POESIA BRASILEIRA DE VANGUARDA
CAMARGO MEYER
Poeta e jornalista, nasceu no Rio de Janeiro em abril de 1941. Radicado em Brasília desde 1979. Seu primeiro livro, “Cartilha” foi editado pela Massao Ohno Editora, de São Paulo (1964). Um trabalho que, segundo depoimentos de seus companheiros da época, como o poeta Armando Freitas Filho, influiu em toda a poesia de vanguardas daqueles anos.
Seu primeiro livro foi publicado às vésperas do golpe militar. Perseguido político, refugiou-se na Europa, de 1967 a 1969. De regresso ao Brasil, viveu na clandestinidade. Preso em 1972, foi torturado na prisão da Ilha das Flores.
Os poemas a seguir foram extraído de A CICA A CICA TRIZ [conhecido como Cicatriz, para facilitar...], editado em Brasília em 1989.
ESTUDO B
a quilha o barco
a flora (de dentro
ou f o r a
do arrastão)
no convés a fartura
e telvegue, a vez
de quem talvez
navegue
na medula
da procela
de quem, grumete
o bote
a vela
valera, a galera nau
frágil (e a enguia
que a guia) vale
a força dos remos
e bate a rede
o cabo
na bátega a batela
ESTÁGIO 2
no fosco estanho estranho rosto
desenha-se
negro grafite
sobre o espelho túmulo
uma figura lápis lápide
que se especula
(clara-escura colisão)
e indaga (adega)
de um ruir ruído
de pálpebras
no engavetar-se
de um no outro (ostra)
urge, quando
forma-se a borra
sob a garrafa (gravata)
vestir a dala
jarro de jarras
TÁXI-DANCING
“... e convidei-a para dançar.”
CHICO BUARQUE DE HOLLANDA
Ali, quem me leva
nessa embalagem inédita,
embrulho ensimesmado.
E eu, de mim, ao próprio lado,
comensais do mesmo prato...
Mas ao mesmo tempo
já sem tempo e desolado
não do que foi, e está parado,
e vai-se, de quem está vendo.
Quem me leva assim,
o peito na mão, cruzado,
assistente de quem passa ao largo,
andante no sinal quase fechado.
Quem assim me veste e calça
para ir aonde não fico, pasmo,
papel amarelo posto quase de lado.
Quem ao mesmo tempo me leva
nesse passo de valsa,
se eu mesmo me seguro a alça?
SÍNCOPE
Um finado vôo,
despassarado e sincopado,
tão fino
que o trinado
soava mais entoado
que um salto
de sapato
no bulício
no andar de baixo.
Um ruído que ainda
masco
quando trisco e risco
o miocárdio.
E não é
que até no peito
há uma zona de meretrício?
Ou uma flor de tacho.
Cheguei cedo mas já era tardo.
CANTO DO CERRADO
para um Ipê Roxo
Um tronco de ipê
desaviado,
um beijo
no peito murcho
de mamilo arroxeado.
Mesmo ipê,
ele florava,
seu pistilo quase de pé.
Nas solas,
um talvez
e uma bolha de sensatez
no assunto quase encerrado<
Todo fósforo
acende outra vez.
De
cartilha
(1959-1963)
São Paulo: Massao Ohno Editora, 1964
72 p. Capa de Rubens Gerchman
(Obs. Mantivemos a ortografia original)
PONTA SECA
punhal de aço
ah o fígado
e depois o baço
(cem mortes
se trançam
no seu gume)
mogorão: punhaço
a parola
vem do corte
ALBA
êste o nú
monumento
ao vento
o gesto
monuvento
no lençol:
ama há amão aman
(branca branca...
esse
hemos, ambos
no casulo
OPUS
os dédalos
no teclado
no telhado
o gato
salta
e pára
na corola do regalo
peixe gato?
pissicato
QUADR
três em torno à
mês-m-a
a fome
contorn
ando a
Mésula, o peixe
no prato
de si se de:
trans
form
torn
ando feixe circumar, sem istmo
MIRAVE
um pássaro
p
ousa o seu
e niv
Ela, a manhã
entre dois pios
croquis de PL
uma flor eólica
fibra no ar fino son
ido por um postal
a
dio
ACIDENTE
ZRo a face
na esquina
xpect
altiva de ver
D
no meio da Ru
a pressão mal
sã?ssim
o grito em ramas
na lata
Ria
(a côr tb. va
Ria
o pedal stop mero
ho
Mem
ATOL
a armando freitas filho
1
um rosto
obstrui o r
Astro de outra face de alvorada
ombros e a
Braços que se anelam
nulam
que
um dedo estrala na
rótula de um isqueiro
cinco no atol
um polegar calcula:
digi
talo
o sol
ATOL
a armando freitas filho
2
o grupo na praça des
Anca, a noite enrod
Ilhada
um cotov
-ÊLO) ajeita cinco mechas de cab
afaceafaz-se
seu perdido
ELO?
Tempo feminil atento
à linha dos corpos
que se des
MANCHA
em carantulas de perfil
16/11/61
ESTRUTURA
que escuro se articula
no mais escuro, cego
se apoiando no muro
a coisa vaga, vácuo
medo
sôbra rua, sem ossatura
quando quêdo
o corpo está
telado
carente de
lume
sonoro oco soco bueiro
que pouco se ou
vira
da fratura
o osso buço
nem o soluço
ESTRUTURA 2
a mauro gama
o vôo: tropo-
gráfico, o esqueleto
de um páfalo!
(coice de asa tropel
ÊÇO. o tropo no ar) voar, o com-
um
ôlho
revela
o espássar o
o canto mais sêco
a zínia mais son
ora
no bico orto
g: onal, áfrico
st mr pr vc, dálo
O p´fl, o phl?
Página publicada em outubro de 2008. |