ASTRID CABRAL
ASTRID CABRAL Félix de Sousa nasceu a 25/09/36 em Manaus, AM, onde fez os primeiros estudos e integrou o movimento renovador Clube da Madrugada. Adolescente ainda transferiu-se para o Rio de Janeiro, diplomando-se em Letras Neolatinas na atual UFRJ, e mais tarde como professora de inglês pelo IBEU. Lecionou língua e literatura no ensino médio e na Universidade de Brasília onde integrou a primeira turma de docentes saindo em 1965, em conseqüência do golpe militar. Em 1968 ingressou por concurso no Itamaraty, tendo servido como oficial de Chancelaria em Brasília, Beirute. Rio e Chicago. Com a anistia, em 1988 foi reintegrada à UnB. Ao longo de sua vida profissional desempenhou os mais variados trabalhos, fora e dentro da área culturaL Com a aposentadoria desde 1996 passou a dedicar-se exclusivamente à literatura e à família. Colabora em jornais e revistas especializadas. Viúva do poeta Afonso Félix de Sousa, é mãe de cinco filhos. Publicou, entre outros, os livros: Alameda (contos), 1963, 2 ed., 1998; Ponto de cruz (poesia), 1979; Toma-viagem (poesia), 1981; Lição de Alíce(poesia), 1986; Visgo da terra (poesia), 1986; Rês desgarrada (poesia), 1994; De déu em déu (poesia) [reunião de 5 livros], 1998; Intramuros, 1998; Rasos d´água, 2003. Prêmio Olavo Bilac, de Poesia, da Academia Brasileira de Letras, e vários prêmios da UBE- RJ. Membro do PEN Clube do Brasil.
Veja também: AS CERCANIAS DO OUTONO , sobre o livro de Léa Madureira Lima, por Astrid Cabral
Veja e leia o ensaio: ASTRID CABRAL: UMA VOZ POETICAMENTE FORTE, por JOLENE DA SILVA PAULA
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
Veja também>>> POÈMES EN FRANÇAIS
See also: POEMS IN ENGLISH & PORTUGUESE
A poeta Astrid Cabral numa das sessões magnas da I BIENAL INTERNACIONAL DE POESIA DE BRASILIA (de 3 a 7 de setembro de 2008), no auditório do Museu Nacional de Brasília.
CABRAL, Astrid. Íntima fuligem. Caverna e Clareira. Manaus: Editora Valer, 2017. 192 p. Prefácio: Alexei Bueno.Capa e projeto gráfico: Maysa Leite. Montagem/Ilustração [verso da capa] Mariana Félix – a partir de pintura de Laise Telles. ISBN 978-85-7512-84606 Ex. bibl. Antonio Miranda
P L E N I T U D E
Pleno sonho eu me vestia
com o tapete flor de jambo
e em andor de sandalo ia
mundo afora levitando
cantando na aurora junto
a pássaros furta-cores
me tocando com o veludo
reluzente de suas plumas.
Eu libélula, voava
sobre o rio que me bebia
quando minha blusa bruma
evaporando me despia.
Era quando eu gargalhava
vendo estrela que morria:
pois eu, fria, cintilava.
D E F I N I Ç Ã O
Ninguém se define
por suas confissões.
Senão por senes
e segredos.
O que está à sombra
não afunda ou soçobra.
Ilumina o que jaz
bem à tona.
O mundo submerso
de cada indivíduo
é o vero universo
a definí-lo.
O maisé resto.
ADMINISTRANDO A VELHICE
O esquecimento te atropela
e ainda que te esqueçam
esquecer não mais podes.
Tantos são os cuidados
que o corpo gasto te cobra
que tempo nenhum te sobra
para o ameno espairecer.
Outros são os expedientes
a consumirem teu ser:
consultas e tratamentos
visitas a amigos doentes
exames velórios missas
de sétimo dia partilhas.
E tudo de bom vem sempre
timbrado de nunca mais.
Só a esperança incansável
à tua bengala na estrada.
“A dor contra qualquer criatura”. Este livro tem como ponto solar a velhice, em cada verso é para ela que nos conduz a poeta, e insistentemente. Quando lemos um verso contundente como o verso destacado, voltamo-nos para o nosso “dentro” e, então, percebemos que se trata de nós, desnudos diante da Palavra, que não tem olhos, tato, audição ou voz, mas algo indizível e incontrolável.” NEIZA TEIXEIRA
CABRAL, Astrid. Lição de Alice, poemas. Rio de Janeiro: Philobiblion, 1986. 111 p. (Coleção Poesia, sempre, 7) 14x21 cm. Ex. Biblioteca Nacional de Brasília, doação da família de Francisco Marques de Vasconcelos Filho.
RITUAL
Todas as tardes
rego as plantas da casa.
Peço perdão às árvores
pelo papel em que planto
palavras de pedra
regadas de pranto.
EVIDENTE SINA
Como a vida irrompia à revelia
no improviso das linhas tortas
jogou no lixo a inútil régua
com que traçava o destino
a teoria d livre-arbítrio
amassadinha entre os papéis.
CABRAL, Astrid. Visgo da terra. Manaus, AM: Edições Puxirum, 1986. 107 p. 14x21 cm. Ex. Biblioteca Nacional de Brasília, doação da família de Francisco Marques de Vasconcelos Filho.
TAREFAS
Grelam grelam sobre a terra
os cocos de tucumã.
Cortam e cortam roseiras
as saúvas com afã.
Berram e berram cigarras
socorro à luta tão vã.
Jorram e jorram as águas
da distante Tarumã.
E rolando vai a terra
manhã depois de manhã.
BUSCA
Minha infância é hoje
aquele peixe de prata
que me encarregou da mão
como se fosse sabão.
Mergulho no antigo rio
atrás do peixe vadio
—Quem viu? Quem viu?
Minha infância é hoje
aquele papagaio fujão
No ar, sua muda canção.
Subo nos galhos da goiabeira
atrás do falaz papagaio
— Me segura, me segura
senão eu caio.
CABRAL, Astrid. Sobre Escritos. Rastros de leituras. Manaus, AM: EDUA, 2015. 445 p. 15x23 cm. ISBN 978-85-7401-798-3 Prefácio: Rita Barbosa de Oliveira. Apresentação: Carlos Antônio Magalhães Guedelha. A obra dividida em duas seções: “Convivência literária” com textos escritos por Astrid Cabral (resenhas literárias, apresentações de livros, etc) publicados em jornais e revistas; e “Olhar de Narciso”, com texto sobre a autora, principalmente entrevistas.
Poemas Inéditos
BUENA DICHA NO LARGO DO MACHADO
Afastai-vos do pedaço
ó coloridas ciganas!
(fecho ambas as mãos em figa)
Seide sobra do passado
fácil é o futuro prever.
Não me adiantam os detalhes
que podeis acrescentar.
São inúteis feito tranças
brincos pulseiras colar.
Tudo o que a mim interessa
é a volúpia da hora
que passa em pressa veloz.
sob o milagre do olhar.
A tarde desabrochada
em tanta luz provisória
banhando-me corpo e alma
Eu proprietária da terra
enquanto a festa durar!
LA BUENA DICHA EN EL LARGO DO MACHADO
Versión de Helena Ferreira
!Apartaos de ese entorno,
oh multicolores gitanas!
(cual una figa* tengo cerradas las manos)
Conozco de sobra el pasado
el futuro resulta fácil prever
De nada me sirven los detalles
a que podéis añadir.
Hecho trenzas inútiles son
aros, pulseras, collares
Todo que a mí me importa
es la voluptuosidad de la hora
que pasa de prisa y corriendo
bajo el milagro de la mirada.
Se abre la tarde
con demasiada luz provisional
bañándome el cuerpo y el alma.
¡Propietaria de la tierra soy
mientras dure la fiesta!
*De origen latino (Picus), es el más antiguo amuleto contra el mal de ojo en forma de mano cerrada, en que el dedo pulgar está entre el índice y el medio.
AMOR EN EL PONTÓN
Lo confíeso: el amor por ti
no cruzó el mar.
Sólo se mojó las piernas en la espuma,
y temiendo a vagas, dunas
no quiso cabalgar el viento.
Lo confieso: el amor por ti
se dejó estar en el pontón
sin recorrer puente alguno
Desde Ia tierra saludabas de lejos
a la ventura de otra orilla.
Mi amor por ti se quedó a medias
rehén del miedo de riesgo.
Sólo me gustaría pasearme
a bordo de una goleta sin lastre.
Jamás viajar de verdad.
AMOR NO PÍER
Confesso: o amor por ti
não atravessou o mar.
Só molhou as pernas na espuma
e temendo vagas, dunas
não quis cavalgar o vento.
Confesso: o amor por ti
deixou-se ficar no píer
sem percorrer ponte alguma.
Acenavas terra ao longe
a ventura de outra margem.
Meu amor ficou no meio
refém do medo de risco.
Queria apenas passeio
a bordo escuna sem lastro.
NO UMBIGO DO RIO
Inocente fui pela aragem da manhã
colher flores selvagens, dessas miúdas
de tufos baixos e corolas brancas
dessas que trocam sem problema
o chão dos campos por jarros na sala
até ficarem cinzentas, cobertas de pó.
Assim me extraviei entre moitas
atrás das tais sempre-vivas-do-mato ...
Ao sair do sol entrei num túnel de galhos
que levava à corrente e à pequena praia
de areias alvas como macaxeiras nuas.
Daí entrei num banho de águas castanhas
anoitecendo cada vez mais escuras
e logo me senti envolvida num abraço
que me puxava ao fundo, como se houvesse
alguma armadilha de peixe submersa
meus pés tentando em vão tocar o chão,
o grito quando eu vinha à tona, sumia
abafado no gorgolejo da correnteza,
e o caudal sempre me enrolando brutal
sem que eu pudesse me desvencilhar.
Pensei, em vez de flores quase eternas
vou colher agora a flor da minha morte
no olho deste abismo, no umbigo do rio.
Então deu-se o milagre! Um anjo, saído
do verde ou do céu, me salvou das águas.
Tudo isso aconteceu há meio século
e a paisagem de tão antiga evaporou-se.
Aqui estou vestida com a poeira do tempo
irmã das flores que buscava em meu passeio.
Selecta de Rasos d’água
CORAÇÃO COURAÇADO
Tempestades em oceanos
ou em copos d'água
e não peço a Deus balsas
barcaças nem praias.
Só um coração couraçado.
Desses que no lombo
das ondas vão sem tombos
o convés em festa.
Iluminado.
CREPÚSCULO
Por que esta ânsia de sobreviver
assim se amoita no âmago de mim
sempre que as lerdas pálpebras da noite
baixam nas altas ramas com os morcegos?
Por que o poente assim me abala o eixo
e de fúnebre pompa alma me embrulha
tal qual mortalha um pouco prematura?
Por que me pesa suportar as trevas
que o implacável fim do dia instaura
quando já estagiei em precipícios
saltando trampolins perto de abismos?
Por que morrer me assusta e paralisa
se o que temo perder, de longe sei
nada tem de eldorado ou paraíso?
CANÇÃO TRÔPEGA
A vida não tem volta.
Sobra o séquito de sombras
e uma canção trôpega
atravessada no peito:
espada, rubra espada
cravada de mau jeito.
Aqueles rapazes esbeltos
ai, estrangularam-se
nas gravatas da rotina.
Ai, crucificaram-se
no lenho das doenças.
Aqueles rapazes tão belos
não fazem mais acrobacias
nem discursos inflamados
Arrastam chinelos e redes
ruminam silêncio amargo.
Um dia fui bela, filha,
digo a surpreendê-la.
Devo provar com retratos
o que tem ar de mentira.
METAMORFOSE
Ainda nos chamam
pelos mesmos nomes.
Acaso seremos os mesmos
ou é a cegueira alheia?
Éramos formosos
afortunados donos
de sesmarias de sonhos.
Tínhamos frescor de frondes
ímpetos de fontes e fogos
destemor de duelos, dúvidas
que não machucavam quase.
Éramos potros selvagens
farejando precipícios
pelas pastagens do mundo.
No curral ainda nos sobra
a noção do tesouro perdido
e essa ração de memória
é a esmola que nos cabe.
ÁUREOS TEMPOS
Áureos tempos aqueles
quando na manhãzinha goiaba
colhíamos no cerrado gabirobas
ainda vestidas de orvalho.
Pés e patas competiam no capim
pródigo de carrapichos.
Gestos elásticos ultra-rápidos
assustávamos insetos e aves.
Um séquito de suaves súditos
nos seguia em semi-adoração
nós, os príncipes daquele feudo.
Depois, o asfalto rasgou o campo.
Cogumelos de concreto brotaram.
Cresceram as crianças e a cidade.
Anãs ficaram as árvores aos pés
de edifícios colossais. Sumiram
pássaros gabirobas araçás.
Fim de passeios e piqueniques.
Só ficou a fome funda das frutas
no vão sem remissão das bocas .
CALAMIDADE
Águas na sala! Peixes nos quartos!
Quem entenderia?
Degredados das paisagens
contidos em urbanas grades
eles encharcavam
não só os chinelos de lama
a alma também de espanto.
Todos esquecidos
dos troncos derrubados
dos leitos rasos – antepassados
das chuvas dilúvio.
MORTE PORÁGUA
Da primeira vez
ninguém se deu conta do perigo.
Até a mãe sorriu pensando
como é dramática essa filha
e reviu-a sob um pé de acácias
desmaiada fingindo-se de morta.
Sorte que aos gritos de socorro
um anjo surgiu de entre as ramas
arrebatando-a ao umbigo do rio.
Da segunda vez
a muralha do mar desmoronou-se
mortalha sobre o vulto de sereia.
Mas rolava um tempo de amor cortês
e gestos de bravura. Sem demora
dois cavalheiros surgiram da areia
e cavalgando o dorso das ondas
venceram o monstro marinho
em vassalagem à jovem dama.
Da terceira e última vez
no peito sacudido por soluços
os olhos desataram cachoeiras.
Era a alma que morria embarcando
no esquife do filho rumo ao barro.
Dessa vez não escapou ao naufrágio.
Quando o corpo do fundo do poço
boiou, era cadáver ambulante
a alma decepada ao fio da dor.
(in Rasos d'água)
(Publicado em 01/02/2006)
ASTRID CABRAL LENDO POEMAS EM BRASILIA
Astrid Cabral apresentou-se no evento X BRASA organizado pelos brasilianistas no dia 23 de julho de 2010n em Brasília. Aqui apresentamos a poeta lendo "Água Doce", "O Boto e o Corpo" e "Fim da guerra". Duração: 2: 48 minutos, imagens tomadas por Juvenildo Barbosa Moreira.
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De
CABRAL, Astrid. Intramuros.
2ª edição revista pela autora. Manaus: Valer Editora, 2011.
114 p. N. 03 396
JOGO DE CASA
Sob telhas
centelhas fagulhas borralho
olhos-d'água água na talha
Sob telhas
galhos alhos coalhos
molhos repolhos toalhas
Sob telhas
agulhas retalhos
malhas fitilhos ilhoses
Sob telhas
rodilhas presilhas
palmilhas sapatilhas
Sob telhas
mulheres abelhas
colheres talheres
Sob telhas
parelhas filhos filhas
espelhos ilhas
Sob telhas
armadilhas navalhas
batalhas partilhas mortalhas
COMUNHÃO
Debulho feijões de corda
como quem debulha auroras.
As vagens entre meus dedos
outras falanges mais finas.
Terra sol chuvisco lua
no verde ambíguo distingo.
Sinto a seiva das neblinas
toco a saliva do orvalho.
Penso no abismo da queda
entre paisagem e panela.
Caninos trincando auroras
antecipo a comunhão.
De
CABRAL, Astrid. Palavra na Berlinda.
Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2011. 60 p ISBN 978-85-7823-076-0
Um livro dedicado à metapoesia, metapoemas da autora.
PARTO
O poema cresce
silente e sutil
resguardado em ventre
feito ser de carne.
Palpita discreto
na soturna entranha
de sonho ou vigília
o feto em enigma.
Até que maduro
lá do escuro aflora.
Mas sem reduzir
o mistério à luz.
PALAVRA
Passagem do abstrato
ao vicário real.
Ponte do invisível
ao audiovisual.
Parto da penumbra
ao raiar da aurora.
Paulo do fundo
à própria tona.
Palavra:
alma encarnada.
CABRAL, Astrid. Infância em franjas. Poemas de Astrid Cabral. Rio de Janeiro: editora KD, 2014. 64 p. ilus. 13x17,5 cm. Tiragem: 300 exs. Ex. col. Antonio Miranda
Na chuva
Nunca entendi
os guarda-chuvas.
Sombrinhas, sim
abrigavam do sol.
Se o chuveiro do céu
se abria, queria banho.
Corria atrás de maio
sabonete e pente.
Ávida penetrava
as frias cortinas d'água
rio em pé peneirando.
Fechava as pálpebras:
estrelas aterrissassem
falseando em minha face.
Até que voz antipática
me gritasse a ordem:
Já já pra dentro de casa!
Xixi em nossos pés
Era casa só de meninas
bonecas fitas linhas
agulhas vidros de cheiro
batons grampos espelhos.
O menino ficou ali
poucos dias e trouxe
bola estilingue peteca.
Nosso alvoroço pensar
no rabinho entre as pernas
que nem o cachorro Fly
e o macaco xerimbabo.
Foi no sossego da sesta
que ousamos fazer o cerco.
— Mostra a salsicha.
Não se fez de rogado
e começou a fazer xixi
respingando em nossos pés.
A surpresa da morte
Mal entrei em seu quarto
ele parou de respirar.
Dei as costas pensando
é o soninho da sesta
acabou de almoçar...
Logo depois a amiga
me abraçou aos prantos
Papai... papai—morreu...
Dizia haver escapado
a desastres acidentes
de trem avião e carro
naufrágios e incêndios.
(as cicatrizes no peito).
Mas partiria em surdina
dormindo de mansinho
no aconchego de seu leito.
Não imaginei que a morte
acontecimento tão grave
pudesse ocorrer suave.
Textos e gravuras extraídos da obra :
MÚLTIPLOS ERÓTICOS / GRAVURAS & TROVAS
álbum publicado em folhas soltas, em dezembro de 1997, na Tipografia da Gráfica Experimental do VIS – Instituto de Artes da Universidade de Brasília. Projeto gráfico e editorial de Alex Corjorian e Cíntia Falkenbach, composição e impressão tipográfica, em tipos Boldoni, por Osvaldo da mata. Edições da Civilização Arcaica Brasileira, 100 cópias. Exemplar gentilmente cedido por Zenilton de Jesús Gayoso Miranda, que participou da equipe de ilustradores.
CABRAL, Astrid. Coração à solta. Ilustração e design da capa: Mariana Felix. Maricá, RJ: Kadê, 2021. 68 p.
ISBN 978-85-52988-03-8 Ex. bibl. Antonio Miranda
Deserto doméstico
Moravam na mesma casa
mas em variados mundos.
Viviam ao mesmo tempo
mas em horários diversos.
Falavam a mesma língua
só que em registros distintos.
Amavam idênticos objetos
porém de modos opostos.
Em solidão se espelhavam.
Amor cacto
De nenhum trato
fruto do acaso
nasceu-lhe o amor cacto.
Embora sedento
suporta o estio
sem rega ou água do céu.
Tem paciência
de semente
desejo preso no peito.
A tudo desafia
e mesmo sem troca
tudo lhe brota.
Medra entre
a falta de esperança
a léguas do desespero.
Forte até a morte.
Inteiro.
A POESIA É PARA COMER: iguarias para corpo e para o espírito. Seleção de poemas Ana Vidal; coordenação editorial Renata Lima. São Paulo: Rabel, 2011. 252 p. 23,5x31,5 cm. Capa dura. Impresso em papel couchê matte 170 g/m2.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Boca
Boca
livre trânsito
de vocábulos e aves
fruições e frutos.
Boca
sede de gozo e poder
pombos lhe pousam
entre os dentes ávidos
pêssegos se imolam
cindindo-lhe os lábios
Boca
sítio de martírio
se a contragosto
de fome se fecha
ou em pânico se cala
atrás de uma mordaça.
*
Página ampliada e republicada em setembro de 2022
*
VEJA E LEIA outros poetas do RIO DE JANEIRO em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_de_janeiro/rio_de_janeiro.html
Página publicada em novembro de 2021
Poesia erótica
Página publicada em novembro de 2020
Veja também os vídeos no Youtube:
Poema “ÁGUA DOCE” - https://www.youtube.com/watch?v=aWX2jOa5JS4
Entrevista na TV Senado: https://www.youtube.com/watch?v=lu9nHdxr74I
Autora lê os seus poemas: https://www.youtube.com/watch?v=y5TVo65Ds4s
Poema “Água, fonte da vida”: https://www.youtube.com/watch?v=ElB5lE-tsP4
“A Senda e a alameda”, documentário: https://www.youtube.com/watch?v=FosqWBtSkmw
TEXTOS EN ESPAÑOL
El fuego
Junto urdimos la noche
mas su manto de tiniebla
cuando las paredes retroceden
en discretos horizontes
más allá de la cama y en un espacio
de altiplano rodamos
nuestros cuerpos bravíos
de animales sin collar
y juntos encendemos el día
en cascadas de luz
como las centellas que nosotros
seres primitivos forjamos
con la piedra quebrada
de los sexos vivos.
Lírico y lúbrico
Lírico y lúbrico
el amor brota lirios
y tritura pulpas frutales.
De luz centellea el encuentro
en que a fondo nos probamos
curvas de carne y bosques de pelo.
Más allá, arrancado el tiempo
rueda expulsado del cielo
que en el suelo conquistamos.
Y nos sentimos pájaros
donde plumas de nubes
sobre el dorso posaran.
Y nos probamos raíces
investigando a la tierra
en su secreto de barro.
Y prisioneros somos
entre próximos cristales
de estrellas y ríos.
Desastres de amor
Mujer tetera de loza
se deja agarrar por el asa
y vierte sudor y sangre
en cantidades exactas.
Di con la nariz
en la puerta de tu corazón.
Fue sangría desatándose
y la puerta de primeros auxilios
también encontré cerrada.
Le dije a mi corazón:
Tranquilo pues todo pasa.
La nada no es perdición
sino un estado de gracia.
Desde que el mundo es mundo
el destino:
el amor, centella
que hace el incendio
y la ceniza.
Poemas extraídos de ALFORJA – REVISTA DE POESÍA, México, n. XIX invierno 2001, de una edición dedicada al Brasil, con selección de Floriano Martins.
Poesia erótica
CABRAL, Astrid. Ante-sala. Rio de Janeiro: Bem-Te-Vi, 2007. 89 p.
ANTE-SALA
Este o mundo
de mistérios
refratários
a microscópios.
Este o mundo
de muralhas
inexpugnáveis
a máquinas.
Aqui a noite
opaca e parca
de estrelas.
Aqui os olhos
embrulhados
em dobras e sombras.
Esta a ante-sala:
áspera espera
de outra era.
GRADES
Assim, embalando a linda
ilusão da liberdade
foges, corres e te evades.
Rejeitas o chão dos montes
que te atrapalha a passagem.
Queres o longe horizonte
onde terra e céu se casem.
As asas do sonho aos ombros
vais da cidade em cidade
casa em casa, loja em loja.
Quebras ferrolhos e portas.
Rompes cadeados e chaves.
Inútil qualquer esforço.
Nunca te sentirás livre.
Vê: por toda parte há grades.
CABRAL, Astrid. CAGE. Bilingual Portauguese-English. Translated from the Portuguese by Alexis Levitin. New York, NY: Host Publication, Inc. 2008. 91 p. ISBN:
978-0-924047-44-2. Ex. doado por ALEX COJORIAN
TRES CAVALOS MARINHOS
Nódoas, mágoas
vossa persistência
que água lava?
Caroços, remorsos
vossas arestas
que fogo cresta?
Medos, pesadelos
que alavanca
no ar vos levanta?
THREE SEAHORSES
Stains, pains,
can any water wash away
your stubbornness?
Prickly pits, regrets
what fire frets away
your edge?
Fears, nightmares
what lever lifts
you lightly in the air?
CABRAL, Astrid. De déu em déu: poemas reunidos. 1979- 1994. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998. 424 p.
ISBN 85-7388-081-3. Ex. doado por ALEX COJORIAN
O FOGO
Juntos urdimos a noite
mais seu manto de trevas
quando as paredes recuam
discretas em horizontes
de além-cama e num espaço
de altiplano rolamos
nossos corpos bravios
de animais sem coleira
e juntos acendemos o dia
em cachoeiras de luz
com as centelhas que nós
seres primitivos forjamos
com a pedra lascada
dos sexos vivos.
MODO DE AMAR
Amor como tremor de terra
abalando montanhas e minérios
nas entranhas da minha carne.
Amor como relâmpagos e sóis
inaugurando auroras
ou ateando faíscas e incêndios
nas trevas da minha noite.
Amor como açudes sangrando
ou caudais e tempestades
despencando dilúvios.
E não me falem de ruínas
nem de cinzas, nem de lama.
CABRAL, Astrid. Rês desgarrada. Poemas (1986-1990). Capa: Mariana Félix. Apresentação: José Santiago Naud. Brasília: Thesaurus, 1994. 79 p.
Ex. biblioteca de ANTONIO MIRANDA
VOZ NO EXÍLIO
Saudade de paisagem
com palmeira vasculhando o céu
Vento rasgando bananeira
papagaios de papel
no anil entornado da tarde.
Meu país,
o lirismo não me deixe cega,
oh terra que me faz feliz/infeliz
tão farta que estou
de tantos falsos aristocratas
e mendigos tão reais.
Meu país,
a saudade onde vivo dividida
entre paixões e compaixões.
Oh terrível gangorra
de orgulho e vergonha!
ANTICANÇÃO DO EXÍLIO
Se fosse pela razão
não voltava não.
Mas é que sou movida
a gás de emoção.
Aqui o trabalho vale.
A mão poderosa toca
a rica realidade.
Lá, vive-se de projetos:
A mão impotente
não alcança os objetos.
Se fosse pela razão
não voltava não.
Mas é que sou movida
a gás de emoção.
*
TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducción de Cecilia Pavón
TEXTO EN ESPAÑOL
VARGAS & MIRANDA Compiladores. Selección y revisión de textos por Salomão Sousa. TRANS BRASILIANA ANTOLOGÍA 36 MUJERES POETAS DO BRASIL. MARIBELINA – Casa del Poeta Peruano. 2012 134 p. Ex. biblioteca de Antonio Miranda
El fuego
Junto urdimos la noche
mas su manto de tiniebla
cuando las paredes retroceden
en discretos horizontes
más allá de la cama y en un espacio
de altiplano rodamos
nuestros cuerpos bravíos
de animales sin collar
y juntos encendemos el día
en cascadas de luz
como las centellas que nosotros
seres primitivos forjamos
con la piedra quebrada
de los sexos vivos.
LÍRICO E LÚBRICO
Lírico y lúbrico
el amor brota lirios
y tritura pulpas frutales.
De luz centellea el encuentro
en que a fondo nos probamos
curvas de carne y bosques de pelo.
Más allá, arrancado el tiempo
rueda expulsado del cielo
que en el suelo conquistamos.
Y nos sentimos pájaros
donde plumas de nubes
sobre el dorso posaran.
Y nos probamos raíces
investigando a la tierra
en su secreto de barro.
Y prisioneros somos
entre próximos cristales
de estrellas y ríos.
DESASTRES DE AMOR
Mujer tetera de loza
se deja agarrar por el asa
y vierte sudor y sangre
en cantidades exactas.
Di con la nariz
en la puerta de tu corazón.
Fue sangría desatándose
y la puerta de primeros auxilios
también encontré cerrada.
Le dije a mi corazón:
Tranquilo pues todo pasa.
a nada no es perdición
sino un estado de gracia.
Desde que el mundo es mundo
el destino:
el amor, centella
que hace el incendio
y la ceniza.
LA BUENA DICHA EN EL LARGO
DO MACHADO
(Versión de Helena Ferreira)
¡Apartais de ese entorno,
oh multicolores gitanas!
(cual un figa* tengo cerradas las manos
Conozco de sobra el pasado
el futuro resulta fácil prever
De nada me sirven los detalles
a que podéis añadir.
Hecho trenzas inútiles son
anos, pulseras, collares.
Todo que a mí me importa
es la voluptuosidad de la hora
que pasa de prisa y corriendo
bajo el milagro de la mirada.
Se abre la tarde
con demasiada luz provisional
bañándome el cuerpo y el alma.
¡Proprietaria de la tierra soy
mientras dure la fiesta!
*De origen latino (Picus) es el más antiguo amuleto
contra el mal de ojo en forma de mano cerrada, en
que el dedo pulgar está entre el índice y el medio.
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Página ampliada em julho de 2024.
Página ampliada e republicada em fevereiro de 2024.
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