Don Luís de Góngora y Argote (Córdoba, España, 1561-1627)
Imagen del Códice Chacón
TEMPO PARALELO
Poema de Antonio Miranda
A Dom Luiz de Góngora
I
Tempo que flui em teu corpo,
tempo espacializado, superfície
que dura – ânsia, na espera –
é contido, concentrado até ao seu
desabrochar.
Um tempo assim tão longo,
tão esperado, tão inseguro,
num corpo dormente, prostrado,
sustado, em plena quietude,
repousado.
Neste presente duradouro, extensivo,
deslocado de seu passado, livre,
breve, na placidez, em repouso,
descolado em seu momento próprio,
absoluto.
Como uma fruta, natureza viva,
todo o pretérito colocado no presente,
refletido no infinito do corpo,
o futuro projetado no desejo
inalcançável.
II
Tempo afetivo que encurta o prazer,
que alonga e prolonga o sofrimento,
que é instante e também é instinto,
que é vivência mas não é seqüência
e conseqüência.
Tempo paralelo em que nos desprendemos
e nos perdemos – como uma cortina –,
sempiterno, desencontrado, mas sereno,
simultâneo, numa rotina ambígüa,
uniforme.
Que vive intensamente – experiência
constante, tempo no espaço do tempo -
que acelera, reverbera, pulsa e geme
(fluxo e refluxo, temporal e fluvial),
em combustão.
Em aceleração e regressão, detendo
o tempo, esgarçando-o, prolongando-o
na memória (que não é mais tempo),
que é findo e, no entanto, perpassa
- pássaro!
Extraído do livro RETRATOS & POESIA REUNIDA (Brasília: Thesaurus, 2004) |