mais profundo
do que esta viva máquina do mundo?

(...)

 

ATO – REVISTA DE LITERATURA.  NO. 7. Belo Horizonte: Gráfica e Editora O Lutador,  janeiro de 2009.  Editores: Camilo Lara, Rogério Barbosa da Silva e Wagner Moreira.  21,5 X  52 cm.  52 p.
Ex. biblioteca de Antonio Miranda



“O que se percebe, observando essa primeira e exemplar
obra de Bandeira Tribuzi, é o sal audaz caráter de não se
ter deixado submeter pelo tempo.  As palavras  se tornaram donas de si e, deliberadamente, eternas.  Tornaram-se reflexos de afeição à justiça, confiança, humildade, solidão, fecundidade e ao próprio ato poético.’

FLAVIANO MENEZES DA COSTA

 

 Soneto 1

O tempo cansou a vida
a vida se abandonou
o abandono não bastou
e uma florzinha se lamenta

Secou a fonte que existia
a madrugada emurcheceu
o pão faltou
e o pensamento

Depois ruíram as casas
as famílias a tradição
Sobrou um rato para Drummond cantar

O poema de Drummond salvou um homem
O homem amou e reconstruiu a vida
Qual a raiz da vida: o rato ou Drummond
(p. 64-65)


 Soneto 3

  Um homem desceu ao mundo
na Piedade
com duas fábricas ao lado
e a cidade depois da curva

No dia em que ele nasceu
um automóvel descuidado
matou Antonio
(Ficar até ao fim é privilégio)

O homem passou da curva
e das fábricas ao lado
para dar o seu recado

Mas o Diário de Notícias precisava necrológio
Daí que ele morresse simultâneo
Ao surgir de outro para a continuação
(p. 65-66)



Mário de Andrade desapareceu

Ninguém o esquece — todos o procuram
Perguntam-nO às esquinas aos soluços
Perguntam-nO à garoa e às rosas claras
Vai a S. Paulo vão a Lopes Chaves

Perguntam-nO às manhãs  Folheiam livros
Rondam retratos falam e reúnem-se
Os oradores engulham seu nome
O sorriso parou em muitas faces

Os amigos estranham seu silêncio
proclamam que desceu para os infernos
A cidade procura-O entre o frio

Ele partiu — não chores Josefina
este vazio de carícia e ausência
O Mário foi-se embora pra Pasárgada
(p. 64)


 O Morto e a Rosa

A morte vai tranquila em muitos rostos
O morto vai tranquilo e entre rosas
No céu a ave qualquer traçou o adeus
Do chão sobe a canção que embala a angústia

E o morto vai secreto entre o silêncio
Seu corpo desce enfim à terra fértil
— pasto de vermes — desconhece a dúvida
Vai com ele a saudade feita rosas

que o embalam e fecham de silêncio
Uma rosa porém sub-reptícia
tombou: fugindo a ser socorro aos bichos

Uma rosa escapou aos pés monótonos
uma rosa escapou aos dedos úmidos e
guarda em perfume o espírito do morto
(p. 69)

 (TRIBUZI, Bandeira.  Obra Poética: Alguma Existência.
São Paulo: Siciliano, 2002.)

*

Página ampliada e republicada em março de 2024.

 

 

 

 

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