CLÉA MARSIGILIA
1929 – 2005
Nasceu em Maceió (Alagoas) em 14.07.1929 e faleceu no Rio de Janeiro em 11.05.2005. Filha de Antônio Marsiglia e Maria Fazio Marsiglia. Curso primário no Colégio São José, secundário no Colégio Santíssimo Sacramento. Diplomada em Direito pela Faculdade de Direito de Alagoas. Prêmios Esso e Academia Alagoana de Letras. Advogada na Procuradoria do IAA. Membro da AAL, onde ocupou a cadeira 9. Com Francisco Valois editou a revista Acaieme, que ficou no primeiro número. Publicou: Sarabanda, Maceió, Editora Caeté, 1951, (poema em prosa);Difícil reino amar, Maceió, SENAC/DAC, 196- (poesia); Jarro de porcelana, ilustrações de Roberto Lopes, Maceió, SERGASA, [s.d.] (poesia): Luminária, Maceió, DAC/SENEC, SERGASA, 1974 (poesia); Quarteto do tempo, Maceió, 1968, (poesia); Cânticos da terra, São Paulo, 1956, prêmio no concurso feminino de poesia, em 1956, de A Gazeta, de São Paulo; Poemas e baladas, Rio de Janeiro, Edições Leitura, 196- (poesia); Espelhos embaciados, Maceió, Ed. Acaiême, 1953, (contos); O Deus e a Terra, [Rio de Janeiro,Ed Leitura] , 1961, (poesias); Forte San Davis, Maceió, SENEC/DAC [s.d ]; Sussura, Astrolábio, Maceió, Secretaria de Cultura e Esportes, 1989; Alumbramento, Maceió, SERGASA, 19? ; Cristais, Maceió, SERGASA, 1983; Quatro poetas - Maria V. Soares Filha, Charles Cooper, Cléa Marsiglia e Maria Tereza Vieira, Maceió, ASPLAN. Estes dados bibliográficos foram coletados no ABC das Alagoas (versão virtual).
Cléa Marsiglia é um poeta de rara leveza, retirando a poesia da pura sensação. É uma pena conhecer uma poeta tão sutil com tanto atraso e mesmo que ela vindo da terra de dois outros dois grandes poetas (Jorge de Lima e Lêdo Ivo), não seja festejada nacionalmente. Basta ver que Fábio Lucas a cita, em entrevista que consta em livro de estudos sobre a Literatura Brasileira, de autoria de Douglas Tufano, entre as grandes poetas do Brasil:
“A sensibilidade feminina, sem violências extremas na área da mera aparência formal, tem contribuído fortemente para fixar um campo original de inquietação poética, de apreensão deslumbrada de novos mundos, de afirmação superior da mulher na sociedade contemporânea. Dentre os muitos nomes, em todo o Brasil, que mereceriam citação, lembro Laís Corrêa de Araújo, Celina Ferreira, Renata Pallottini, Ana Elisa Gregori, Hilda Hilst, Zila Mamede, Olga Savary, Clea Marsiglia, Myriam Fraga, Sônia Queirós, Elza Beatriz, Adélia Prado, Yone Giannetti, Dora Ferreira da Silva, Lara de Lemos. A enumeração é apenas ilustrativa. Considere que, no momento, a figura da mulher se expande no contexto cultural brasileiro. As universidades, as faculdades de Letras, os veículos de comunicação de massa, a própria produção literária estão gradualmente passando da hegemonia masculina para a predominância feminina.”
(Página elaborada por Salomão Sousa)
ORA CHEGA TEU SER CANTANDO
Ora chega teu ser cantando
ao som das horas.
Ora vai com o escurecer
como se a noite
não fosse tempo
nem eu mais pudesse chorar
de tanto querer.
Se o vento corre na paisagem
e desmancha o pensar escrito
é bem teu vulto
que se transforma em brisa
e apaga o sofrer.
CANTA A AUSÊNCIA
Canta a ausência
nos ramos de tília.
Falta a lembrança
pelo macio das rosas.
Sussurra a voz
pela brisa dos campos.
Maior é meu silêncio
quando chegas
e fazes presença
deste amar.
FELIZMENTE O INVERNO NÃO VEM
Felizmente o inverno não vem,
ao mesmo tempo,
para toda parte do mundo.
Há sempre um lugar
onde se pode receber a primavera
e olhar para o céu
em luz.
Por isso quando o frio do sentir
vai surgindo com o vento,
sábio é andar
em direção ao sol que está chegando
na outra parte do íntimo.
Som de lauta.
Rebanho quieto
com olhar longo de paz.
Encostas floridas
se debruçam de beleza
para o aroma do espaço.
Sorriso do outono
cai triste e profundo
na tarde molhada
de chuva.
Ar manso do primeiro frio
enrola dores e lembranças
no manto do sentir.
O íntimo passou às pressas
para o silêncio do sempre.
A flauta parou agora
bem no meio do amar.
Não soube mais tocar
o que já era do eterno.
Bem de leve caminhar e lembrar
sem entristecer o presente
nem esconder a beleza do passar.
Não fala do ontem
nem foge do hoje.
Sabe que tudo está sempre andando
para outros lugares
até chegar ao perfeito não ser.
Bem de leve passa a ternura
pelo imenso do amar
até se desmanchar no eterno.
Queria que todas as coisas
fossem leves de bondade
e andassem no tempo,
como a brisa,
que está sempre cantando
uma ária de ternura
para tudo de viver.
Que todo o sentir
caminhasse descalço no íntimo
e falasse em surdina
como a chegada do entardecer
nos olhos.
E quando as coisas tivessem
que partir
fossem como a rosa
que se desmancha em silêncio,
pétala a pétala
de beleza.
[ CAVALCANTI, Valdemar, org. ] 14 POETAS ALAGOANOS . POEMAS ESCOLHIDOS. Maceió: Edição do Departamento de Assuntos Culturais da Secretaria de Educação e Cultura, 1974. 44 p. 14 x 20,5 cm.
Ex. doado pelo livreiro José Jorge Leite de Brito
POEMAS
Pelas horas que te pertencem
e fazem deste sentir
o longe das coisas idas,
uma rosa aberta com o orvalho da manhã,
um caminho bem imenso
para que a dor se canse de tanto andar
e o pensar se esqueça de tão grande lembrar.
Pelas hora de teu distante,
vaga estrela no céu do sentir,
luz derradeira de quem vai fugir
pelo eterno adentro,
o perfume do lírio colhido
ao anoitecer das coisas tristes sem amanhã.
Pelo que és fugaz, incerta,
dia que pode não vir,
cintilação de lágrima
no olhar aberto ao tempo
este fio de ternura no espaço da alma
para o eterno de teu ser
que não é meu.
*** — ***
Jamais conheci campo de trigo.
Vinhedo no verão...
Jamais pisei na neve
nem acompanhei cristais de gelo se dissolvendo
nos galhos das árvores.
Jamais encontrei teu olhar
nem sei como é teu ser,
coar de tua voz.
Mas existes
e és vento que se sente
e não é visto.
*** — ***
Rumor do pranto na alma
Chuva nas folhas batendo
como pancada à porta de casa esquecida.
Vento nas frestas correndo visão, pálpebras
e sorriso que fiou no meio-dia das rosas.
Tua palavra espremida nos olhos.
Abre, tédio, com tua lâmina
abóboda deste amar agonizante.
*
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Página publicada em janeiro de 2022
Página publicada em setembro de 2012
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