AMÁLIO PINHEIRO
Poeta e tradutor, professor de Comunicação e Semiótica da PUCSP.
Amálio Pinheiro é poeta, tradutor e professor no Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUCSP. Coordena o Grupo de Pesquisa "Barroco e Mestiçagem".
PINHEIRO, Amálio. Tempo Solto. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2013. 91 p. 14x21 cm. Prefácio Jerusa Pires Ferreira. ISBN 978-85-7480-637-2
Ex. bibl. Antonio Miranda
BORDADO
O teu mundo recolhido se insinua
em certas tarefas caseiras:
ponto por ponto te vejo refazer
os pensamentos e as semanas;
o conhecimento interno
de miúdas gentilezas,
a sabedoria calada
de desvãos e corredores.
NATUREZA MORTA
Não sei o que dizer de um lápis
ao lado de uma fruta;
nem da mesa com suas esquinas
caseiras, dominicais.
Não sei o que dizer de uma fruta
ao lado de um cinzeiro
ou desse risco de brasa
que virou mão apagada.
Não sei o que dizer de um cinzeiro
ao lado de uma fruta
podendo ser um lápis
apontado na memória.
Não sei o que dizer de uma fruta
querendo ser cinzeiro
neste lápis, que se afasta
ao lado de uma brasa.
BAIRRO
Os seios trouxeram na mão
o seu rude aniversário
feito de telha e terra dura;
os materiais da chuva
encontraram seus metais,
e o tosco dos elementos
fez-se dia bem lavado,
uma esquiva madrugada,
o sol se pondo na cama.
ARREDORES
Os teus seios como dois silêncios
contínuos e repetidos, sombra de muro,
esquina, bairro alto.
A tuas mãos clarividentes
estendendo a solidão
como nas varandas se estendem os sossegos,
varal, tarde miúda e longínqua
caindo nos telhados.
Página publicada em outubro de 2017
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