NA MORTE DE MEU PAI
Meu grande, meu maior, meu verdadeiro amigo,
Faz pouco que o deixei na última pousada,
Inerte, o olhar sem luz, a fronte enregelada,
Ele que teve o ardor de um cavaleiro antigo
Que vácuo nesta casa, outrora o doce abrigo
Da minha meninice alegre, descuidada.
E em pranto corro-a toda e sinto-a povoada
Da presença sutil do meu maior amigo.
Já pende o sol no ocaso. Ainda a voz do vento
Soluça pelo espaço uma queixa, um lamento.
Pouco e pouco esmaece o roxo céu, profundo.
Desce a noite, afinal. Queda-se a natureza.
Tudo é sombra, é silêncio, é saudade, é tristeza.
Parece que parou a máquina do mundo.
VELHO RELÓGIO
Meu leal confidente do passado
Nas horas de alegria e desenganos,
Já trabalhas há mais de cinquenta anos
E andas trôpego, trêmulo, cansado...
Bem podias já estar aposentado
Desses labores múltiplos, insanos;
Não mais aguenta esforços sobre-humanos
Esse teu coração descompassado.
Velho relógio do paterno abrigo,
Cuja lembrança morrerá comigo,
Para essas rodas, não trabalhes mais...
A tua árdua missão já não cumprida;
Marcaste o instante em que eu surgi na vida
E o momento da morte de meu Pai!