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ALFREDO GUISADO

(1891-1975)

 

Alfredo Pedro Guisado (Lisboa, 30 de Outubro de 1891 - 2 de Dezembro de 1975) foi um poeta, deputado, político e jornalista português. Colaborou na edição n.º 1 da revista Orpheu, sendo considerado o mais injustamente esquecido poeta de Orpheu.

 

RECORDANDO

 

Sinto as cores, da noite, terem medo

e acolherem-se à sombra do teu luto.

Eu fui um rei dos godos, que em Toledo

o Tejo adormeceu e ainda escuto.

 

Cercam-se de oiro as salas que habitei,

oiro-cinza esquecido, oiro dormente.

E em minha Alma, na qual inda sou rei,

Cismo tronos caindo lentamente.

 

Buscam-me pajens tristes nos caminhos.

E a minha lenda em sonhos pergaminhos

vai escrevendo em silêncio o meu cismar.

 

São outros os domínios que vivi.

Todas as coisas que eu outrora vi

regressaram mistério ao meu olhar.

 

 

MÃOS DE CEGA

 

1

 

Sinto que as tuas mãos são teus olhos vencidos,
teus olhos que esquecendo as orações da luz

são claustros apagando os passados esquecidos
de Deus ao regressar de amortalhar Jesus,

 

Sinto-as tanger ainda os violinos velhos

onde os dedos saltando em cordas de oiro, à tarde,

te cegaram de som. E em candelabros arde

o teu antigo olhar emoldurando espelhos.

 

Teus dedos ao bater nas tuas mãos são remos,

inda vejo nas salas do palácio, arfando,

As tuas mãos de Dor entreabrindo as portas.

 

Buscamo-nos em cor e quando nos perdemos

passam as tuas mãos em meus dedos, cismando

estátuas de marfim sobre as arcadas, mortas...

 

2

 

Morreram os leões que guardavam perdidos

a branca escadaria. Velhos leões sombrios...

Deles apenas resta o eco dos rugidos

que os arcos dos salões tornaram mais esguios.

 

As rendas que fiaste adormeciam bocas

e as rugas no teu rosto iam caindo, fundas...

No fim do parque, à noite, as águias moribundas

guardavam em silêncio as destroçadas rocas.

 

Fiavas noutro tempo os teus olhos dormentes.

Deixaste de os fiar e os teus olhos arderam

na cor das tuas mãos, na cruz de outros poentes...

 

Cega de num, partiste. E quando regressaste

manchada de Distância, os meus sentidos eram

palmeiras ladeando a estrada onde passaste!

 

*

 

Página publicada em agosto de 2015

 


 

 

 
 
 
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