MADRUGADAS DE NARCISO
A Ildásio Tavares
Encalho nas madrugadas as minhas velas em farrapos
Sou eu mesmo os marinheiros
Sou eu mesmo a cabotagem
Sou eu quem traça os portos do roteiro
E torna em desespero a bússola da viagem
Náufrago nas madrugadas
Mas eu mesmo me faço nadar em vão as mais longínquas
praias
Sou eu a maresia, a calmaria e a tempestade
Sou eu mesmo a terra à vista
Inalcançável
4 POETAS 4 GRAVADORES. Florisvaldo mattos; josé carlos capinam; fernando da Rocha peres; godofredo filho —— emanuel araujo; sônia castro; calazans neto;gley. Gravura de Henrique oswald ceidia pela família do artista. Apresentação gráfica: Sônia Castro. Salvador, Bahia: Editora Casa Grande, Gráfica Santa Rita Ltda, 1966. Edição: 200 exs
Ex. bibl. Antonio Miranda
POETA JOSÉ CARLOS CAPINAM
GRAVADOR SÔNIA CASTRO
canto iv
o homem-senhor tem existência
sobre posses e governa.
boca estreita, de algarismos,
corpo de lodo e pedras.
grito, de lobo e lâmina,
memória, de cifra e boi,
fome extinta e lucros feitos
dos que, sobre a terra, trabalham presos.
(o homem-senhor reina
mas, coitado, nem sabe
que todos os reinos caíram ontem.)
não sabe ele as palavras
em trânsito, e a vida,
lavra de ouro, comércio,
nosso medo e vosso espanto.
tudo, avisamos, em trânsito,
(as relações de trabalho)
pastos, pontes, rios e posses.
avisamos o tempo de homens claros.
POESIA SEMPRE. Ano 5 Número 8. Editor Geral: Antonio Carlos Secchin. Rio de Janeiro: MINISTÉRIO DA CULTURA / Fundação BIBLIOTECA NACIONAL, 1997.
452 p. ISSN 0104-0626 No. 10 927
Exemplar da Biblioteca de Antonio Miranda
Uma canção de amor às árvores desesperadas
FRAGMENTO
I
Corpo da terra, cinzas colinas, nuvens cinzas
Nem pareces uma fêmea em atitude de entrega
Meu corpo que tanto te deseja, quanto te beija,
Fez saltar três filhos do fundo da terra.
Quisera te receber, Neruda, como Ossain
E de cada folha das florestas americanas
Encontrar o remédio para sobreviver
Às furiosas noites de fogos desta cruel origem ibérica.
Ainda não cai a hora da vingança. E teu poema diz ainda te amo.
Corpo calcinado das angiospermas, bromélias, plantas,
Como recuperar dessas auroras de guerra
Das fendas tamoias, eu, ogan das tristezas do mundo.
O corpo da terra? Persistirei nas oferendas
Persistirá minha sede, pelos caminhos indecisos do planeta,
Combatendo a ânsia dos perversos e buscando a rede
Onde a infinita mão do acaso tece a esperança.
*
Página ampliada e republicada em setembro de 2025
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Página publicada em outubro de 2021 ---
Página publicada em março de 2020