EZEQUIEL FREIRE
(1850-1891)
José Ezequiel Freire de Lima (Resende, Rio de Janeiro, 10 de abril de 1850 — Caçapava, 14 de novembro de 1891) foi um poeta e cronista brasileiro.
Depois de tentar estudar na Escola Militar e na Escola Politécnica e já tendo publicado seu livro de poesias "Flores do Campo", veio para São Paulo, em 1875, para se matricular na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, onde se formou em 1880. Antes disso, em 18 de maio de 1875, aos 25 anos, casou-se com Maria Adelaide Silva de Araújo, com quem teve seus descendentes.
Desde os tempos de estudante, militou no jornalismo, sendo redator do Correio Paulistano e colaborador de A Província de São Paulo.
Depois de formado foi juiz em Araras, lente de retórica no curso anexo à Faculdade de Direito e fiscal do governo no Banco da União.
OLIVEIRA, Alberto de. Página de ouro da poesia brasileira. Rio de Janeiro: Livrria Garnier, 1929? 419 p. 11,5x18 cm. capa dura. Impresso em Paris por Imp. P. Dupont. “ Alberto de Oliveira “ Ex. bibl. Antonio Miranda
(com atualização ortográfica:)
O CAMARIM DE LÚCIA
Um leito gracioso,
— Antes concha de pérola; —
Mais do que se mostrando, — adivinhado
Através a indiscreta transparência
De um níveo cortinado...
Gentil, misterioso,
— Antes ninho de pássaro, —
De pequenino e alvo e tão catita!
Mais visão ideal que asilo e alcaçar
De unia moça bonita...
Escondendo-se quase
Na frouxa claridade da penumbra;
— Antes floco de névoa,
De tão mimoso e frágil; — mais aéreo
Mais irreal do que o afigura a ideia,
Menos realidade que mistério...
Feito de cismas, de pureza e gaze,
De candura e inocência
E, — como a gaze rumoreja a medo,
Quando a brisa a balança; —
Traindo frases de uns sonhares lúbricos)
Página aberta no mimoso enredo
De um romance de moça...
Alvo como a caçula
De magnólia pálida,
Macio mais que o arminho alvinitente
De um berço de pelúcia;
De mais que o berço, — uns longos de volúpia,
De mais que a flor — o cálido bafejo
Do hálito de Lúcia...
.................................................................
Um toucador singelo;
— Antes brinco da infância;
Mimo de confusão, capricho artístico,
Templo do estudo e altar da faceirice,
(Denunciando o espelho irreflectido
A fêmina ledice...)
Um Heine meio aberto a espreguiçar-se
Sobre o pállido marmor;
A brisa a despertá-lo da indolência
E, ao voltear das folhas, dispersando
As deslumbradas pétalas
De uma fanada flor, — tímido símbolo
De intima confidência...
Disséreis a gentil miniatura
De um elegante caos;
— As mil futilidades da costura,
— Caprichos feminis, frascos de essência,
E — ao lado desses nadas — a brochura
De um livro de ciência !!!
ALMANACH LITERARIO DE SÃO PAULO PARA 1877 publicado por José Maria Lisboa. São Paulo: Typographia da “Provincia”, 1876. p. 160
(ortografia original, de época)
A MAÇÃ
(DE EHRARD)
Da maçã, digo, não gosto,
mas desconheço a rasão.
Em summa, excelente fructo
que assaz procurando é;
terão razão, mas bofé,
Da maçã não gosto, não.
Meu tio, (aliás bom homem,)
cultiva-as no seu quintal
mas... oh! que tio seguro!...
A ellas não deito a mão,
deixo-lh´as todas, e juro:
da maçã não gosto, não.
Se dermos credito à Biblia,
um desses fructos do mal
causou a quéda de Adão.
Fosse eu no Eden, ver-se-hia
qu´inda lá hoje estaria...
—Da maçã não gosto, não.
Alguem, cujo nome calo,
diz-me: “a tua opinião
ha de mudar no futuro.”
—Pensas?... pois confirmo ainda:
—da maçã não gosto, não.
—“Se conhecêsseis um pouco
deste mundo a teimosia,
que a murros firma a questão!...
—Provaste o fructo algum dia
—Nunca! Repliquei irado,
Da maçã não gosto, não.
Contudo exigiu que eudesse
certa fidalga — uma tarde —
minha franca opinião?
—Qual dos fructos que conhece
prefere Eu disse enleiado?
— da maçã não gosto, não.
—Oh! não gostais!Vós!... Por certo
nem posso prestar-vos f[e.
E da altiva castell’a
as róseas faces ao perto
miro... Desde então, bofé.
gosto muito de maçã.
Página publicada em julho de 2015; ampliada em novembro de 2015.
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