AMARILIO DE ALBUQUERQUE
Nasceu na cidade de Areia, a 11 de fevereiro de 1902. Formou-se em direito pela Faculdade do Rio de Janeiro. Jornalista e crítico de arte. Publicou os seguintes livros: "Pequena Biografia dos grandes compo¬sitores", "Dedo Mendinho", "História de Papai Noel" e "História do Hino Nacional".
PINTO, Luiz. Coletânea de poetas paraibanos. Rio de Janeiro: Ed. Minerva, 1953. 155 p. 16.5 x 24 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
ANÔNIMA
Andas perdida em minha fantasia
Sem destino e sem rumo, como eu.
Fruto de alguns pedaços de estesia,
Desta tristeza que me comoveu.
E quanto mais eu penso, à hora tardia,
Num sonho que de enganos me envolveu,
Sinto que me acompanhas Neste dia,
Para deixá-lo, após, como nasceu...
Quem és tú? De onde vens inconformada?
Como um corpo vazia de estrutura,
Ao retirar as emoções do nada!
És o Bem? És o Mal deste Universo?
Onde encontrar-te a forma exata e pura
Para a inscrição serena do meu verso?
PREGOEIRO DE SONHOS
La vem o meu Irmão, triste e sozinho,
Com o seu olhar doente, ensimesmado...
Já não percebe a esteira do caminho
Nem vê passar a multidão ao lado.
E por senti-lo assim, sonambulesco,
Sem saber ao que vem por esta vida,
Eu bem percebo o drama romanesco,
Que ele conduz sem palcos, na descida...
Traz o cabelo sempre em desalinho,
Semelhando uma imagem dolorida,
Que o destino largou pelo caminho
Cheio de escolhos da enganosa vida.
Não deseja levar pelos seus braços
O pouco que esta vida nos concede.
Quer apenas vagar pelos espaços,
Etéreas regiões de onde procede...
E quando colhe uma palavra amiga
Para compor o seu festim de sonhos,
Rende graças a Deus que assim o abriga
Na mansão dos humildes e tristonhos!
Não procura saber se a terra dorme
Na estrutura astronômica dos astros;
Quer apenas deixar de ser conforme
A' perfeição simétrica dos mastros.
Ninguém sabe que espécie de destino
Carrega o meu Irmão triste e plebeu...
Pregoeiro do Sonho em desatino...
Só quem conhece o meu Irmão sou eu!
CANTO DA REDENÇÃO
Eu quisera ser bom, como a água das fontes,
Como as árvores que dão seus frutos a fartar.
Ser bom, para transpor, tranquilo, os horizontes.
E por eles medir a vastidão do mar.
Eu quisera ser bom, como a luz das estrelas.
E as constelações perdidas pelo espaço.
Poetizando a vida só em percebe-las
Através da visão, como num longo abraço.
Eu quisera ser bom, como a alma de um santo,
Que une a vida através da beleza da prece.
E poder ascender, com a escada do meu pranto,
Ao cimo da montanha que ninguém conhece.
Eu quisera ser bom, como a chuva caindo
Na terra ressequida e exausta de esperar
O milagre e a água, que a seiva irá nutrindo,
Para que as árvores possam, então, frutificar.
Eu quisera ser bom, como as nuvens passando
Em brancas revoadas de algodão, pelo ar.
Para que a terra venha a ter, de quando em quando
A certeza de que o inverno está para chegar.
Eu quisera ser bom e dar o que percebo
Do pouco que esta vida tem para me dar.
E sentir que, ainda assim, consolações recebo
Na festa da existência a dádiva sobrar.
Ser bom, para sentir a alma reflorida,
Sabendo que a existência longa que passou,
Nunca deixou a alguém a maldição da vida.
Eu quisera ser bom, meu Deus, por que não sou?
Página publicada em julho de 2019
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