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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 

ALEXANDRE ARTIGAS

 

É formado em Letras pela Universidade Federal do Paraná. Publicou, em 2004. pela editora 7 Letras, o livro de poesia Fio.

 

Extraído de

 

POESIA SEMPRE.  Ano 13. Número 20. Março 2005. Revista trimestral de poesia.  Editor Luciano Trigo.   Rio de Janeiro, RJ: Fundação Biblioteca Nacional, 2005.  Ilus.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Fragmentos do jardim

I

O peso da pétala me esmaga as mãos.
Como tal sensação ante o milagre?
Dispenso as metafísicas e tento apenas fatos.
De parte em parte banha de cores
[os olhos meus.
E divide com as coisas o espaço da visão.
Uma pétala sem flor, tal lágrima sem olhos.
Tentei tocá-la e tive nas mãos a esmagadora
presença da perfeição.
Restituir às coisas seu estado primeiro,
sem divagação ante um estranhamento
[do mundo.
Crer no mundo como é, e saborear
[com os olhos
o lapso da pétala, flutuar entre os ares
como borboleta vegetal

 

II

 

Um espinho que fura os dedos.

Como é possível a dor e a beleza

num só ser, rosa que me leva longe

sem o artefato da asa visível.

Caio aqui de joelhos e trafego com os olhos

a dor imprecisa do toque potencial.

Ao espinho apenas os olhos, que doem.

Ah, acatar a natureza sem tornar

o possível um ato de fé.

Desmaio das ideias, oro pela saída ilesa

dos labirintos a que me levaram os olhos.

A pétala é tão pesada quanto o espinho,

folha modificada a trançar o ninho

 

Agora escapo... sim, agora escapo.

Como amante que se despede sem saída,

minha agonia é transformada em pó.

Pó dos ossos de pétalas e espinhos

que se decompõem na lembrança.

Foi alto o voo a que me levaram as imagens.

Mas pousei no campo verde e rosa

das rosas que já não me levam.

Corro pelo jardim e tropeço e caio

                                       [e me levanto,

com pés firmes ao chão.

Minha cabeça respira longe das nuvens

e toco a flor que me toca pela mão.

Flerto na música com os dedos acariciados

e me beijo com a sensação dos lábios

da fresca respiração das rosas que transpiro.

 

 

Encontros

 

Quando a garrafa está vazia
e a água chove na janela,
encontrar o vidro e como
soletrar o amor por trás
do corpo de cristal.

 

Quando a panela está cheia
e o estômago ronca,
sentar-se à mesa é como
o anteparo para o peso
de um garfo vazio.

 

Quando a letra veicula sons
e o carro passa sob a placa,
lê-las é como ouvir
o rugido de um leão
num cano de escape.

 

E quando nada mais faz sentido
e buscamos nos detalhes o encontro,
sair pelas ruas com a barriga
cheia após uma tarde chuvosa
de muito amor me basta.

 

 

Página publicada em julho de 2018


 

 

 
 
 
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