Foto: http://www.iea.usp.br
LEILA DANZIGER
Leila Maria Brasil Danziger (Rio de Janeiro RJ 1962). Gravadora e artista visual. Forma-se em artes plásticas pelo Institut d'Arts Visuels, Orléans, França, em 1989. Em 1994, com recursos concedidos pela bolsa Multiplikatoren, do Goethe Institut, permanece em Berlim, Alemanha, por 3 meses. Dessa estadia resulta o projeto Nomes Próprios, que é contemplado, em 1995, pelo Programa de Bolsas RioArte da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro. Em 1996, conclui mestrado em história social da cultura, na PUC/RJ, apresentando a dissertação Anselm Kiefer e a pergunta pela Alemanha, sob orientação de Ronaldo Brito.
Biografia: http://enciclopedia.itaucultural.org.br
O NERVO DO POEMA. Antologia para Orides Fontela. Organizadores: Patricia Lavalle; Paulo Henriques Britto. Belo Horizonte, MG: Rellicário,2018. 152 p. 14,5 x 20,5 cm. Capa, projeto gráfico e diagramação: Carolina Gischewski. ISBN 978-85-66786-84-2
Ex. bibl. Antonio Miranda
Inclui poemas de Ana Martins Marques, Josely Vianna Baptista, Lu Menezes, Patricia Lavalle, Leila Danzigert, Paula Glenadel, Marcos Siscar, Masé Lemos, Marília Garcia, Laura Erber, Edimilson de Almeida Pereira, Prisca Agustoni, Alice Sant´ Anna, Heitor Ferraz Mello, Tarso de Melo, Katia Maciel, Simone Brantes, Ricardo Domeneck, Mônica de Aquino, Paulo Henriques Brito, Claudia Roquette-Pinto, Ricardo Aleixo; e Agê de Carvalho.
Alguns dos poemas do livro inspirados na figura e obra de Orides Fonte, a exemplo deste, escolhido aleatoriamente:
Volpi
1
Surpresos, exaustos
expulso do céu
Madona e Menino
movem-se feito
cata-
vento.
2
Portas e janelas
afeiçoadas a futuros
esmaecidos
Se essa rua fosse minha —
dizem as fachadas
que não são de ninguém.
3
Minha irmã costurando
mostra
a moça de costas
à janela cerrada
vergada sobre um tecido
branco (fonte de luz
da cena
Era canhota? costurava a saia?
a anágua? o corpo? vemos a nuca
o braço, nunca saberemos
o rosto
infenso
aos tons terrosos
à máquina de costura
ao Modernismo
à história
da arte
que não guarda vestígios
do nome
da irmã de Volpi.
David
A moça de cântaro e seu / gesto essencial: dar água.
Rebeca, Orides Fontela
Meu filho atravessa a sala.
Veste uma bermuda.
Deixa um rastro de banho.
Sei que revirou os tapetas do banheiro.
Conta que lê um livro de 632 páginas
com palavras compostas jamais vistas.
Eu penso em um poço
uma tenda
uma muralha.
Qual será o meu gesto essencial?
Enovelar o tempo? Mover imagens? Ativar espaços?
Amar um filho, o meu, o único?
INIMIGO RUMOR- revista de poesia - Número 20 Ano??? Editores: Carlito Azevedo, Augusto Massi. Rio de Janeiro, RJ: Viveiros de Castro Editora, ??? ISSN 1415-9767-00020 No. 01 180
DESTROÇOS II
dessa vez
creio que o início de tudo
foi a persiana que esqueci aberta
deixando que o sol esquentasse
em minha ausência
furiosamente
dias e dias
os versos de Celan
acumulados sobre a mesa
as palavras
da madeira e borracha
os carimbos
começaram a derreter e gaguejar
— lallen und lallen —
balbuciar e repetir
: destroços celestes
: cinza-e-cinza Ho-sana anéis-almas
de forma não prevista no início do projeto
que queria apenas escavar e manobrar
os versos
como se faz com a própria
terra-areia-ar-eu-você-Ossip-Marina
e tantos outros nomes
todos os nomes
impronunciáveis
derretidos
fundidos
aos jornais
que cresceram como erva daninha
em minha ausência
dias e dias
a linguagem informativa
acumulada em pilhas
que era preciso desfazer
esvaziar
erodir a matéria-jornal
turvá-la de poesia
mas percebi
— surpresa —
o desastre
o desvio
tudo fora feito
sem mim
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INIMIGO RUMOR- revista de poesia - Número 20 Ano??? Editores: Carlito Azevedo, Augusto Massi. Rio de Janeiro, RJ: Viveiros de Castro Editora, ??? ISSN 1415-9767-00020 No. 01 180
DESTROÇOS II
dessa vez
creio que o início de tudo
foi a persiana que esqueci aberta
deixando que o sol esquentasse
em minha ausência
furiosamente
dias e dias
os versos de Celan
acumulados sobre a mesa
as palavras
da madeira e borracha
os carimbos
começaram a derreter e gaguejar
— lallen und lallen —
balbuciar e repetir
: destroços celestes
: cinza-e-cinza Ho-sana anéis-almas
de forma não prevista no início do projeto
que queria apenas escavar e manobrar
os versos
como se faz com a própria
terra-areia-ar-eu-você-Ossip-Marina
e tantos outros nomes
todos os nomes
impronunciáveis
derretidos
fundidos
aos jornais
que cresceram como erva daninha
em minha ausência
dias e dias
a linguagem informativa
acumulada em pilhas
que era preciso desfazer
esvaziar
erodir a matéria-jornal
turvá-la de poesia
mas percebi
— surpresa —
o desastre
o desvio
tudo fora feito
sem mim
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Página ampliada e republicada em dezembro de 2023
Página publicada em maio de 2019
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