ANDERSON LUCAREZI

Nasceu em São Paulo em 1987.  Passou 14 anos sob educação religiosa que desembocou em descreça.  Graduando em Letras pela USP e professor do ensino médio. Inicia-se na tradução da poesia norte-americana.   Seus primeiros textos apareceram na Antologia do III Festival de Literatura das Letras USP, em 2011.  

LUCAREZI, Anderson.  Réquiem.   São Paulo: Editora Patuá, 2012.  72 p.  14x18 cm.  ISBN 978-85-64396-23-7  Editores:  Alice Rocha e Eduardo Lacerda.  Projeto gráfico, capa e ilustrações: Leonardo Mathias–  flickr/leonardomathias.  Tiragem: 100 exs   Col. A.M.  (EA)

chumbo dentro do cérebro

a morte joga xadrez na sétima arte

enquanto Sartre lança livros pela janela.

discos riscados rangem nas vitrolas

naquelas desastrosas nostalgias

por vias eu via eu sabia

que eu seria bem diferente

mas sente : não o sou em nada

é bom que a poesia acalme

desta vez, no entanto, napalm:

sobre os óculos de acetato

sobre as boinas à la Guevara

sobre as roupas kitsch dos brechós

sobre nós, sobre vós - nós todos

que falamos do que não lemos

que somos o que não queremos

que agouramos o que não temos

que o senhor deus nos abençoe,

não com a pureza batismal

mas sim com as flamas do napalm

e que encontremo-nos

todos, muito mais belos,

na soleira do inferno.

panis  angelicus, fit panis hominum ;

no incensório que eleva à abóbada da igreja a

narcótica fumaça

- pão de cada dia -

a VQZ do sacerdote se fetichiza; o teto é de pedra,

não nosso de cada dia;

todavia, o papa, gângster imperialista,

sobre o salto Prada , decreta os dos e don'ts

da cartilha "dez passos para a salvação" , tais como:

I- em nome da vida e da salvaguarda da concepção,

abstenham - se do sexo, ó africanos.

ou , a distorção mórmon,

na qual um cristo cruza o atlântico

(andando sobre as águas?)

e legitima a América em aparições aos astecas;

saldo : no XXI, um grupo considerável de missionários,

pelo globo, em roupas finas , levando a sacra palavra.

ou tantos outros:

em jihad        genocídio          em cada

o fio da        cru          um dos

cimitarra             a        quatro braços

desce frio           mente     Shiva carrega

como lua   concretizado   ogivas

minguante           nucleares

em nome da lei,

em boa figura                    enquanto des

do transitório      na noite       aba a burca

da vida,       de s.bartolomeu   sobre o que

que podia        e       havia de ser

ser outra     além   mulheres

mas o que impera é a lei
na voragem de dinheiro,
o imaginário do pastor alemão internalizado
- ronda cerceante de um deus cerbralizado:
GOD  DOG

antes que o dia acabe

antes que  (se houver depois)
      tornemo-nos fogos – fátuos
a girar no ar, perdidos,
      e esbarremos um no outro,
sem matéria, sem memória,
pura energia da terra,
sem mais ser mesmo,
mero pó do pó do cosmos,
                    te digo: venha, e já.

Página publicada em novembro de 2012