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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


HUMBERTO DE CAMPOS

(1886 – 1934)

 

 

Humberto de Campos Veras nasceu em Miritiba, hoje Humberto de Campos, Estado do Maranhão. Deixou obra extensa e variada, incluindo crônicas e contos humorísticos, além de sonetos refinados, que o tornaram um dos autores mais populares em sua época. Aprendiz de tipógrafo e depois escriturário, iniciou-se (1908) no jornalismo em Belém do Pará, e chegou a diretor de A Província do Pará. Fatores políticos forçaram-no a mudar-se (1912) para o Rio de Janeiro, RJ, onde passou a trabalhar como redator de O Imparcial. A longa série de seus livros de prosa iniciou-se com Da seara de Booz (1918). Publicou depois, entre outros, A serpente de bronze (1921), A bacia de Pilatos (1924), O monstro e outros contos (1932) e Poesias completas (1933). Eleito membro da Academia Brasileira de Letras (1920), também foi eleito deputado federal pelo Maranhão (1927), mas teve o mandato interrompido pela revolução (1930). Suas Memórias (1933) são apontadas como seu livro mais importante. Morreu no Rio de Janeiro, RJ, e seu Diário secreto, publicado postumamente (1954), causou escândalo.

 

Fonte: http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_2186.html

 

Tido e elogiado como um prosador admirável, a fase poética de Humberto de Campos, no começo de sua carreira (1904-1915), quando publicou os dois volumes

De Poeira, enquadra-se numa fase de transição, a que alguns chamam de neoparnasiana, mas sem uma característica definida. Certo, o homem de sensibilidade que também sabia fazer versos, como alguns de seus contemporâneos.”  ASSIS BRASIL

 

 

BEATRIZ

 

Bandeirante a sonhar com pedrarias

Com tesouros e minas fabulosas,

Do amor entrei, por ínvias e sombrias

Estradas, as florestas tenebrosas.

 

Tive sonhos de louco, à Fernão Dias...

Vi tesouros sem conta: entre as umbrosas

Selvas, o outro encontrei, e o ônix, e as frias

Turquesas, e esmeraldas luminosas...

 

E por eles passei. Vivi sete anos

Na floresta sem fim. Senti ressábios

De amarguras, de dor, de desenganos.

 

Mas voltei, afinal, vencendo escolhos,

Com o rubi palpitante dos seus lábios

E os dois grandes topázios dos seus olhos!

 

 

 MIRITIBA

 

É o que me lembra: uma soturna vila

olhando um rio sem vapor nem ponte;

Na água salobra, a canoada em fila...

Grandes redes ao sol, mangais defronte...

 

De um lado e de outro, fecha-se o horizonte...

Duas ruas somente... a água tranqüila...

Botos no prea-mar... A igreja... A fonte

E as grandes dunas claras onde o sol cintila.

 

Eu, com seis anos, não reflito, ou penso.

Põem-me no barco mais veleiro, e, a bordo,

Minha mãe, pela noite, agita um lenço...

 

Ao vir do sol, a água do mar se alteia.

Range o mastro... Depois... só me recordo

Deste doido lutar por terra alheia!

 

 

POEIRA...

 

Poeira leve, a vibrar as moléculas: poeira

Que um pobre sonhador, à luz da Arte, risonho,

Busca fazer faiscar: pó, que se ergue à carreira

Do Mazepa do Amor pela estepe do Sonho.

 

Para ver-te subir, voar da crosta rasteira

Da terra, a trabalhar, todas as forças ponho:

E a seguir teu destino, enlevada, a alma inteira

O teu ciclo fará, seja suave ou tristonho.

 

Não irás, com certeza, alto ou distante. O insano

Pó não és que, a turvar o céu claro da Itália,

Traz o vento, a bramir, do Deserto africano:

 

Que és o humílimo pó duma estrada sem povo,

Que, pisado uma vez, pelo ambiente se espalha,

Sente um raio de Sol, cai na terra de novo.

 

 

DOR

 

Há de ser uma estrada de amarguras

a tua vida. E andá-la-ás sozinho,

vendo sempre fugir o que procuras

disse-me um dia um pálido advinho.

 

 

No entanto, sempre hás de cantar venturas

que jamais encontraste... O teu caminho,

dirás que é cheio de alegrias puras,

de horas boas, de beijos, de carinho..."

 

 

E assim tem sido... Escondo os meus lamentos:

É meu destino suportar sorrindo

as desventuras e os padecimentos.

 

 

E no mundo hei de andar, neste desgosto,

a mentir ao meu íntimo, cobrindo

os sinais destas lágrimas no rosto!

 

 

LENDO-TE

 

“As roseiras aqui já estão florindo...”

Mandas dizer... “As híspidas e pretas

Rochas da estrada já se estão cobrindo

De musgo verde...  Há muitas borboletas...”

 

E eu fico a pensar que agora é o lindo

Mês das rosas esplêndidas e inquietas

Asas: mês em que a serra anda sorrindo,

E em que todos os pássaros são poetas.

 

Vejo tudo: a água canta entre os cafeerios.

Vejo o crespo crisântemo e a açucena

Estrelando a verdura dos canteiros.

 

Penso, então, que em tudo isto os olhos pousas...

E começo a chorar... Olha: tem pena,

não me escrevas falando nessas cousas!...

 

 

SÍMBOLO

 

Meu amor! meu amor! voltaste ainda

A povoar os meus sonhos! Que forte elo

É este afeto, este céu de altura infinda,

Que eu de rimas e lágrimas estrelo?!

 

Sonho. É aí onde estás: A tarde finda...

Perto — a angústia; distante — tudo é belo:

Muito ao longe — a ala serra muito linda;

Junto a nós — o sertão muito amarelo...

 

“Olha (disseste), é um símbolo terrível:

A nossos pés, com o seu tormento, os ermos;

E olha a serra: é a Ventura inacessível...”

 

E acordei, a sentir estas saudades...

Que fizemos aos céus, para sofrermos

Tão longa série de infelicidades?...

 

 

 

Versos de Humberto de Campos em cartão impresso por Edson Guedes de Moraes

(Editora Guararapes)

CAMPOS, Humberto dePoesias completas  1903-1931.  São Paulo: W. M. Jackson, Inc., Editores, 1954.  355 p.  N. 09

 

         NIRVANA

         Viver assim: sem ciúmes, sem saudades,
         Sem amor, sem anseios, sem carinhos,
         Livre de angústias e felicidades,
         Deixando pelo chão rosas e espinhos;

         Poder viver em todas as idades;
         Poder andar por todos os caminhos;
         Indiferente ao bem e às falsidades,
         Confundindo chacais e passarinhos;

         Passear pela terra, e achar tristonho
         Tudo que em torno se vê, nela espalhado:
         A vida olhar como através de um sonhos;

         Chegar onde eu cheguei, subir à altura
         Onde agora me encontro — é ter chegado
         Aos extremos da Paz e da Ventura!
         santos iam, no recolhimento
         Dos desertos, levar, terras em fora,
         Sob o nome de Deus, todo alimento:

         — Meiga rôla amorosa, ave que o vento
         Da candura protege! — entre sonora
         Legião de ânsias, ouvindo o meu lamento,
         Nesta fome de amor, me vens agora!

         Para mim, és a irmã da ave bendita
         Que em Siôpa descia à terra infanda
         A alimentar um mísero eremita:

         Que eu, se te vejo, sôfrego, diviso
         O alimento vital, que o céu manda
         Nos teus olhares e no teu sorriso!...

 

         ALMA SERTANEJA

         Floresta espessa e secular: Bravias
         Trepadeiras subindo; e o bando feio
         De aves de agouro; e insetos, pelo meio
         Das selvagens e largas ramarias.

         Desbravá-la, aclará-la, embalde veio
         O braço humano: trabalhando dias
         E dias, ninguém pôde, entre as sombrias
         Ramas, fazer o sol descer em cheio.

         E ficou como dantes, sob o etéreo
         Pálio imenso do céu: ébria de um rudo
         Rumorejo longínquo, e de mistério.

         Mas, serena, a ser sempre o que antes fora,
         Continua espalhando sobre tudo
         A generosa sombra protetora...

 

         SUB STGMINE...

         Tu, que, à sombra desta árvore, te dizes
         Ébrio de angústia e pálido de fome,
         Fica a meu lado, assenta-se à raízes,
         A mão levanta para um fruto, e come.

         Pensas tu, por acaso, que os felizes
         São esses que, sem ninguém que os dome,
         Vão disputar-se os pérfidos matizes
         Do pomo da Riqueza e do Renome?

         Sê forte e justo, com bondade. Arrima
         Quem buscar socorro; e o teu trabalho
         Seja, em baixo, amparar quem cai de cima.

         Olha a fronde: é dos ventos sacudida...
         E o melhor fruto nunca está no galho
         Mais balouçante da Árvore da Vida!...

 

         RESSURREIÇÃO

         Bendito o coração que não esquece
         A inédita emoção do amor primeiro,
         E a quem ela, no instante derradeiro,
         Numa benção, de súbito, aparece!

         Abençoada seja, em toda prece,
         A árvore que, na asperidão do outeiro,
         Na áurea colheita do pomar inteiro,
         Recorda o fruto da primeira messe!

         Bendita seja, e, para o amor, sagrada,
         A alma que acorda do primeiro sono
         Com os olhos postos na ilusão passada.

         E bendita, afinal, a alma sincera,
         Que abre na solidão do meu Outono
         Meu primeiro botão de Primavera!...

 

         A VIA-LÁCTEA

         À noite, em viagem, sob o céu de Estio
         Que, alto, estrelado, num dossel se arqueia,
         Sem o claro farol da lua cheia,
         Pela estepe do mar, corre o navio.

         E atrás, na esteira, pelo céu vazio,
         A chaminé, a fumegar, semeia
         E se perde na noite, como um rio...

         Muito acima, no entanto, sem um rumo,
         Despertando a amplidão do seu letargo,
         Retalha o céu um turbilhão de fumo.

         Há uma estrada de luz no firmamento...
         — E o navio de Deus, que passa ao largo
         Com o penacho de estrelas solto ao vento!

 

CAMPOS, Humberto de.  Humberto de Campos.  Brasília: Thesaurus Editora, 2004. 15 p.   10,5 x 15 cm.  (Série Escritores Brasieliros Clássicos , 8)   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

IN EXCELSIS.

Sonhei contigo, novamente... Ouvindo
O rumor da amplidão, nos céus profundos,
Do alto Azul nós olhávamos sorrindo
O gravitar harmónico dos mundos...

Sóis de fogo, planetas de áureo e infindo
Brilho, se agitam junto a nós... E, em fundos
Céus longínquos, sem órbitas, fugindo,
Passa o bando dos astros errabundos...

As estrelas fugiam-te, medrosas...
Colheste algumas... Outras, pelo espaço,
Se escondiam no véu das nebulosas.

Tu voltavas, sorrindo, para vê-las...
E eu passava, levando-te ao meu braço
Resplendente de beijos e de estrelas!

 

 

LENDO-TE

 

"As roseiras aqui já estão florindo...
" Mandas dizer... "As híspidas e pretas
Rochas da estrada já se estão cobrindo
De musgo verde... Há muitas borboletas..."

 

E eu me fico a pensar que agora é o lindo
Mês das rosas esplêndidas e inquietas
Asas: mês em que a serra anda sorrindo,
E em que todos os pássaros são poetas.

 

Vejo tudo: a água canta entre os cafeeiros.
Vejo o crespo crisântemo e a açucena
Estrelando a verdura dos canteiros.

 

Penso, então, que em tudo isto os olhos pousas.

E começo a chorar... Olha: tem pena,

Não me escrevas falando nessas cousas!...

 

 

 

NA TUA AUSÊNCIA

 

Vejo sempre desertas, há três dias,
Essas duas janelas onde, outrora,
A buscar-me com os olhos, noite em fora,
Comovida e medrosa, aparecias.

 

Toda a sala é sem luz. E eu, vendo-a, agora.
Escancarando as amplas gelosias,
Cismo: e penso que a casa, inteira, chora
Treva, por duas órbitas vazias.

 

E por que foi que a casa mudou tanto?
Por que as janelas, apesar dos folhos
Das cortinas, são cegas desse pranto?

 

É porque agora vives longe delas:

— Que eras tu, ó menina dos meus olhos,

A menina dos olhos das janelas!

 

 

 

INGRATIDÃO

 

Jamais digas, nos dias de ventura,
Que de outro coração tu'alma é dona
Se ele, acaso, de rastros, te procura.
Lembra-te sempre, que, na noite escura,
Até a tua sombra te abandona...

 

 

 

MÃOS

 

Quando, após a tua prece,
As mãos separas, sorrindo,
O teu gesto me parece
O de um lírio suave e lindo
Que vai, de leve, se abrindo...

 

 

 

A VÍBORA

 

Íamos rindo pela mesma estrada
Quando viste na areia, enrodilhada.
Uma serpe, que vinha pelo chão.

E estremeceste. A víbora, enroscada,
Tomara a forma de teu coração!

 

 

 

 

REZENDE, Edgar.  O Brasil que os poetas cantam.  2ª ed. revista e comentada.  Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1958.  460 p.  15 x 23 cm. Capa dura.   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

NO SERTÃO

 

 

Faz um ano... O sertão, verde e ondulado,
Todo em flores e músicas, se abria.
Erravam nuvens pelo céu, e o gado,
Pelas campinas e capões, mugia...

 

Era num alto a tua casa: havia

Um rumoroso córrego de um lado;

Do outro, o curral; e, ao longe, a serrania,

De alva bruma o alto píncaro toucado.

 

Sinto-o, em sonho, outra vez. A tarde desce:
Enfia a treva os seus buréis de monge
Nos serrotes cinzentos: anoitece. ..

 

Vão-se abrindo as estrelas e as juremas...
Muge o gado saudoso; vem de longe
O assustado gritar das seriemas...

 

("Poesias Completas")

 

 

 

 

O INVERNO CEARENSE

 

 

A mão gelada, o gesto frio, o olhar nevoento.
Vem das bandas do Mar, das terras de que é dono,
Tapa os olhos do Sol, prende as asas do Vento,
E ergue no alto sertão, sôbre as nuvens, seu trono.

 

Ouvindo a sua voz de alto e ríspido entono,
Toda a Serra, a tremer, veste o burel cinzento.
E o áureo Estio, a seguir as pegadas do Outono,
Pendura o cetro real à asa do Sol friorento.

 

A Terra é tôda riso ante o Esposo que a anima:
As folhas, nos sertões, pelos galhos arruma,
Põe tapetes no campo, e abre flores por cima.

 

E a pedir, para vê-lo, olhos d'água às entranhas,
Dá-lhe a rir, feito flor, dá-lhe a orar, feito bruma,
Os beijos da Planície e o incenso das Montanhas...

 

("Poesias Completas")

 

 

 

 

TEMPESTADE AMAZÔNICA

 

 

O calor asfixia e o ar escurece. O rio,
Quieto, não tem uma onda. Os insetos, na mata,
Zumbem, tontos de medo. E o pássaro, o sombrio
Da floresta procura, onde a chuva não bata.

 

Súbito, o raio estala. O vento zune. Um frio
De terror tude invade... E o temporal desata
As peias pelo espaço e, bufando, bravio,
O arvoredo retorce e as folhas arrebata.

 

O anoso buriti curva a copa, e farfalha.
Aves rodam no céu, num estéril esforço,
Entre nuvens de folha e fragmentos de palha.

 

No alto, o trovão regouga, e, em baixo, a mata brama.
Ruge em meio a amplidão. Das nuvens, pelo dorso,
Correm serpes de fogo. E a chuva se derrama...

 

("Poesias Completas")

 

 

 

 

A SÔLHA

 

(Lenda do Norte)

 

Quando Nossa Senhora andava pelo mundo,
Trazendo ao colo um deus, foi bater, certo dia,
A hora da preamar, a um rio muito fundo,
De barreira muito alva, e água muito sombria.

 

Era um risco passar. Mas a Virgem Maria,
Ante o equóreo lençol todo em peixes fecundo,
Quis saber, vendo perto uma solha vadia,
Se o rio, na vazante, era feio e profundo.

 

E indagou: "— Sôlha, dize, a maré enche ou vaza?"
Mas a sôlha, a zombar, por um hábito antigo,
Torce a boca, e a arremeda, a pular na onda rasa.

 

E é dai, e em razão desse negro pecado,
Que a sôlha começou, por severo castigo,
A rodar pelo mar, tendo a bôca de um lado.

 

("Poesias Completas")

 

HADAD, Jamil Almansur, org.   História poética do Brasil. Seleção e introdução de  Jamil Almansur Hadad.  Linóleos de Livrio Abramo, Manuel Martins e Claudio         Abramo.  São Paulo: Editorial Letras Brasileiras Ltda, 1943.  443 p. ilus. p&b  “História do Brasil narrada pelos poetas. 

HISTORIA DO BRASIL – POEMAS

A FRANÇA EQUINOCIAL

 

 

LA RAVARDIÈRE

 

       (Fundador de S. Luis do Maranhão)

 

Para ti, berço meu, preciso era algo
Que exprimisse teu brio e teu encanto:
Para te dominar — mão de fidalgo,
Para te batizar — nome de santo.

Quando as alturas do Passado galgo
Para beijar, conquistador, teu manto,
Dos sonhos altos o corcel cavalgo,
Todo o meu ser se transfigura, e eu canto...

Do meu povo és a gênese distante;
Trouxeram-lhe a alma, sobre o mar profundo,
“La Charlotte”, “Saint´Anne”, “La Regente”...

E o ninho de águia tem sinais de penas...
Péricles tem que aparecer no mundo
Sempre que se haja de fundar Atenas!...

 

       (POESIAS COMPLETAS – Renascença Editora – 1933)



A FRANÇA EQUINOCIAL

HOLANDESES EM PERNAMBUCO

FRANCESES NO MARANHÃO
A CRIAÇÃO

COLONIZAÇÃO DO NORTE 

 

 

MAURÍCIO DE NASSAU

 

Teu grande sonho de conquistas era,
Nesta paragem despertada apenas,
O mais nobre dos sonhos de Mecenas
Sonhado por Luís de Baviera.

Palácios, sábios, mármores, amenas
Horas de gozo e de saber...  Em fera
Região enfim, a Capital severa,
Corpo de Roma, cérebro de Atenas.

Fidalgo e sábio o Bom e o Belo amando
Se leio a história de tua obra, ao fundo
Encontro o vulto de Platão, sonhando...

E essa aventura neste chão tristonho!
Tua conquista comportava um mundo,
Mas nem um mundo comportou teu sonho!

 

 

DOMINGOS AFONSO MAFRENSE

(Colonizador do Piauí)

Como os patriarcas bíblicos de antanho
Cortando a Síria a apascentar seu gado,
Penetraste o planalto sossegado
Conduzindo teu povo e teu rebanho.

Pelo sertão era de paz teu brado:
Doida fadiga antecedeu teu ganho:
Teu arcabuz não trabalhou no amanho
Desse deserto de que foste o arado

Não foi teu sonho de esmeralda e de ouro:
Tua ambição era a existência ruda
Mungindo as vacas e laçando o touro.

E é por isso que, ainda hoje, a terra, boa,
No aboiar dos vaqueiros — te saúda,
Pelo berro do gado — te abençoa”



CALDEIRA CASTELO BRANCO
(Fundador de Belém do Pará)

Capitão, por escrúpulo e respeito,
Recordando-te a vida transitória,
Não sei se deva celebrar-te o feito
Ou, com censuras, macular-te a glóri.

Quando me vens, de súbito, à memória
Com o teu severo, taciturno aspeito,
Mostras tu´alma em te mostrando a História
De morteiro na mão e Cristo ao peito.

Rezas pecando. Com pavor das gentes,
Se de contas na mão passas o dia,
Matas tupinambás quase inocentes.

Para a conquista vinhas dar a imagem:
Vinha clamar contra a selvageria,
Quando tu, português, eras selvagem!

 

     (POESIA COMPLETAS  -Renascença Editora, 1933)

 

  

BENTO MACIEL PARENTE

( Donatário da Capitania do Cabo-Norte )

 

Este é o fero senhor do Cabo-Norte,
Mártir de setenta anos de cobiça:
Vende o Rei, vende a Lei, vende a Justiça
E, de rojo, afina entra na morte.

Na fome de ouro, sem que Deus lhe importe,
A vida joga e expedições atiça:
Se é, porém o Dever que vem à liça,
Curva-se ante o inimigo, e entrega o Forte.

Teve louros de herói e ouro a mãos cheias;
Banhou de sangue, apavorando a História,
Dezenove nações e cem aldeias.

Mas a rocha Tarpeia foi tristonha:
Seus setenta anos de mentida glória
Não valeram seus dias de vergonha!

 

 

PEDRO TEIXEIRA

Já entrava o sol no matagal sombrio
E era o dia sem chuvas nem garoas,
Quando, em outubro, despertaste o rio
Com o ritmado remo das canoas.

Era a flotilha de quarenta proas
Carregando soldados e gentio:
Foste, no entanto, do Equador ao frio
A cortar correntezas e lagoas.

Por dois anos, em ímpetos convulsos,
Exaltando os valores portugueses,
Cortaste o rio com trezentos pulsos.

Bebeste esta água em seus dois extremos:
E o Amazonas que diga quantas vezes,
Orgulhoso de ti, beijou teus remos!

 

 

PERO COELHO

(Descobridor do Ceará)

Na umidade do cárcere de Olinda
— Enjaulado jaguar que a vida acaba
Lembrando a selva rumorosa e linda —
Sonha o conquistador de Ibiapaba.

O sonho sé o resto da jornada: é a vida:
É a morte: é a sêde, é o desespero; a taba
Toda investindo. A terra em fogo. Um baba;
Outro cai; outro fica, outro se finda...

Dois filhos morreram nos seus braços: vêde!
E nem, sequer, irmão de Agar, tem perto,
Nos olhos, água que lhes mate a sêde:

E, ao fim de tudo, acusações e gritas...
—Ah! por que não tombara no Deserto
Abraçado com os seus israelitas!?

*

VEJA E LEIA outros poetas do MARANHÃO em nosso Portal:

http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/maranhao/maranhao.html

 

Página publicada em outubro de 2021

 

 

 

Página ampliada e republicada em abril de 2008; ampliada em novembro de 2016; ampliada em junho de 2017; AMPLIADA em novembro de 2019; ampliada em dezembro de 2019


 

 

 
 
 
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