PEDRO ERNESTO DE ARAUJO
Nasceu em Nova Friburgo, Estado do Rio de Janeiro, em 1956. Poeta, teatrólogo, letrista e contista, publicou O papagaio que não queria ser verde (infanto-juvenil). Venceu diversos concursos literários e já foi publicado pelo Jornal de Letras e Suplemento Literário da Tribuna de Imprensa, entre outros.
Extraído de
POESIA SEMPRE – Ano 5 – Número 8 – Junho 1997. Revista semestral de poesia. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional de Livro. Editor Geral: Antonio Carlos Secchin. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Não sei nadar
Não sei nadar além de morte e muro.
Tudo o que sei de mares e de ilhas
foi navegado no meu quarto e assombro
em rotas obscuras de poesia.
Invisíveis semáforos me guiam
pelas mansões netúnicas do abismo.
Não sei nadar, não sei de navegar.
Só sei meu rumo quando estou perdido.
Não há sereias para ouvir meu canto.
Sou mais de ouvir as águas, de afagar
algas que me povoam cama e sono,
de imitar o voo das gaivotas
enquanto sorvo o vinho das palavras
e inauguro meu mar íntimo e ocluso.
Penetro fundo o coração das rochas
e me consome o êxtase das conchas.
Nos ventos eu construo minha casa
e componho o meu barco com o silêncio.
Não sei amar o mar, mas nós sabemos
tantas ilhas de amor que trago ocultas
nos fonemas, nas lúcidas paisagens
que contemplam de dentro o sonhos pânico.
Não sei nadar, mas leve como pétala
vou nas águas do canto sem perigo.
Peixe-andorinha, arraia-passarinho,
meu coração navega sem limites.
Em meu corpo soçobram sóis, navios
e recolho canções morta no porto.
O nascimento do poema
Inútil:
O poema não nascerá de teu grito solitário.
O poema não nascera de tua mão aberta na tarde
como rosa de espanto,
nem do jeito manso como mastigas teu pão,
nem de teu maxilar e teus dentes rudes
quebrando estrelas, fúrias.
O poema nascerá da dor do mundo doendo no teu peito
como uma praga, um tiro.
Vago poema
O tudo quanto tenho soma um grito.
Minha árvores genealógica nunca passou na lógica.
Comunistas, fascistas, socialistas, capitalistas, budistas
tentam a revolução impossível contra mim:
como arrancar minhas raízes do vento onde piso?
Como arrancar-me a solidão do peito
se ela está povoada de socialistas, fascistas, capitalistas, anarquistas,
De Pedros, de Ernestos, de Souzas e de Araújos,
inclusive de meu eu sem nome, pátria e família?
Página publicada em março de 2018
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