ESTAR CAZUZA
Poema de Antonio Miranda
Para Everi Carrara Carrara
Ilus. José Campos Biscardi
Menino afoito, Cazuza:
tua vida louca, vida breve
também foi leve...
Cazuza, adorável menino
a quem amei e desejei
na reinvenção de minha juventude
assumindo seu corpo flébil, febril
seus assomos de pavão iluminado
em seus amores furtivos, fugidios
numa conjunção extrema
de paixão e liberdade.
Genial e até banal
em sua obsessiva transfiguração:
vertendo-se em versos e venenos
de que morria e florescia
- morria por fora
e renascia por dentro
recriando-se das cinzas.
Assumia aquele corpo
e sua trans-sexualidade
com o ardor e o destemor
que eu não atrevia
com meu próprio corpo
- como que inocentando-o
apartando qualquer preconceito.
Embora a vida que se vive
nem sempre é vida que se quer
- a dele fluiu, fruiu:
espargiu-se em sêmen-versos
e ruiu sem culpa nem pecado.
Quem disse que o tempo não para?
Querendo dizer extasiar-se?
Dar-se por inteiro e sem retorno?
- meu lado hedonista
mesmo sem ser assumido –
amor extremo e derradeiro?
Estar Cazuza mesmo sem sê-lo:
como estar Glauber, estar Elis
em nossa secreta idolatria
ou estar sempre – literalmente-
em estado de poesia.
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