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A revista COYOTE ocupa hoje um espaço notável e elogiável no (cada vez mais reduzido) mercado hemerográfico da cultura no Brasil, no momento em que surgem, crescem e fenecem as revistas eletrônicas e digitais. O mais admirável é que tem um padrão de excelência de conteúdo e de editoração gráfica, realmente sobressalente em nossa atualidade, com a surpresa de ser publicada numa cidade do interior (Londrina), ou seja, fora do eixo Rio- São Paulo e longe das grandes capitais estaduais.
Em que se hasteia o sucesso da revista? Em sua equipe jovem e de circulação/relacionamento com os centros culturais — notadamente do Centro-Sul — que apóia e colabora com textos e imagens, e também na independência de sua equipe editorial.
Não é uma revista de poesia mas dedica considerável espaço aos poetas nacionais e aos estrangeiros traduzidos, entre ensaios, artigos, ficção e trabalhos de fotógrafos de mérito. Sem dúvida, uma combinação adequada e sustentável.
Recebemos dos editores as duas últimas edições — VERÃO e INVERNO 2010 — que vamos resenhar e revelar, é obvio, apenas o que nos oferece de poesia. Tem a revista alguma orientação estética? Embora procure ser eclética, parece dar preferência aos jovens autores brasileiros das novas gerações, com algum destaque para os paranaenses, geralmente pós-concretistas, da fase da poesia de invenção, neobarroca, que experimentam novas linguagens. Ótimo. Alguns certamente serão mais frequentes que outros, o que é comum e ajuda a marcar a imagem e o círculo de atuação da revista. Os autores estrangeiros, a julgar pelos números mais recentes, também os que praticam buscas mais alternativas, desde os beatniks aos marginais, neobarrocos e experimentalistas que escaparam do verbivocovisual. Ótimo. A revista em um foco, uma linha estética, ampla e não ortodoxa.
Em matérias separadas, vamos dar uma amostra do que estão publicando. Alguns poemas ou fragmentos apenas. Quem quiser — e deve!!! — ler tudo o que estampam, deve ir às livrarias ou fazer o pedido através da editora e distribuidora ILUMINURAS: www.iluminuras.com.br. A revista é patrocinada pelo Programa Municipal de Incentivo à Cultura de Londrina, que acertadamente possibilita a projeção da cidade e de seus jovens promotores culturais em nível nacional e internacional. Um exemplo digno de registro.
LEOPOLDO MARÍA PANERO
"Existe na tradição literária um grupo de poetas que se centra no feio, no grotesco e no escândalo, concebendo o poema como algo repulsivo e infernal (Beaudelaire, Lautréamont, Trakl) e o ato poético como uma expressão alquímica e ocultista (Rimbaud, Nerval). Um verdadeiro mergulho nos abismos da existência, como já apontado por Henri Michaux. / Leopoldo María Panero se aproxima desta plêiade de trovadores que há tempos assombram o universo literário com suas vozes escatológicas e revolucionárias, subvertendo todas as normas de decoro e bom gosto — revelando as sombras e tabus de uma sociedade doente. Panero optou pela longa travessia pelos "bosques da loucura", escolha que lhe custou um alto preço: o cárcere e a incompreensão. / Anarquista, pederasta, satanista, bêbado, vagabundo e louco. Muitos são os adjetivos para definir o poeta espanhol. De uma forma ou de outra, todos os seus escritos são autobiográficos" (...) VINICIUS LIMA
REGALO DE UN HOMBRE
Esta tarde, a las 7,
brillará mi cadáver
de una luz más
pura: y una mano
lo tocará desde el poema.
Al rito de morir se le llama la vida
y Dios se esconde entre mis muslos
y mis padres piden perdón por haberme entregado
desnudo a los hombres en la oscura llanura.
PRESENTE DE UM HOMEM
Esta tarde, às 7,
brilhará meu cadáver
de uma luz mais pura: e uma mão
o tocará do poema.
Ao rito de morrer chama-se vida
e Deus se esconde entre minhas coxas
e meus pais pedem perdão por terem me entregue
nu aos homens na escura planície.
POBRECITO
He aquí las ratas que molestn a las ratas
en el inmenso albañal que se llama vida.
Salir de la cloaca es sólo un artificio
es nuestro destino vivir entre las ratas.
POBREZINHO
Eis aqui os ratos que incomodam os ratos
no imenso esgoto que se chama vida.
Sair do bueiro é só um artifício
é nosso destino viver entre os ratos.
NECROFILIA (prosa)
El acto del amor es lo más parecido
a un asesinato.
En la cama, en su terror gozoso, se trata de borrar
el alma del que está,
hombre o mujer,
debajo.
Por eso no miramos.
Eyacular es ensuciar el cuerpo
y penetrar es humillar con la
verga la
erección de otro yo.
Borrar o ser borrados, tanda da, pero
en un instante, irse
dejarlo
una vez más
entre sus labios.
NECROFILIA (prosa)
O ato de amor é o mais parecido
com um assassinato.
Na cama, em seu terror gozoso, trata-se de apagar
a alma do que está,
homem ou mulher,
debaixo.
Por isso não nos olhamos.
Ejacular é sujar o corpo
e penetrar é humilhar com a
verga a
ereção de outro eu.
Apagar ou ser apagado, tanto faz, mas
num instante, ir-se
abandoná-lo
uma vez mais
entre seus lábios.
Veja mais poemas >> de Leopoldo María Panero aqui na seção de POESÍA ESPAÑOLA de nosso PORTAL DE POESIA IBEROAMERICANA...
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MARIO DOMINGUES
O verde de verdade
deve ser o verde
da samambaia
contra o sol do meio-dia
não se parece com nada
só transparece
o verde de ver
o ver de verdade.
Nos olhos do lince
o alcance do alce.
Num relance,
o alvo se alvoroça:
sem lança nem flecha,
o lince abre uma brecha.
Espreita, inspira,
expira, grave:
cansado, alcançado,
o alce amansa.
Aurora: obra arbórea
expande seus galhos
pela abóbada rosa
— sua copa de éter —
espalha das ramas dos
galhos
tramas de luz
— tecido finíssimo —
e se espraia pelas linhas
que tocam a noite
dos teus cabelos
com a seiva do sol
até a raiz.
VEJA MAIS POEMAS DE >>> MARIO DOMINGUES NO NOSSO PORTAL»>
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WILSON BUENO
(1949-2010)
LUIZ CARLOS PINTO BUENO relata a trágica morte de seu primo Wilson, assassinada a golpe de faca na cadeira de trabalho. (Mais detalhes na revista COYOTE). E inclui 12 poemas de uma suposta série de 35 Poemas de Amor.
6
Antes de tudo, o começo
Eva, fenda, pássara obscura,
Os teus sexos de menina, Amor
De mulher cinge a curva dos seios
Gozo e glosa, chana e chan.
Chama ao relento a lágrima nua
Esquece nos ombros lentos lábios e dentes
Ao relento de si os caminhos do umbigo
Coxas e clitóris, pêlo contra pêlo
Amor, de tão cortês, é um algodoal de líquens
E plana, suspenso, entre o sonho e o sonho.
21
Ao grande amor, a luz
Do Amor imenso, sem trégua
Puro Espírito todo brotado de flores
Nem a sombra de Agosto capaz destrua
Do grande Amor a ternura, o gume, o azougue.
Anda o Ser à busca tanta
Do grande Amor as suas quinas
Amor de âmbar, irresistível pedra
Grudada de conchas e de limo.
Do grande Amor, o rasgo da epifania,
O raso onde Amor Demais definha.
Leia mais poemas >> de Wilson Bueno em nossa seção Brasil de nosso Portal de Poesia Iberoamericana.
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IVAN JUSTEN SANTANA
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FANTASMA CIVIL. XX Bienal Internacional de Curitiba 2013. Organização Ricardo Corona. Curitiba, PR: Fundação Cultural de Curitiba, 2013. 43 cartões com imagens aéreas de Curitiba e, no reverso, versos de poetas paranaenses. Projeto gráfico Medusa. Obra inconsútil. ISBN 978-85-64029-08-8 Inclui os poetas: Josely Vianna Batista, Lindsey R. Lagni, Ademir Demarchi, Luci Collin, Fernando José Karl, Roberto Prado, Sabrina Lopes, Bruno Costa, Amarildo Anzolin, Carlos Careqa, Roosevelt Rocha, Camila Vardarac, Marcelo Sandmann, Vanessa C. Rodrigues, Anisio Homem, Greta Benitez, Ivan Justen Santana, Mario Domingues, Marcos Prado, Bianca Lafroy, Estrela Ruiz Leminski, Sérgio Viralobos, Alexandre França, Helena Kolody, Wilson Bueno, Paulo Leminski, Alice Ruiz, Zeca Corrêa Leite, Édson De Vulcanis, Afonso José Afonso, Homero Gomes, Leonardo Glück, Hamilton Faria, Emerson Pereti, Andréia Carvalho, Ricardo Pedrosa Alves, Priscila Merizzio, Marcelo De Angelis, Adalberto Müller, Cristiane Bouger.
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INSTRUÇÕES PARA MORRER BEM NO ELEVADOR
(em parceria com marcos Prado)
Quando abrir a porta tenha certeza
de que o elevador está ali mesmo.
Será precipitado um passo a esmo
e morrer bem requer mais sutileza.
Entre sabendo o plano de cabeça.
Chame qualquer andar além do décimo.
O cabo de aço deve estar em péssimo
estado, rangendo bem. Não esqueça
que você é feito de água, carne e osso.
Em queda livre, mesmo que a massa erre o
peso máximo, cai igual a um trõço.
Não tenha medo de que o impacto ferre-o:
não há nenhum andar além do poço:
co´a mola você volta alegre ao térreo.
E A RIMA SUMIU
ela entrou pela janela do banheiro
sei lá se já era janeiro
talvez fosse quase dezembro
essa rima é óbvio que não lembro
ela veio fugindo da métrica
sua velha madrasta frígida e tétrica
vestida de pânico que viu na rua
aquela era uma rima a meu ver nua
eu todo estupefato e ela logo ali
de fato no ato não a reconheci
apesar dos dois bicos dos seios duros
a rima não tirou os óculos escuros
no que fui agarrar senti só o vazio
e em vez de sumir ela desapareceu
=============================================== Página publicada em novembro de 2010 |