ÉDER RODRIGUES
Éder Rodrigues é poeta, ficcionista, dramaturgo e também escreve para o teatro. Recebeu o Prémio SESC de Literatura como poeta pela obra Maré de redemoinhos (2010) e pela obra infantil A arte de empinar pipas (2008). Sua obra tem sido publicada em coletâneas, antologias e periódicos no Brasil e no exterior. Mestre em Literatura pela Universidade Federal de Minas Gerais, possui graduação em Artes Cénicas por essa mesma instituição. Seu trabalho abrange tanto o teatro quanto a literatura contemporânea. Foi indicado ao Prémio do Sindicato dos Artistas e Técnicos de Artes Cénicas pela dramaturgia do espetáculo A Pequenina América e sua avó $ifrada de escrúpulos (2010). Na bagagem, tem prémios importantes do cenário nacional, como o Prémio Josué Guimarães de Literatura, como contista, em 2009, e internacionalmente, como Autor Revelação em Língua Portuguesa, em Lisboa (2006).
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- PRÊMIO SESC DE POESIA CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE. COLETÂNEA DE POESIA – EDIÇÃO 2011 . Brasília> Serviço Social do Comércio, 2011. 116 p. ilus. Ilustrado com fotos dos autores premiados. Jurados do prêmio: Danilo Carlos Gomes, Nicholas Behr, Salomão Sousa, Sylvia Cyntrão, João Bosco Bezerra Bonfim Sérgio de Sá e Antonio Miranda. Col. AM.
Eternamente Manoel
"Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água
que corre entre pedras: Uberdade caça jeito."
Manoel de Barros
-I-
Pela paz que as ígnorãças poemam,
colo um a um dos estilhaços
que sequer vão conformar meu reflexo
em estatura de barro ou vertigem de espelhos.
Venho de lugar nenhum
depois de tanta lembrança enterrada em ritos de pedra-sabão.
Não passei a vida tentando me desvendar,
a mercê dos tantos eus que a solidão coleciona.
- II -
Fiel aos passos que o corpo fraqueja
Sigo quando o olho umedece por dentro a pertura do mar.
Não guardo sensações num pote de conservas
Trago comigo só uma bússola quebrada,
com nortes incertos e nenhum pertence.
Demora, mas a vida se rende às dádivas do não chegar.
- III -
Sei pouco de lugar, raiz, pertencimento.
Meu coração foi criado no peito mesmo,
longe da didática dos rumos.
Meu desejo não pega carona.
Costuma ir a pé quando avista o interior das coisas.
Só mergulha quando se afrouxa o insuportável das vestes.
-IV-
Já me livrei dos lemas,
não engarrafo poemas e só furto poentes.
Sei que construíram deus de cimento e areia,
ainda que desabe cada milímetro concreto
frente às dúvidas de quando o que se avermelha
em existência é o fundo das gentes
e não a altura dos santuários.
-V-
0 que insinuam como corpo, eu peco como estrada.
Parto sem nenhuma pressa
Sem carecer de uma identidade fixa
para justificar os girassóis que deixo como metade.
Pauso o movimento perpétuo da máquina do mundo
com o piar sucessivo dos pardais
que ressuscitam a orgia
no escondido dos laranjais.
- VI -
Há tempos deixei as escrituras
A estrutura do teto pelas chuvas de agosto
A terra em si que nunca me arranhou posses.
Sepultarei meus mortos no fundo do mar
onde mora um piano inventado que serve
de companhia quando a dor pesa séculos por dentro
aquém às superfícies.
-VII-
Se o amor ficou fora de época
Desafio a moda lendo as linhas do corpo todo
e ainda dou aula de caligrafia para
umedecer a sutileza das cartas e o mistério da palavra.
Desculpa se meus certificados não tiveram parede
Se os bichos que estimo largo soltos ao léu
Esquecimento faz parte do mundo
e na encruzilhadas dos corpos,
perde quem não se trilha pelos quatro cantos
onde os trens brincam de eternidade.
- VIII -
Despedida não faz parte de mim
Carrego no bolso retratinho de mãe
Saudade eu curo com chá,
mas quando deito fedendo laranja
é o colo dela que imagino para dormir.
Vim só para pedir tua benção Manoel
Ainda não encontrei aquele velho navio
Mas a arte já me ensinou.
a atravessar o mar dentro de um barco de papel.
Página publicada em março de 2013
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