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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

EDUARDO STERZI

Foto extraída de: www.algumapoesia.com.br/

 

EDUARDO STERZI


 

Eduardo Sterzi (Porto Alegre, 7 de junho de 1973) é um poeta, jornalista e crítico literário brasileiro.

 

Sterzi formou-se em Jornalismo pela UFRGS, tendo trabalhado no jornal Zero Hora. Mestre em Teoria da literatura (PUCRS) com dissertação sobre Murilo Mendes e doutorado em Teoria e História Literária na Unicamp, com tese sobre o livro Vita Nova, de Dante Alighieri. Atualmente reside em São Paulo. .

 

É um dos editores da revista de poesias Cacto e de K Jornal de Crítica. Entre suas publicações, o livro Prosa (poesia) de 2001 e os artigos Drummond e a poética da interrupção, no volume Drummond revisitado, organizado por Reynaldo Damazio (Universidade São Marcos), e O mito dissoluto, no número do 3 da Rivista di Studi Portoghesi e Brasiliani. Organizou o volume Do céu do futuro: cinco ensaios sobre Augusto de Campos.

 

Publicou o livro de poemas Prosa (2001), de onde foram extraídos os poemas a seguir:

 

 

DESAPARIÇÃO

 

                             the inconceivable Idea of the sun

                                                    Wallace Stevens

 

Sereno, à flor do tempo,

recomponho o desejo

de estar vivo. Vejo

entrar pela janela

o mesmo sol de sempre;

finjo que não conheço

seu calor, sua máscara

amarela, hepática.

Sei mais da natureza

das nuvens, e do vácuo

entre as estrelas, negra

matéria; no entanto,

quando me entrego ao sol,

integro-me ao ser sol:

narciso mais que cego,

narciso cegaluz.

 

                                                                                                

 

                            ÉCLOGA

 

                   gravis cantantibus umbra

 

rouxinóis

e bem-te-vis

 

inútil natureza

 

noite (voz que vês)

- nascondere: nascer –

 

garganta miúda

 

canto claro

de longínqua beleza

 

a tarde carcome a folhagem

 

o

mais-que-perfeito

 

se desfez

 

renascer renascerá

talvez

 

no tempo

 

de feroz

delicadeza

 

 

                            PROSA DE UM DOMINGO

 

A máquina do corpo, resumida nos sentidos,

dissolve a tempestade num cheiro de chuva:

recorda-me, qual súbita visagem

(sutilmente engastada

no tempo presente),

a dor de ser

sem ter

sido.

 

Nada

(nem cheiro

nem tempestade),

mesmo que reviva,

num segundo abençoado,

a sensação de uma outra vida (frágil

como a própria infância, dor secreta do poema),

pode, fugaz, dar-me a garantia de ter vivido.

 

                                                                                             

                            OUTRO TIGRE    

 

Tigre, diamante vertebrado,

nenhuma jaula poderá

reter, inflexível, a fria

fúria do teu olhar.

 

Nosso inútil terror de humanos

extrairá, do mundo em que vives,

a força líquida (flutíssona) de

músculos invisíveis.

 

Tigre, metáfora do tempo,

demônio cego da distância:

que ser, ferido de beleza,

te admira em segurança?

                                                                                             

 

POESIA SEMPRE. Ano 8 – Número 12 – Maio 2000.  Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro, 2000.

 

        Vênus

              So landete die Gottin
                  
Rainer Maria Rilke

         Nasces de tua própria concha
         íntima, incógnita, recôndita.
         Assim desenhas tua dança desenvolta.

         Virgem, minha proa corta as ondas e prova
         o sal intrínseco das coxas,
         sorve o teu oceano secreto.

         Faminto, nada mais espero:
         invento o meu próprio deserto.
         Sedento, sou por fora o que não sou por dentro.

         Tua nascente deságua neste homem seco,
         e nem sequer me desespero.
         Sou filho desta dor coreógrafa.

 

         Música

                 Rien, cette écume, vierge vers

                            Stephane Mallarmé

         A musa voluptuosa
         pede passagem

         e lhe damos —
         prosa:

         qualquer imagem
         vale mais

         que a floração sentimental de uma
         rosa:

         gás lacrimogêneo,
         luto, melancolia,

         estrofe, catástrofe,
         catarse:

                            deposita-se, linear
                                                          (limpa e suja como um verso),
                            pela praia pedregosa da palavra

                                                                             — esta espuma.

 

        Écloga

                gravis cancantibus umbra

                            Virgilio

         rouxinóis
         e bem-te-vis

         inútil natureza

         noite (voz que vês)
         — nascendere: nascer —

         garganta miúda

         canto claro
         de longínqua beleza

         a tarde carcome a folhagem

         o
         mais-que-perfeito

         se desfez

         renascer renascerá
         talvez

         no tempo

         da feroz
         delicadeza
 

 

INIMIGO RUMOR – revista de poesia.  Número 12 –
1º SEMESTRE 2002.
  Editores: Carlito Azevedo,  Augusto Massi. Marcos Siscar,  Rio de Janeiro, RJ:  Viveiros de Castro Editora, 2002.  199 p. Editora, 2001.  204  p.   ISSN  1415-9767. 
                                                           Ex. bibl. de Antonio Miranda

 

 

        ALMOÇO

      
Este cadáver é nosso
      almoço.

      Qual será a
      sobremesa?
      Outro cisne, de louça



       O CISNE, A JANELA DO LAVABO


       triste lago azulejado
      e seco; as rachaduras
      no branco,
      estigmas
      do voo
      rasurado; as asas
      inúteis, de louça;
       o oco à espera
       da vida (vegetal
       que seja); o longo pescoço
       interrogativo:

 

*

Página ampliada e republicada em dezembro de 2023
 


Página publicada em dezembro de 2009. ampliada e republicada em maio de 2018.

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