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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DALTON TREVISAN

  

(Curitiba, 1925), considerado um dos mais importantes contistas brasileiros, esteve à frente da revista. Joaquim, entre 1946 e 1948, e publicou, entre outros, Novelas nada exemplares (contos, 1959), O vampiro de Curitiba (contos, 1964) e Capitu sou eu (contos, 2003).

 

 

 

101 POETAS PARANAENSES (V. 1 (1844-1959)  antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI.  Seleção de Admir Demarchi.  Curitiba, PR: Biblioteca Pública do Paraná, 2014.  404 p. 15X 23 cm.  (Biblioteca Paraná)  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

CANTARES DE SULAMITA

 

Cantar 1

 

Se você não me agarrar todinha

aqui agora mesmo

só me resta morrer

 

se não abrir minha blusa

violento e carinhoso

me sugar o biquinho dos seios

por certo hei de morrer

 

estou certa perdidamente certa

se não me der uns bofetões estalados

não morder meus lábios

não me xingar de puta

já hei de morrer

 

bata morda xingue por favor

morrerei querido morrerei

se você não deslizar a mão direita

sob a minha calcinha

murmurando gentilmente palavras porcas

 

sem dúvida hei de morrer

também certa a minha morte

se você não acariciar o meu púbis de Vênus

com o terceiro quirodáctilo

já caio morta de costas

defuntinha

toda morta de morte matada

 

morrerei gemendo chorando se você titilar

a pérola na concha bivalve

morrerei na fogueira aos gritos

se não o fizer

 

amado meu escuta

se você não me ninar com cafuné

me fungar no cangote

mordiscar as bochechas da nalga

me lamber o mindinho do pé esquerdo

juro que hei de morrer

certo é o meu fim

 

te peço te suplico

meu macho meu rei meu cafetão

eu faço tudo o que você mandar

até o que a putinha de rua tem vergonha

 

eu fico toda nua

de joelho descabelada na tua cama

eu fico bem rampeira

ao gazeio da tua flauta de mel

eu fico toda louca

aos golpes certeiros do teu ferrão de fogo

ereto duro mortal

oh meu santinho meu puto meu bem-querido

se você não me estuprar

agora agorinha mesmo

sem falta hei de morrer

 

se não me currar

em todas as posições indecentes

desde o cabelo até a unha do pé

taradão como só você

é certo que faleci me finei

todinha morta

 

se não me crucificar

entre beijos orgasmos tabefes

só me cabe morrer

minha morte é fatal

de sete mortes morrida

morrinha de amor é Sulamita

 

 

 

Cantar 2

 

Oh não amado meu

moça honesta já não sou

e como poderia

se você me corrompeu até os ossos

ao deslizar a mão sob a minha calcinha

acariciou a secreta penugem arrepiada?

 

como seria honesta

se você me deitou nos teus braços

abriu cada botão da blusa

sussurrando putinha no ouvido esquerdo?

 

se pousou delicadamente sem pressa

a ponta dos dedos nos meus mamilos

até que ficassem duros altaneiros

apontando em riste só pra você?

 

maneira não há de ser moça direita

depois de ter as bochechas da nalga

mordidas por teu canino afiado

que gravou em brasa para sempre

com este sinal sou tua

 

não nenhum resto de pureza

assim que descerrou os meus lábios

dardejando a tua língua poderosa

na minha enroscada em nó cego

minha enroscada em nó cego

 

como ser mocinha séria

depois de beijar todinho o teu corpo

com medo com gosto com vontade

de joelho descabelada mão posta

à sombra do cedro colosso do Líbano

mil escudos e troféus pendurados

 

é possível ser moça de família

se me sinto a rosa de Sarom

orvalhada da manhã

com um só toque do teu terceiro quirodáctilo?

 

Ai precioso amado querido

meu corpo tem memória e febre

meu puto me abrace me beije

sirva-se tire sangue me rasgue inteira

satisfaça a tua e a minha fome

finca o teu pendão estrelado

onde ele deve estar

 

oh não meu príncipe senhor da guerra

mocinha séria já não sou

me boline devagarinho

no uniforme de gala da normalista

atenção às luvas brancas de renda

me derrube na tua cama

de lado supina de bruços

me desnude diante do espelho

me arrume de pé dentro do armário

me ponha de quatro

 

me faça de carneirinha viciosa do bruto pastor

me violente sem dó com firmeza

só isso mais nada

 

sim bem-querido meu

sou putinha feita pra ter servir

me abuse desfrute se refocile

 

quero sim apanhar de chicotinho

obedecer as ordens safadas

submissa a todos os teus caprichos

taras perversões fantasias

quais são? como são? onde são?

 

me diga como posso ir à igreja

de véu no rosto Bíblia na mão

se você afastou com dois dedos firmes e doces

o mar vermelho entre as minhas pernas

expondo à vista ao ataque frontal

meu corpinho ansioso e assustado

me estuprou me currou me crucificou?

 

quando separou os joelhos

abrindo as minhas coxas

um querubim fogoso

de delícias me cobriu

com sua terceira asa de sarça ardente

 

como ser moça ingênua

se antes sou uma grande vadia

o teu exército com fanfarras desfilando

na minha cidadela arrombada?

 

ai quero te dar até o que não tenho

amado meu santuário meu

quero ser a tua cadelinha mais gostosa

como nunca terá igual

serei vagabunda eu juro

todas as posições diferentes

todos os gemidos gritos palavrões

todas as preces atendidas

 

desfaleço de desejo por você só você

montar o teu corpo cândido e rubicundo

é galopar no céu

entre corcéis empinados relinchantes

 

vem ó princesa minha

depressa vem ó doce putinha

aos gritos fortes do rei que batem à porta

o meu coração se move

salta de um a outro lado do peito

já se derretem as minhas entranhas

o rosto do amor floresce neste copo dágua

 

eu sou tua você é meu

por você inteirinha me perco

quem fez de mim o que sou?

sim amado meu

sou virgem princesa concubina

égua troteadora no carro do Faraó

vento norte água-viva

sou rameira tua rampeira Sulamita

 

lírio-do-vale pomba branca

morrendinha de tanto bem-querer

até que sejamos um só corpo

um só amor

um só

 

 

 

 

Página publicada em setembro de 2015

 

 

 

 


 

 

 
 
 
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